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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Dia do trabalhador!!

Hugo Gomes, 01.05.23

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La Sortie de l'usine Lumière à Lyon (Auguste Lumière & Louis Lumière, 1985)

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Modern Times (Charlie Chaplin, 1936)

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Tout va Bien ( Jean-Luc Godard & Jean-Pierre Gorin, 1972)

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La loi du marché / The Measure of a Man (Stéphane Brizé, 2015)

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Trabalhar Cansa (Juliana Rojas & Marco Dutra, 2011)

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La mano invisible / The Invisible Hand (David Macián, 2016)

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North Country (Niki Caro, 2005)

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Sorry We Missed You (Ken Loach, 2019)

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Stachka / Strike (Sergei Eisenstein, 1925)

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Ressources Humaines / Human Resources (Laurent Cantent, 1999)

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Labour of Love (Aditya Vikram Sengupta, 2014)

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A Fabrica do Nada (Pedro Pinho, 2017)

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Vida Activa (Susana Nobre, 2014)

Só espero que os russos amem os seus filhos (e os seus filmes) ...

Hugo Gomes, 04.03.22

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Russian Ark (Aleksandr Sokurov, 2002)

O que está a acontecer perante os nossos olhos é horrível, mas peço-vos que não cedam à loucura. Não devemos julgar as pessoas pelos seus passaportes. Devemos, sim, julgá-las pelos seus actos”. Sergei Loznitsa falou e pelos vistos ninguém quis ouvir o cineasta bielorrusso (tendo em conta o processo em marcha de “higienização russa” no estado das artes, nomeadamente no espectro cinematográfico). 

Numa guerra, é “normal” seguir-se por uma via de oposição contra o “outro” fora da somente matéria bélica, dando o exemplo da Segunda Guerra Mundial, a propaganda vindo dos americano que “pintavam” o nipónico, esse inimigo que partilhavam o Oceano Pacífico, como a “criatura nefasta" possuidora de todos os males da Humanidade. Era visível essa caricatura nos seus medias e nas vinhetas cinematográficas que mais tarde transpuseram para a narrativa cinematográfica em geral. Mesmo após a rendição dos japoneses, a "japanofobia" mantinha-se em solo americano anos após anos, e quanto à representação audiovisual, a prejudicial caricatura convertia-se numa outra ainda mais vincada. Perdendo a sua aura ameaçadora, o que restava era a ridicularização. 

A "russofobia", por outro lado, não se resume em somente caricaturar um povo (o cinema norte-americano encarregou-se disso nestes anos todos), mas sim inibi-lo da sua existência cultural. Tendo em conta as imagens divulgadas pelos órgãos de comunicação, aquele povo não estão totalmente alinhado com as ideias e agressões “putinescas”, o qual é lhes depositado esperança de cessam do conflito, mas enquanto isso segue-se a todo o gás, um "boicote" a toda uma produção cultural daí gerada. Cortes abruptos aos filmes russos em festivais e prémios, uma sanção cúmplice a outras sanções financeiras que tem como âmbito “parar” essa Rússia não consensual, medidas que são só possíveis perante os avanços da globalização. Mas quais são as implicações desses atos? Loznitsa falou exatamente disso na sua declaração; o sufoco de “vozes” interiores e críticas das políticas de Putin, e ainda mais, dos dissidentes como é o caso de Kirill Serebrennikov (“Leto”, "Petrov's Flu”), e uma possível mitigação de um cinema politizado e possível dentro de um sistema financeiro que concentrava uma atitude anti-estereótipos (Putin não é a Rússia, Russia não é Putin). 

