Vacuum Cleaner Haunting
Imaginem pegar no "Tio Boonmee" (“Uncle Boonmee Who Can Recall His Past Lives”) de Apichatpong Weerasethakul e desafiar a sua costumeira naturalidade com a sobrenaturalidade: numa espécie de paródia que transgride constantemente a sua própria essência.
Para olhos ocidentais, conviver com fantasmas que encarnam aspiradores, que aguardam nas salas de espera dos hospitais respeitando as normas dos mortais ou assistir à oficialização matrimonial entre mortos e vivos pode parecer um prólogo de fantasia trágico-humorística. Mas, em "A Useful Ghost", isso surge como uma tentação de colar os elementos paranormais à sua politização. Aqui, os fantasmas são postos à prova quanto à sua utilidade, não se trata de assombrar por assombrar, deve-se antes possuir um propósito quanto à sua deambulação no mundo que os pertencera na pré-finitude. Nesse acto, há que evidenciar, ou até exibir, uma funcionalidade perante a sociedade.
E então, julgando nós, entre carne, órgãos e vértebras, seremos capazes de decidir se outros, mesmo os que já partiram, são mais úteis do que alguns vivos? Ratchapoom Boonbunchachoke criou um filme algures entre o ridículo, o lúdico, o camp, e a crítica social travestida desse registo, do propósito humano enquanto ser social. Que com o aumento populacional, sem ceder a métodos malthusianos, será possível encontrar uma definição para quem quer que seja?
Um curioso retrato fantasmagórico, com sequências a fazer corar ou rir embaraçosamente, mas pouco dessa sensibilidade ocidentada (e acidentada) importa: é precisamente para isso que serve. O filme tem a utilidade de ser um ‘cadavre exquis’ com uns quantos ditos prontos a subjugar o espectador.
Filme visualizado no âmbito da Semana da Crítica, Cannes 2025