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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Cada um com a sua infância, cada um com o seu Cinema

Hugo Gomes, 01.06.21

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Good Morning (Yasujiro Ozu, 1959)

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The Childhood of a Leader (Brady Corbet, 2015)

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Capernaum (Nadine Labaki, 2018)

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Wadjda (Haifaa Al-Mansour, 2012)

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Home Alone (Chris Columbus, 1990)

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The White Ribbon (Michael Haneke, 2009)

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Let the Right One in (Thomas Alfredson, 2008)

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Little Fugitive (Ray Ashley & Morris Engel, 1953)

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The Florida Project (Sean Baker, 2017)

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The Sixth Sense (M. Night Shyamalan, 1999)

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The 400 Blows / Les Quatre Cents Coups (François Truffaut, 1959)

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The Kid (Charlie Chaplin, 1921)

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The Last Emperor (Bernardo Bertolucci, 1987)

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Zero to Conduite / Zéro de conduite: Jeunes diables au collège (Jean Vigo, 1933)

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Bicycle Thieves / Ladri di Biciclette (Vittorio di Sica, 1948)

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Village of the Damned (John Carpenter, 1995)

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My Life as a Zucchini / Ma vie de Courgette (Claude Barras, 2016)

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The Boy with Green Hair (Joseph Losey, 1948)

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Aniki Bóbó (Manoel de Oliveira, 1942)

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The Shining (Stanley Kubrick, 1980)

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Cinema Paradiso / Nuovo Cinema Paradiso (Giuseppe Tornatore, 1988)

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Come and See (Elem Klimov, 1985)

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Pather Panchali (Satyajit Ray, 1955)

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E.T. the Extra-Terrestrial (Steven Spielberg, 1982)

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André Valente (Catarina Ruivo, 2004)

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Ivan's Childhood (Andrei Tarkovsky, 1962)

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Nana (Valérie Massadian, 2011)

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Pixote, a Lei do Mais Fraco (Hector Babenco, 1981)

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Poltergeist (Tobe Hooper, 1982)

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800 Balas (Álex de la Iglésia, 2002)

Room Service!

Hugo Gomes, 09.06.20

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Chambre 212 (Christophe Honoré, 2019)

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Anomalisa (Duke Johnson & Charles Kaufman, 2015)

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The Best Exotic Marigold Hotel (John Madden, 2011)

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Don't Bother to Knock ( Roy Ward Baker, 1952)

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Four Rooms (Allison Anders, Alexandre Rockwell, Robert Rodriguez & Quentin Tarantino, 1995)

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The Grand Budapest Hotel (Wes Anderson, 2014)

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Home Alone 2: Lost in New York (Chris Columbus, 1992)

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1408 (Mikael Håfström, 2007)

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2046 (Wong Kar-Wai, 2004)

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The Shining (Stanley Kubrick, 1980)

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Some Like It Hot! (Billy Wilder, 1959)

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Room 304 (Birgitte Stærmose, 2011)

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The Bellboy (Jerry Lewis, 1960)

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The Million Dollar Hotel (Wim Wenders, 2000)

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Chelsea on the Rocks (Abel Ferrara, 2008)

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Hotel (Jessica Hausner, 2004)

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Love Steaks (Jakob Lass, 2013)

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Mekong Hotel (Apichatpong Weerasethakul, 2011)

Birra com Kubrick

Hugo Gomes, 01.11.19

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Há mais de 40 anos que Stephen King é um dos escritores contemporâneos da área do fantástico (e não só) mais conceituado e popular. E, naturalmente, um dos mais requisitados pelo cinema e televisão. Esta febre da “galinha dos ovos de ouro” começou em 1976 com a versão de Brian De Palma do seu bestsellerCarrie”. O escritor desprezou automaticamente a adaptação (como faria com outras), opondo-se à crítica entusiástica e ao culto que viria preservar o seu estatuto de obra-prima até aos dias de hoje (mesmo frente a um "remake" produzido em 2013), mas o repúdio não fez parar a ferrovia de conversões, umas atrás das outras, obrigando-o, a cada novo livro, a vender automaticamente os direitos de adaptação.

Foram muitos os que tiveram à mercê do paladar e do repúdio de King e outra adaptação merece aqui especial destaque: "The Shining". Os direitos foram encaminhados para Stanley Kubrick (não fizeram por menos!), que pegou no livro e adaptou-o "à sua maneira" e estética, transformando a visão paranormal e fantasiosa do escritor num estilístico e subtil filme de terror. A história remetia-nos para um escritor, Jack Torrance (Jack Nicholson), que aceitava um trabalho como segurança no histórico, remoto e fechado hotel Overlook, durante o rígido inverno nas Montanhas Rochosas do Colorado. Partindo com a mulher Wendy (Shelley Duvall) e o seu filho com habilidades psíquicas Danny (Danny Lloyd), o esperado e pacífico retiro onde Jack esperava começar a escrever o seu novo romance era, afinal, um depósito de fantasmas e outras entidades sobrenaturais que o levarão à loucura.