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Ivan The Terrible (Sergei Eisenstein, 1944)

O que será deles? Manteremos o combate à Rússia colocando em cheque a sua própria cultura? A verdade é que esta manifestação já está a evidenciar algumas medidas e precauções; um curso académico italiano sobre Dostoievski cancelado, num ciclo em homenagem ao escritor de ficção de científica Stanislaw Lem [polaco] na Filmoteca de Sevilha testemunhou a substituição do programado “Solaris” de Andrei Tarkovsky pela versão de Steven Soderbergh, a pressão no meio académico para suprimir qualquer referência cultura russa (literatura, cinema, música) das diferentes cadeiras (“O que será da História de Cinema sem Vertov?”) e, talvez insignificante mas igualmente preocupante, o silencioso desaparecimento de filmes russos do muito consultado Top 250 do site IMDB. Sabendo que esta Guerra, que poderá culminar numa Mundial ou quem sabe numa Nuclear, é um ataque aos Direitos Humanos, disso não há dúvida nem contestação (trata-se de um país invadido por um país invasor), mas entristece-me que este movimento de asfixia e de preconceito em tempos onde o politicamente correto e o cancelamento cultural são realidades (não confundir este fenómenos com estas duas manifestações) poderá ter consequências futuras no legado cinematográfico. Sejam na produção das obras do amanhã, seja nas relações das próximas gerações com o património russo. 

O que será de nós sem Eisenstein e outros soviéticos que tanto nos ensinaram o poder da montagem? O que será de nós sem o tempo esculpido de Tarkovski? O que será de nós sem as teias de poder examinadas por Sokurov na sua tida quadrilogia? O que será de nós sem o mais poderoso retrato anti-guerra que o cinema alguma vez filmou? Sim, falo de Elem Klimov e o seu “ Come and See” (1985). O que será de nós? Aliás, antes de responder a todas estas questões, estaremos insensíveis só pelo facto de estarmos a pensar nelas? 

 

“I don't subscribe to this point of view

Believe me when I say to you

I hope the Russians love their children too

We share the same biology, regardless of ideology

But what might save us, me and you

Is if the Russians love their children too”

Sting - Russians 

 

Eisenstein & Pudovkin: Sempre camaradas até que a montagem os separe ...

Hugo Gomes, 17.01.22

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Battleship Potemkin (Sergei M. Eisenstein, 1925)

Odessa, 1905, uma multidão festeja o “heroíco” tumulto num dos couraçados a poucos metros da costa do Mar Negro. Pairam brisas de novos tempos, novas ideias, novas revoluções que possam por fim colocar homens e mulheres lado a lado, de maneira equivalente. No entanto, ouve-se um disparo (o silêncio encarrega-se de aludir ao som do fuzil), a guarda ao serviço do Czar rompe furiosamente e mecanicamente pela multidão, que pela escadaria abaixo foge dos iminentes castigos de insurreição. Homens fardados que se alinham, degrau a degrau, disparando sobre homens, mulheres e crianças. E sob o cenário de horror, a tripulação do couraçado triunfante decide recorrer aos pedidos de ajuda dos habitantes de Odessa. O barco de guerra lança a sua fúria sobre terra, com objetiva mirada ao majestoso teatro da cidade, o quartel-general das forças czaristas. Neste momento, uma sucessão de imagens ocorre, um leão de pedra adormecido, repentinamente acorda e demonstra o seu temor pela derrota. 

 

Soviéticos ao poder!

Ato célebre e eternizado da obra-prima de Sergei M. Eisenstein (1898 - 1948) - “O Couraçado Potemkin" ("Battleship Potemkin", 1925) - a apropriação de um evento real que encontrou no cinema a sua transposição. Difícil mesmo é o de separar a História desta parte de história cinematográfica. “Aquilo que passou pelo cinema e foi por ele marcado, já não pode entrar noutro sítio”, afirmação de Jean-Luc Godard na sua série “Histoire(s) du Cinéma”, 60 anos depois da primeira projeção oficial do filme de Eisenstein. Ainda hoje, a escadaria de Odessa, imortalizada na obra e que nenhuma relação teve com o verídico motim, é  curiosidade turística aos estrangeiros-passageiros, provando que Lenin tinha razão em apostar na “mais jovem das artes” para servir de porta-voz à sua implantada ideologia. E a cena descrita anteriormente é uma prova desse estandarte visual que o cinema assumiu, a transcrição e tradução da História, atribuindo-lhe uma conotação desejada e para essa “maquineta” operar, uma engenharia teve que ser aprimorada e aperfeiçoada. 

