O meu amor pelo cinema veio do amor pela saga Sexta-Feira 13
Friday the 13th Part VII: The New Blood (John Carl Buechler, 1988)
Sou um apaixonado pelo cinema, mas antes disso, sou um apaixonado pelo terror: no cinema, na escrita, na televisão, nas brincadeiras e nas parvoíces. Cresci nos anos 90, sendo um dos poucos tolos que festejavam o Halloween (o meu feriado favorito a reboque do filme de John Carpenter, que marcou a minha juventude). As minhas primeiras saídas à noite foram para ir ao Fantasporto com o meu irmão, ainda na sua era de ouro e dedicada em grande escala ao cinema fantástico.
Mas, curiosamente, a minha paixão pelo cinema de terror foi marcada pela saga “Sexta-Feira 13” (“Friday the 13th”) e dois episódios muito específicos relacionados com ele. No primeiro, eu tinha pouco mais de sete anos. O meu irmão mais velho ia ver o primeiro “Sexta-Feira 13”, numa cópia ranhosa gravada da televisão em VHS. Tentei me juntar, mas ele disse-me que não. Mas, na minha cabeça, tinha que ver aquele filme. Parecia algo irreverente e proibido. Eu gostava de fazer o que me diziam que não devia fazer - e ver um mero filme parecia uma irreverência bastante fácil de executar.
Comecei a ver o filme e, claro, achei uma ‘seca’. Conversa, namoro, um intervalo da RTP1 em “fast forward” (na minha família quando se gravava da televisão, era com intervalos e tudo) e mais conversa. Quando a meio parece que finalmente vai chegar o tal “terror” que me avisaram, fiquei entusiasmado. Um jovem Kevin Bacon deita na cama e é morto por uma lança que lhe atravessa a garganta… Jason estava escondido debaixo da cama! Eu, claro, fugi em terror.
Foram semanas a fio com medo de que alguém tivesse debaixo da cama, apesar da minha mãe guardar lá montes de tralha que certamente iriam tornar a tarefa bem desconfortável para Jason. No entanto, passado o trauma, ficou o ‘bichinho’ do terror. Quando me disseram que iria ter medo do videoclip do “Thriller” do Michael Jackson, voltei a não resistir. Via até ao máximo que aguentava, depois fugia, assustado. No entanto, o hábito ficou: pouco mais tarde passei a ir a festivais de cinema ver terror asiático e sair com os cabelos em pé e até aceitar desafios tão bárbaros como a era da French Extremity (de filmes como “Martyrs” e “Fronteries”) ou de coisas detestáveis (como “The Human Centipede”).
Curiosamente, vim recentemente descobrir que a saga “Sexta-Feira 13” traumatizou muita gente da mesma forma, nomeadamente os membros da banda Wolfie’s Just Fine. No videoclip e na música “A New Beginning” eles ilustram como as cenas de sexo e morte na floresta em “Friday the 13th Part V A New Beginning” marcou-os na adolescencia e na puberdade. O outro filme da saga “Sexta-Feira 13” que moldou a minha paixão pelo cinema foi o sétimo filme da saga: “The New Blood”. Na zona onde vivia, no Porto dos anos 90, existiam vários videoclubes, e neles encontrava todos os filmes da saga, excepto o sétimo, “The New Blood”, e o nono, “Jason Goes to Hell.
Como qualquer cinéfilo, consultava o Cinemania (uma enciclopédia de cinema digital que era publicada todos os anos em CD, com críticas de Leonard Maltin e Roger Ebert) e um almanaque de críticas portuguesas chamado Videoguia (um livro gigante de folhas moles vendido anualmente nas tabacarias). Óbvio que a consensualidade era que todos os filmes da saga “Sexta-Feira 13” eram uma porcaria, com isso eu vivia bem. Mas o “Friday the 13th part VII - The New Blood” curiosamente era descrito como o melhor da saga, e tinha em ambos os sítios notas acima de zero, o que neste registo quer dizer muito.
Então, em um verão da minha adolescência, fui a todos os clubes de vídeo listados nas páginas amarelas em busca do raio do filme. Eventualmente, no centro do Porto, encontrei quem o tinha. Da primeira vez o filme estava alugado, então requisitei para a semana seguinte, e lá voltei, apanhando o meu autocarro, de forma a assistir aquela preciosidade.
Efectivamente, “Part 7 - The New Blood” é a melhor sequela da era posterior de “Sexta-Feira 13”, quando a saga já tinha passado a ser mais cómica e sem qualquer continuidade narrativa entre os vários capítulos. No global, para mim, o segundo e o terceiro filmes são de longe melhores, até pelo impacto que o Jason, com o saco na cabeça, teve em todo o perfil de horror que associava à personagem. O nono filme (“Jason goes to Hell”) não foi merecedor de tal busca. Para além de saber que era inédito em Portugal, também tinha entendido que era tão mau que tinha efetivamente morto Jason de vez, e assim as expectativas por um “Freddy vs. Jason”, mega-filme que iria colocar o assassino de “Sexta-Feira 13” contra o de “Pesadelo em Elm Street”. Eventualmente o filme acabou por ser feito na explosão da produção de terror que seguiu o sucesso de “Scream”.
Num género tão rico e diverso como o do cinema de terror - cheio títulos interessantes que ainda nos dias de hoje surgem e me surpreendem em cinema ou nos ‘streaming’ - não consigo deixar de rever o impacto cultural e até educacional que para mim as sagas ‘slasher’ dos anos 70 a 90 tiveram em mim.
*Texto da autoria de José Pedro Lopes, nascido no Porto em 1982, um entusiasta do cinema em diversas formas. Como realizador assinou a longa-metragem de terror “A Floresta das Almas Perdidas” e um segmento da sequela “Histórias Estranhas 2”, e episódios da série “Sem Filmes”. Como produtor é colaborador habitual das produtoras Anexo 82, Infilms Portugal e A Raposa Branca. Como jornalista foi colaborador de longa data do site C7nema. Vocalista da banda punk rock cinéfila Os Barbosas.