Em 1980, as críticas foram variadas e com a ajuda de um irado King por ver o seu material alterado e maleado às aspirações de Kubrick, "The Shining" chegou mesmo às nomeações para os Razzies (o equivalente aos Óscares, mas para os “piores filmes”). Até hoje, o escritor odeia a adaptação, o que o levou a apoiar uma muito criticada minissérie de 1997, mas felizmente o desprezo de outros evoluiu e o trabalho de Kubrick tornou-se e mantém-se como um dos mais influentes no género. Da "birra" de King materializou-se uma sequela literária em 2013: "Doctor Sleep" seguia o percurso de Danny e, como é óbvio, tendo em conta a mais primária lei capitalista, há que render a dita “galinha”. E assim chegamos ao nosso encontro com esta meia sequela, meio "reboot" de “The Shining”, com Ewan McGregor como protagonista (pergunta retórica: porque não recuperar Danny Lloyd?)

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Para o efeito de transladação, o estúdio convenceu o muito em voga Mike Flannigan (que já se havia aventurado no universo de King com "Gerald 's Game” da Netflix). Digamos que o seu trabalho aqui foi um pouco ingrato – estabelecer uma espécie de utopia entre o livro e o legado cinematográfico da obra de Kubrick. O resultado talvez seja mais inclinado para o primeiro fator, visto que “De Stephen King - Doutor Sono” (é mesmo assim o título em Portugal) preserva o tom rocambolesco de King. Convém frisar que competir com o original é um ato em vão: Kubrick executou um filme disperso, calculado e, na sua essência, misterioso, o que suscitou teorías de todo o género (basta ver o documentário “Room 237”, de Rodney Ascher). Por sua vez, “Doctor Sleep” é uma obra fechada, tecnicamente eficaz mas induzida numa espécie de anonimato quanto ao simbolismo imagético. E depois existe o frenesim tecnológico – o CGI para “branquear” o horror.

Ao contrário de “Terminator: Dark Fate”, do qual partilha a mesma data de estreia, não são os momentos de saudosismo que se revelam mais preciosos: quando “Doctor Sleep” não quer ser “The Shining 2” é que a sua personalidade é desvendada, obviamente tratada com dignidade por uma "vamp" Rebecca Ferguson enquanto vilã de serviço. O que fica é um filme competente mas a precisar de alguma personalidade. Ao realizador faltou a capacidade de se desviar dos eixos estabelecidos por King e, sobretudo, o peso dos que o antecederam. O que nos leva a pensar num filme com certos desvios narrativos que possivelmente funcionariam mais como série "à la Netflix" (e sabemos que Flannigan causou sensação nesse formato com “The Haunting of Hill House”) do que propriamente uma longa-metragem de duração estendida.

Mas… pelo menos não é um “It: Capítulo 2”, outra adaptação de King que andava “às aranhas” com o seu material.

Um coração "Iluminado" ...

Hugo Gomes, 31.10.19

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Agradeço ao Shining por me ter iniciado no género do terror! Foi o meu primeiro filme desse universo longo e duradouro, tinha 11 anos e o deparei por acaso na televisão. Estava sozinho em casa nesse dia … coisas que não se esquecem (até hoje tenho dificuldades em falar do filme).

Por isso o meu afeto pelo filme é demasiado grande, mas mesmo assim esse amor transpassou da mera recordação. Afirmo de “boca cheia”, e apesar do backlash que Kubrick tem em certos circuitos, é uma obra-prima, possivelmente só igualada com Eyes Wide Shut na carreira kubrickiana.

Longa vida ao Danny e Jack Torrance, ao Redrum, às gémeas, ao quarto 237 e porque não ao “Here’s Johnny!”.

 

"Clown Hype"

Hugo Gomes, 19.09.17

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Para entendermos a natureza desta nova versão do êxito literário de Stephen King, devemos inteirarmos numa das sequência-chaves de ambas as conversões, a infame minissérie que foi transmitida em 1990, e o filme que tem culminado num grandiloquente hype.