Eisenstein, fervoroso estudioso da montagem, da sua causa e efeito e das possibilidades da mesma, revelou-se num dos importantes peões para a luta do bolchevismo cinematográfico, à escola soviética que se avançava nas (re)invenções narrativas e nas interações destas para com o espectador. Os seus filmes perduram, “O Couraçado Potemkine” é tido como o apogeu do cinema soviético, a experiência feliz (dentro de muitos dos seus fracassos e filmes incompletos) tido pelo cineasta (chamaremos assim para o definir do restante). Mas não fora o único pedestre dessa instituição, do outro lado, também endereçado à Causa, está Vsevolod Pudovkin (1893 – 1953), “camarada” que nos apresentou outras ferramentas doutrinais envolvidas em grandes narrativas e epopeias humanas. Entre os seus inúmeros trabalhos, conta-se a sua intitulada “trilogia bolchevique” – “A Mãe” ("Mother", 1926), “O Fim de São Petersburgo("The End of St. Petersburg", 1927), “Tempestade sobre a Ásia” ("Storm Over Asia", 1928) - que permanecem como exemplos reconhecíveis de um movimento cinematográfico por excelência. 

mother.webpMother (Vsevolod Pudovkin, 1926)

Kuleshov no centro da ação

Para ambos, as imagens fílmicas encarreguem-se de ser palavras, e a combinação destas [por via da montagem], assumem como frases de uma língua à parte, denominada de cinema. Eisenstein e Pudovkin demonstraram destreza em exercitar e empregar o “Efeito Kuleshov”, quer nas suas obras publicadas, quer nas suas obras realizadas e montadas. Elaborado pelo cineasta e um dos fundadores da primeira escola de cinema do Mundo, Lev Kuleshov, o efeito consistia em demonstrar o poder e as possibilidades da montagem no que refere a dar um significado no usos da justaposição, ou seja, uma imagem sozinha não possuía mais do que a sua denotação, e em sequência com outra assumiria assim uma outra leitura (possivelmente dependente da percepção e cognoscibilidade do espectador).

No famoso exercício, foi juntado, por exemplo, um plano de um homem inexpressivo [o ator Ivan Mosjoukine] e de seguida a imagem de um prato de sopa, que por sua vez atribuíam a ideia de fome à tal “personagem”. Coloca-se novamente a imagem do homem, e uma criança dentro de um caixão como par, o significado torna-se outro, o de pesar ou tristeza. Por último, e deixando intacto o sujeito, é a vez de uma mulher preencher a ligação, e nesse sentido tudo altera, não é de fome nem de lamento, mas de desejo. Curiosamente os alunos, perante este exercício, teceram elogios à performance do ator.  

Eisenstein e Pudovkin partiram com o exercício em grande escala, tentando com isso socorrer as imagens aos seus pretendidos propósitos, um “enchimento” ao subconsciente do espectador. Se o primeiro acrescenta às imagens de motim com o abate de gado em “A Greve” ("Strike", 1925), já o segundo emana a revolução com paralelismo de imagens primaveris no clímax de “A Mãe”. Eisenstein exaltou a violência na violência do seu filme, e colocando em subtexto o gado no matadouro com a relação das forças czaristas para com os manifestantes, enquanto que Pudovkin referiu ao sacrifício da classe operária e dos prisioneiros de regime como o início de uma Primavera que toma o lugar do longo Inverno, uma revolução à porta.     

