Cine Amadora chega à 2ª edição! Fazer da cidade a "grande tela do cinema lusófono".
"Manga d'Terra", de Basil da Cunha, exibido no dia 6 março
Procurando na cidade da Amadora, a sua história, a sua língua… ou melhor, as suas línguas, e, transversalmente, o seu cinema, o Cine Amadora aposta em ser mais do que uma mera montra de filmes, e sim, a pretensão de transformar o cinema numa ferramenta de proximidade, numa ponte cultural e social, num evento que transcende estâncias e conformidades.
Na sua segunda edição, que decorrerá entre 6 e 9 de março, com entrada livre nos Recreios da Amadora, Eron Quintiliano, diretor artístico do festival, revelou ao Cinematograficamente Falando … o que esperar deste regresso — e as suas ambições de tornar o evento um cantinho afetivo desta cidade, distanciando-a culturalmente do cognome de “subúrbio de Lisboa”. Porque há vida na Amadora, e logicamente, Cinema!
O Cine Amadora tem vindo a afirmar-se como um espaço de resistência e celebração do cinema lusófono. O que diferencia esta segunda edição da anterior?
O Cine Amadora mantém o seu compromisso com a valorização do cinema em língua portuguesa, mas, nesta segunda edição, aprofundamos ainda mais as nossas temáticas e ampliamos a programação. Um dos grandes diferenciais desta edição é o reforço da presença de realizadoras, consolidando a missão de dar visibilidade ao trabalho das mulheres na sétima arte. Além disso, expandimos as ações de formação de públicos com debates, com um olhar mais atento para o diálogo intergeracional e o acesso democrático à cultura, através de sessões direcionadas para escolas e seniores. Esta edição também se fortalece através das colaborações institucionais, como a Carta Branca à Escola Superior de Teatro e Cinema (ESTC) e a parceria com outros festivais lusófonos, ampliando a rede de circulação de filmes.
A cidade da Amadora é frequentemente retratada através de estereótipos, maioritariamente desabonadores. De que forma o festival procura desconstruir essas narrativas e apresentar um outro olhar sobre este território?
A Amadora é um território vibrante, diverso e cheio de talento, mas muitas vezes a sua imagem é moldada por estereótipos negativos. O Cine Amadora nasce exatamente da necessidade de contrariar essas narrativas redutoras, apresentando a cidade como um pólo de criação e exibição cinematográfica. A curadoria do festival privilegia histórias que refletem essa pluralidade cultural, mostrando a Amadora como um espaço de encontros, onde diferentes trajetórias e experiências coexistem. A nossa equipa e parcerias trabalham diretamente com comunidades, escolas e coletivos artísticos, há um sentimento de pertença e envolvimento ativo com o público.
- "Césaria Evóra", de Ana Sofia Fonseca (dia 9 de março)
- "Pedágio", de Carolina Markowicz (dia 7 de março)
- "Big Bag Henda", de Fernanda Polacow (dia 8 de março)
O cinema é diversas vezes visto como uma ferramenta poderosa de transformação social. Que impacto espera que o Cine Amadora tenha na comunidade local e no panorama cinematográfico lusófono?
O impacto do Cine Amadora ocorre em várias frentes. No plano local, queremos criar uma relação contínua entre a cidade e o cinema, democratizando o acesso e fomentando o gosto pela sétima arte, especialmente entre os jovens. Com as sessões gratuitas e direcionadas a diferentes públicos, tornamos a experiência cinematográfica acessível a todos, promovendo um diálogo aberto sobre as narrativas que nos representam.
No contexto lusófono, o festival atua como uma plataforma de visibilidade para filmes que muitas vezes encontram dificuldades de circulação. Ao criar pontes entre cineastas, festivais e públicos de diferentes países, o Cine Amadora contribui para o fortalecimento da produção cinematográfica em língua portuguesa.
A programação deste ano reforça o protagonismo das realizadoras e a luta contra as desigualdades de género na sétima arte. Que desafios ainda persistem para que o cinema feito por mulheres deixe de ser visto como um nicho?