No projeto televisivo, Tim Curry veste a pele desta entidade que assume a forma do palhaço como catalisador de um medo comum e, não só, criar um engodo, uma empatia fraudulenta para com as suas vítimas. Na cena em questão, que intitularemos simplesmente como sarjeta, seguimos Georgie, uma criança que desfruta um dia chuvoso na “companhia” de um barco de papel, fabricado pelo seu irmão mais velho. Enquanto segue as correntes induzidas pela forte precipitação e das eventuais sarjetas que se encontram à berma dos passeios, Georgie perde a sua embarcação numa delas e, desesperadamente, ao tentar reavê-lo, é surpreendido por um palhaço. Existe nele um sorriso amigável, um discurso de promessas, iguarias, dotado de um humor matreiro, mas que para qualquer criança é um comité de confiança. O rapazinho cai na armadilha, assim como muitas crianças cairiam na “conversa de estranhos”, esses terrores comuns dos progenitores.

Claramente, com possibilidades de censura televisiva, nunca vemos verdadeiramente a criatura consumir a sua presa, tudo cai num cliffhanger de cena, dando lugar aos créditos iniciais. Na versão de 2017, por sua vez, o “palhaço”, agora interpretado por Bill Skarsgård (filho do ator Stellan Skarsgård), é uma ameaça evidente, sorriso malicioso, aspeto pomposo, com diálogos arrastados e uma voz asquerosa. Um verdadeiro pesadelo para a “criançada”. A sua abordagem é tudo menos engodo, a farsa como um isco, mas sim a persistência, aquela de consumir a sua presa o mais depressa possível. No caso da alimentação, contrariando o repentino corte da minissérie, este “IT” é explicitamente gráfico. A exposição dos novos tempos do horror acaba por contornar um dos grandes tabus do cinema de horror, isto porque poucos são os que demonstram expressamente a morte de uma criança de forma visualmente macabra.

Apontado por muitos como uma nova faceta do terror contemporâneo, e ainda mais a operar nos grandes estúdios, Andy Muschietti concebeu "Mama" há quatro anos atrás (apadrinhado por Guillermo Del Toro). Vencedor do Fantasporto, o filme apresentava um conjunto de nuances na vertente do fantástico e da estética terrorífica de outros tempos. Muschietti é fascinado pelo terror hoje “infabricável”, pelo desconhecido como signo e neste IT pelo regresso do carismático vilão do género (algo que não víamos desde a morte de Jigsaw na “longuíssima” saga iniciada por James Wan).

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Como importante influência na conceção desta ameaça antagónica, “A Nightmare on Elm Street” parece ganhar dimensão nos aspetos visuais e na tentativa de conceder uma atmosfera penetrável. Tal como as criação de Wes Craven, existe um imenso “carinho” pelo vilão, pela entidade maligna que se assume como o derradeiro protagonista de um conto sob contornos comuns do imaginário de King (sim, todo aquele cenário “Stand By Me” não é meramente déjà vu).

Nesse sentido, a “palhaçada” tem tendências a estorvar o potencial narrativo do filme. "IT" desenvolve-se desequilibradamente entre uma preocupação com as personagens (os jovens capazes que se fundem na reconstituição de época) e os jumpscares – como manda a agenda (até “Annabelle 2” conseguia ser mais inventivo nessa abordagem)- gratuitos que nada contribuem para um cenário de medo. Aliás, o medo é coisa inexistente por estas bandas.

Obviamente que somos induzidos a uma produção competente, quer a nível técnico (apesar do excesso do CGI que não se separa do protagonista), quer na narração (saber condizer duas nuances opostas é, em termos industriais, uma bravura). Porém, a competência nunca salvou projetos do esquecimento e em “IT” existe uma ausência de agressividade na sua abordagem … E não. Não me refiro ao grafismo, mas sim ao inconsciente, o elemento mais tenebroso de todos.  

A "palhaçada"

Hugo Gomes, 11.09.17

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Não existe nada de novo em «IT», nem como terror, nem como cinema comercial, mas é um episódio competente e dotado de curiosos pormenores que o mantêm longe da eventual "palhaçada". Tocando nesse ponto, o palhaço parece estorvar o potencial do filme, firmando-o num eventual regresso dos carismáticos vilões do género.

O Horror dividido / O Horror por inteiro

Hugo Gomes, 09.03.16

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O ecrã literalmente é dividido! É o split-screen que vem dar o último golpe ao reinado da narrativa estabelecida, o espectador pode por fim escolher por quem torcer. Quer nos agressores automaticamente destroçados e rebaixados a vítimas, ou na vítima que torna-se no mortal opressor. Os papéis invertem, “Carrie” demonstra a crueldade da vingança como a do vingador, assim como Sissy Spacek consegue automaticamente passar da doce e ingénua menina que vive o seu sonho na infernal “bruxa” que muitos pintaram … ou diríamos mesmo, num S.Sebastião com uma última palavra.

Stephen King pode retorcer quantas vezes quiser, o seu desdém por esta adaptação assim como aquela de Kubrick que tanto nós sabemos são a prova viva que nem sempre os escritores possuem o paladar criativo que transcenda entre artes.

Viva o nosso grande De Palma!