 

As diferenças que os unem

Agora, o que o diferenciou dos dois mestres encontra-se na tipologia dos velcros das suas idênticas ideias. Para o filósofo Gilles Deleuze (1925 - 1995), a escola soviética foi importante para a fundamentação da sua longa tese da imagem-movimento, pelo que em relação à instituição e aos dois autores em geral, referiu assim no seu “Cinema 1: A Imagem-Movimento”:

Se é possível falar de uma escola soviética de montagem não é porque os seus autores se assemelham mas ao contrário, porque diferem na concepção dialética que lhes é comum, estando cada um deles em afinidade com tal ou tal lei que a sua inspiração recria.”

Eisenstein repescava e trabalhava eventos reais numa escala grandiosa, e como tal dirigia-se no coletivo. Na sua trilogia revolucionária - “A Greve”, "Couraçado Potemkine", “Outubro” (October, 1927) - não encontramos personagens, apenas arquétipos, figuras-simbólicas para o avanço dos eventos. Ausência de heróis a solo, só o povo, a comunhão, e a união são, sim, atos heróicos, contra a vilania das forças contrarrevolucionárias. No cinema de Pudovkin, por sua vez, a narrativa avança com uma personagem, que vai desenvolvendo ao longo da narrativa, a sua epifania está na entrega total das ideias comunistas, seja essa a via de reencontro entre a mãe e o seu filho em “A Mãe”, o camponês que se apercebe das forças capitalistas que corrompem a sua moral, em “O Fim de São Petersburgo", ou o mongol atraiçoado pelos brancos que segue no apelo de Moscovo, em “Tempestade sobre a Ásia". Por outras palavras, o cineasta esteve interessado na progressão da consciência. 

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October (Sergei M. Eisenstein, 1927)

Contudo, Eisenstein, mesmo assumindo a sua grandiloquência (o seu “cinema de atrações”), teoricamente pregava a força da primeira grande imagem. “Uma imagem que seja verdadeiramente um indício, que funcione como um indício” teria dito o realizador a Mikhail Romm, para a edição de abril de 1970 da Cahiers du Cinéma, no âmbito de como conduzir-se num projeto fílmico, e como apresentar a mensagem neste, optando por planos-pormenores que resultam em simbólicos atalhos às tramas dramáticas ou psicológicas dos filmes. Para Deleuze, Eisenstein teria pensado nas botas em “Tempestade sobre a Ásia” de Pudovkin, o momento em que um soldado inglês de botas engraxadas evita o lamaçal na direção dos areais onde irá executar o prisioneiro mongol, depois do fuzilamento, atravessaria de modo derrotado (“desonrado”) a lama havia evitado. 

E é esse o processo mais geral da obra de Pudovkin: seja qual for a grandeza do meio apresentado, São Petersburgo ou as planícies da Mongólia, seja qual for a grandiosidade da ação revolucionária a cumprir, vai-se sempre de uma cena em que os comportamentos revelam um aspecto da situação para outra cena, cada uma delas marcando um momento determinado da consciência e conectando-se com as demais para formar a progressão de uma consciência que se torna adequada ao conjunto da situação revelada.Deleuze.

 

O segredo está na montagem e o que fazer com ela

Se Pudovkin inteirava-se numa equação de quantidade e de qualidade, Eisenstein, mesmo entendendo a sua dialética, posicionava-se na oposição. Julgava, e possivelmente com razão, que teria criado uma nova forma - “uma forma com transformação” - a criação de novas unidades nas suas imagens. Deleuze menciona a sua inserção de imagens indiretas, imagens essas que relação alguma tinham com a ação central, entre os exemplos está a famosa intercalação do gado abatido e os violentos protestos “contidos” pelas autoridades. Ao contrário, do gelo que quebra como sinal de uma Primavera a arrebitar, que bem poderia interagir, paralelamente, com o “abraço de morte” daquele reencontro entre mãe e filho no filme de Pudovkin [“A Mãe”], ambas as ações diluem numa só (por via da "montagem poética" que passarei a explicar), a figuração de Eisenstein nos seus filmes é plástica, ou como como Deleuze afirma, chegando mesmo a ser “teatral”, e assumem como apêndices metafóricos à ação, causa-efeito, dos seus filmes. Os leão acordados pela munição de Potemkin mencionado no primeiro parágrafo deste artigo expõe um dos expoentes máximos dessa "metaforização" imposta no cinema de Eisenstein

