Emoldurar Mumbai ...
Há cinco anos, o sucesso de “A Lancheira” (“The Lunchbox”) demonstrou a uma grande maioria, por vezes preconceituosa, que existia mais cinema indiano para além da fórmula de "Bollywood" ou das visões de gringos "à lá Dev Patel" e "Slumdog Billionaire". Quem conseguiu esse feito foi o realizador Ritesh Batra, ao conservar em âmbar um panorama cultural que era fundido numa narrativa tão convencional e nem por isso menos apaixonada. Obviamente, que o cinema indiano não se resume, ou se resumiu, às tendências atrás referidas, mas foi com a história da involuntária troca de uma lancheira que despoletou um romance fantasioso que colocou estas novas audiências no trilho da sensibilidade hindi.
Após “A Lancheira”, Batra iniciou uma digressão pelo mundo fora, com paragens obrigatórias no Reino Unido (“The Sense of an Ending”, em 2017) e nos EUA (“Our Souls at Night”, em 2018, que reuniu Robert Redford e Jane Fonda) até regressar a Mumbai com um outro romance de achados. Uma fotografia é agora o objeto catalisador de uma nova fantasia amorosa, com ligações terrenas a questões de castas, divergências religiosas e discriminação na sociedade indiana onde os tons de pele são indicadores de um estatuto social trabalhado desde os primórdios do indivíduo.
Infelizmente, “Fotografia” (“Photograph”) perde-se por essa denúncia, mesmo estando subtilmente endereçada aos gestos e diálogos das suas personagens. É nas relações entre esses novos peões das teias romantizadas de Batra que descobrimos mais o fascínio de quem está a regressar à sua cidade após anos na estrada e menos propriamente dedicado a elaborar o seu enredo e, acima de tudo, a sua mensagem. Talvez seja essa familiaridade, em que as audiências ocidentais perdem-se nos pequenos pormenores, elucidadas em desvendar os pontos-chaves do argumento. Um engano consequencial derivado da narrativa convencional e por vezes anglo-americanizada, que serve de disfarce perante o reconto da história de um homem completamente envidraçado em Mumbai.
Apesar disto, os elementos de um espetáculo ao coração são de um cuidadoso rigor, da fotografia de cores salientes que emana um exotismo onipresente (para uma obra intitulada de “Fotografia”, o visual teria que ser uma referência) ao um som envolvente que somente é interrompido com uma banda sonora melosa (de Peter Raeburn). Mas o que há para se fazer sob estes termos? A resposta está numa das cenas principais, quando o casal protagonista, após uma ida ao cinema local, refere, em jeito de filosofia barata, que "os filmes de hoje são todos iguais". Talvez tenham razão, porque conforme seja a geografia, a fórmula volta sempre a repetir.