Apesar dos avanços na representatividade feminina no cinema, persistem desafios estruturais. As mulheres ainda encontram dificuldades de acesso a financiamento e distribuição, além de enfrentarem barreiras invisíveis na construção das suas carreiras. O Cine Amadora procura contrariar essa tendência, promovendo um espaço de visibilidade e reflexão sobre a desigualdade de género no setor. Ao colocar realizadoras em destaque, procuramos normalizar a presença feminina atrás das câmaras e incentivar a próxima geração de cineastas a ocupar estes espaços com mais força e legitimidade.
O Cine Amadora não se limita à exibição de filmes, mas aposta também na formação e no intercâmbio cultural. Como vê a importância dessa vertente educativa dentro do festival?
A dimensão educativa do Cine Amadora é essencial. Para além da exibição de filmes, oferecemos workshops e encontros com realizadores, criando um espaço onde o público pode consumir cinema, e também compreendê-lo, discuti-lo e, quem sabe, produzi-lo. Acreditamos que um festival de cinema deve ser um catalisador para a criação de uma comunidade cinéfila ativa e engajada. Nesse sentido, o intercâmbio cultural é um dos eixos centrais do festival, promovendo ligações entre criadores lusófonos e estimulando a colaboração entre diferentes geografias e perspetivas.
Com sessões dedicadas a públicos específicos, como escolas e seniores, o festival reforça a democratização do acesso à cultura. Como tem sido a resposta do público a essa abordagem?
A resposta tem sido positiva. As sessões para escolas, deverão ser momentos de envolvimento e debate, onde os alunos descobrem novas cinematografias e são incentivados a refletir criticamente sobre as histórias que consomem.
As sessões dedicadas aos seniores buscam proporcionar um espaço de encontro e memória, onde a sétima arte funciona como um elo entre diferentes gerações. Para nós, este tipo de programação amplia o público do Cine Amadora, reforçando a importância do cinema como ferramenta de inclusão e partilha intergeracional.
"Chelas nha kau" do coletivo Bataclan 150, dia 9 de março
Gostaria que nos falasse sobre as parcerias do Cine Amadora com outras instituições [MUTIM] e festivais [Olhares do Mediterrâneo, MICAR], em particular a ligação à Escola Superior de Teatro e Cinema, que nesta edição recebe uma carta branca para apresentar uma seleção de trabalhos dos seus alunos.
A colaboração com a Escola Superior de Teatro e Cinema (ESTC) é um dos pilares do Cine Amadora. Ao conceder-lhes uma Carta Branca, reconhecemos o papel essencial da ESTC na formação de novos talentos do cinema português.
É especialmente simbólico poder exibir uma curta-metragem de Leonor Teles, uma cineasta que deu os seus primeiros passos na ESTC e que hoje é um nome incontornável do cinema nacional. Com esta parceria, criamos um circuito de visibilidade para jovens realizadores, reforçando o compromisso do Cine Amadora em fomentar a renovação do cinema lusófono.
Depois de um ano zero experimental e uma primeira edição de consolidação, o que podemos esperar do futuro do Cine Amadora? Há planos para expandir a mostra para além dos Recreios da Amadora? Extensões ou itinerâncias?
Neste momento, não temos planos para expandir o Cine Amadora para além da cidade, mas sim reforçar a mostra e consolidar a Amadora como a grande tela do cinema lusófono. O nosso foco está em fortalecer a programação, aprofundar as parcerias e continuar a atrair novos públicos e profissionais do sector. Para o futuro, pretendemos ampliar o festival no sentido de introduzir sessões competitivas, permitindo a participação de filmes inesperados e representativos de todos os países de língua portuguesa. Acreditamos que a produção cinematográfica tem crescido significativamente, mas muitas dessas obras encontram dificuldades em alcançar o seu espaço e distribuição. Queremos descobrir e dar visibilidade a esses filmes, oferecendo um palco onde possam ser vistos e reconhecidos.
A expansão dentro da própria cidade está também nos nossos planos, assim como a possibilidade de extensões itinerantes, levando o festival a novos territórios e públicos e reforçando a nossa missão de tornar o cinema mais acessível e diversificado.
Queremos que o Cine Amadora continue a fortalecer-se como uma plataforma essencial para o cinema lusófono, promovendo novas narrativas, estimulando a reflexão crítica e, acima de tudo, fazendo da Amadora um centro vibrante da sétima arte.
Toda a programação poderá ser consultada aqui