O também teórico e crítico de cinema, Marcel Martin (1926 - 2016), enunciou no seu livro, “A Linguagem Cinematográfica” ["Le Langage Cinematographique"], os diferentes tipos de montagem, tendo os seus propósitos, as suas vontades e o registo significativo atribuído. O autor referiu ter sido crucialmente influenciado pelas obras publicadas dos dois referidos cineastas. Assim, ele indiciou a montagem ideológica (criadora de uma ideia), montagem metafórica (o qual podemos incluir as referidas cenas dos filmes de Eisenstein), a montagem poética (Pudovkin entra nessa definição), montagem alegórica, montagem intelectual (Eisenstein é novamente exemplificado), montagem rítmica (musical ou decorativa), montagem formal (um jogo de oposição formais e visuais) e montagem subjetiva (na primeira pessoa).

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The End of St. Petersburg (Vsevolod Pudovkin,1927)

Martin construiu esta taxonomia, afastando-a das nomenclaturas trazidas por Pudovkin e Eisenstein. O realizador de “A Mãe” traz para “cima de mesa” as seguintes definições: paralelismo (o seu filme e a referida presença da Primavera como exemplo), simbolismo (o significado trazido pelas imagens do matadouro na “A Greve” de Eisenstein), sincronismo, antítese e o motivo principal. No caso de Eisenstein, com prestígio por parte do próprio Martin - “segundo a minha opinião, proporcionou a melhor tabela de montagem, porque ela comporta (ainda que a sua leitura seja um pouco difícil) todos os tipos de montagem, dos mais elementares aos mais complicados" - reconhece as seguintes montagens: métrica (baseada no comprimento dos planos), rítimica, tonal (baseada na ressonância emocional do plano), harmónica (baseada na dominante afetiva ao nível da totalidade do filme) e intelectual. 

Esta listagem, mais tarde “higienizada” e categorizada por Martin, que funcionaria como a moderna taxonomia da montagem cinematográfica, as frases dessa língua partilhada por Eisenstein e Pudovkin, que se dá pelo nome de Cinema, mas distanciamos por dialéticas divergentes. Esta foi o sumo da escola soviética, a consciência de um poder semiótico das imagens em movimento, ao serviço de fins políticos, que mesmo assim redefiniram e abriram portas a um cinema posterior e igualmente ardente.

Ambos os autores pegaram em experiências “griffthianas” (referente ao realizador norte-americano D.W. Griffith que do outro lado do Oceano pratica o cinema progressista, que definiu a narrativa / montagem paralela e estabeleceu o grande plano para uso dramático) e as transformaram numa arte intelectualizada capaz de movimentar milhões em direção a uma utopia. Uma utopia falhada, como bem sabemos, mas, inconscientemente, reafirmaram-se numa outra união, a cinematográfica.

Desejo voltar aos modos de montagens de ambos, aos seus filmes e à dialética imposta.

Arquiteturas do olhar

Hugo Gomes, 27.11.21

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The French Dispatch (Wes Anderson, 2021)

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The House on Trubnaya Square / Dom na Trubnoy (Boris Barnet, 1928)

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Manhattan (Woody Allen, 1979)

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My Uncle / Mon Oncle (Jacques Tati, 1958)

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Rear Window (Alfred Hitchcock, 1954)

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Strike / Stachka (Sergei M. Eisenstein, 1925)

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WR: Mysteries of the Organism (Dusan Makavejev, 1971)

Há Tempo para degustar o Cinema! Arranca o 4º Close-Up, Observatório de Cinema de Famalicão

Hugo Gomes, 10.10.19

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Les Yeux sans Visage (George Franju, 1960)

O Tempo destrói tudo, isso é mais que sabido, mas ele também constrói. Constrói uma perspetiva, uma noção e acima de tudo a História. Neste caso a História do Cinema, que é novamente revisitada no CLOSE-UP – Observatório de Cinema, neste seu quarto episódio, como é habitual, a ter lugar na Casa das Artes de Famalicão, entre os dias 12 a 19 de outubro.

Novamente, uma programação recheada de filmes, concertos, temáticas, round tables e muitos convidados naquela que já é a mais respeitada comunhão de cinefilia do país. E voltando ao Tempo, a História do Cinema que é constante revista, CLOSE-UP contará como prato principal dois acompanhamentos musicais a dois dos grandes clássicos do cinema russo; o sempre incontornável “Battleship Potemkin” / “O Couraçado Potemkin”, de Sergei Eisenstein, com a Orquestra de Jazz de Matosinhos a condizer, e o aclamado filme de Boris Barnet, “The House on Trubnaya Square” / “A Casa na Praça Trubnaya”, onde os Mão Morta assumem uma original banda-sonora. Já nas sessões especiais, a História do Cinema pelos olhos delirantes de Quentin Tarantino, “Once Upon a Time... in Hollywood”, e a antestreia da mais recente obra do filipino Brillante Mendoza, que volta a debruçar-se pela teias criminosas e marginais de Manila em “Alpha: The Right to Kill”.

A fortalecer a temática do Tempo, ainda temos o historial condensado num folhetim imagético em “Le livre d'image”, do sempre intemporal Jean-Luc Godard, ou do tempo enquanto dispositivo manipulável em “John McEnroe: O Domínio da Perfeição” / “L'empire de la perfection”, de Julien Faraut. A Lenda e o Contemporâneo do atual Cinema Francês, dois pontos de partida para uma das secções fundamentais desta anual mostra cinematográfica – Histórias de Cinema – que nos brinda com um Passeio pelo Cinema Francês com dois protagonistas: Agnès Varda e Jean-Luc Godard.

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Halito Azul (Rodrigo Areias, 2018)

Aí, para além dos filmes da cineasta que apaixonou gerações pela sua criatividade e dinamismo e o realizador que continua a fomentar cinefilias, passearemos por alguns dos clássicos ante-Nouvelle Vague de uma das cinematografias mais fortes a nível internacional. Será o brilhante “Les Yeux sans Visage”, de George Franju, ou a viagem pela metrópole americana em “Deux hommes dans Manhattan”, de Melville, ainda as histórias trágicas e tragicómicas de “Le Plaisir”, de Max Ophuls, e até mesmo um dos mais belos casamentos de imagem e música de “Ascenseur pour l'échafaud”, de Louis Malle, a fazer as delícias dos amantes de cinema? A resposta é sim.

Na também habitual Fantasia Lusitana, espaço dedicado aos ascendentes protagonistas do cinema português, conheceremos (ou revisitarmos) o trabalho de Eduardo Brito, realizador, argumentista e fotógrafo, descrito pelo seu olhar perfeccionista e dedicado aos enquadramentos. Aqui deparamos com uma seleção de curtas da sua autoria, incluindo a estreia de Úrsula, como também vídeos experimentais, videoclipes e ainda uma longa-metragem escrita pelo próprio com a realização de Rodrigo AreiasHálito Azul”.

O cinema terror também terá o seu tempo de antena, ao integrar o espaço de Cinema do Mundo, este ano centrado no género profundo (“Mandy”, “The Love Witch” e “It Comes at Night”, compõem o trio de sessões que explicita o terror e o medo na América). Além disso, o CLOSE-UP contará ainda com sessões dedicadas às escolas e de família, com as exibições de “Toy Story 4” e “The Lion King”, como ainda tempo exclusivo para o legado de João César Monteiro, onde serão mostradas algumas das suas curtas como ainda lidas os seus poemas. Para a cadência das suas palavras, Isaque Ferreira será o responsável pela leitura.