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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Um anjo no Cinema, um diabo na Terra: para Alain Delon a Sétima Arte foi sua e apenas sua.

Hugo Gomes, 18.08.24

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La prima notte di quiete (Valerio Zurlini, 1972)

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Rocco e i suoi fratelli (Luchino Visconti, 1960)

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Plein soleil (René Clément, 1960)

Um galã, um “adónis", um “anjo de olhos azuis”, uma figura controversa, uma “besta” disfarçada, um sedutor endiabrado, o “ator mais cool”, o senhor, o heroi e o vilão. Estas e muito mais designações ou cognomes para aquele que foi, em todas as perspetivas, uma imagem incontornável do nosso tempo, do nosso cinema, do conceito tido e fora de Hollywood de estrela de cinema. Alain Delon, com as suas enigmáticas íris azuladas, o rosto angelical petrificado o qual conservou até à sua avançada idade, sucumbiu pelas leis da Natureza, a lição é que nem ele é eterno. O primeiro Ripley do cinema, o parceiro do crime de Melville, o nêmesis da dupla da improvável Charles Bronson e Toshiro Mifune, a outra e conturbada metade de Monica Vitti em desígnios antonionianos, as suas carícias no corpo de Romy Schneider com piscina incluída, a vida, essa, maldita que lhe pesou nos ombros pela condução de Visconti, mais a nostalgia de um leopardo numa das mais belas incursões cinematográficas de sempre. Olhar para Delon é mirar cinema em toda a sua forma, e, tendo em conta o seu “ponto final”, quer o seu lado heroico, quer o seu lado ‘velhaco’, consoante a posição de quem a égide, de momento nada mais importa. O corpo vai, e o espectro, esse, emoldurado no Cinema, persiste. Longe de tudo. O cinema fazia parte do ADN de Delon, não há rosto mais patrimonial destes últimos anos que a dele.

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"L'Insoumis" (Alain Cavalier, 1964), filme que serviu de inspiração para a capa do album "The Queen is Dead" da banda The Smiths

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Com Romy Schneider em "la Piscine" (Jacques Deray, 1969)

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Le Samouraï (Jean-Pierre Melville, 1967)

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L’Eclisse (Michelangelo Antonioni, 1962)

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Com Agnès Varda na rodagem de "Les Cent et une nuits de Simon Cinéma" (1995)

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Le Cercle Rouge (Jean-Pierre Melville, 1970)

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Com Charles Bronson na rodagem de "The Red Sun" (Terence Young, 1971)

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Com Claudia Cardinale no magnífico "Il gattopardo" (Luchino Visconti, 1963)

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Zorro (Duccio Tessari, 1975)

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Nouvelle Vague (Jean-Luc Godard, 1990)

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Astérix aux Jeux olympiques (Frédéric Forestier & Thomas Langmann, 2008), um dos seus últimos papéis

 

Alain Delon (1935 - 2024)

À 7ª edição, o Close-Up decide reunir a "Família". Arranca o Observatório de Cinema de Famalicão.

Hugo Gomes, 14.10.22

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Mamma Roma (Pier Paolo Pasolini, 1962)

Para muitos Cinema é somente ver “pictures on a screen”, parafraseando Hollywood, esse oásis do espectáculo, mas existem outros que deparam com estas imagens em grande ecrã em afetividades, emoções envolvidas e devolvidas para mais tarde serem partilhadas por quem compaixão nutre para com tais sensações e impressões. Chama-se cinefilia, o que não é menos que uma “Família”, improvisada, mas sustentada por essa paixão pela Sétima Arte. Família é também o novo estado do Close-Up, o Observatório de Cinema em Vila Nova de Famalicão (a decorrer na Casa de Artes a partir do dia 15 de outubro até 22 de outubro), a 7ª edição, ou como bem gostam de se apresentar, o 7º episódio desta iniciativa que tem magnetizando cinéfilos e cinefilias para a cidade.  

Como já é tradição, o primeiro dia será marcado pela espetacularidade envolvido em memórias de “fantasmas do Natal Passado”, neste novo episódio a tarefa cabe ao grupo musical Glockenwise (Nuno Rodrigues, Rafael Ferreira e Rui Fiúsa) para acompanhar “Melodie der Welt” (Walter Ruttmann, 1929), com isto esperando trazer até ao seu público toda a melodia que o Mundo contém. O Close-Up também nos convidará a regressar ao Gabinete do doutor Caligari (“Das Cabinet des Dr. Caligari”, Robert Wiene, 1920) através de um filme-concerto assinado por Haarvöl, e a fechar a edição com “Memorabilia”, de Jorge Quintela, desta feita com acompanhamento dos Miramar.  

A programação “passeará” por universos familiares da nossa cinefilia, de Paulo Rocha a Emir Kusturica, este primeiro representado pelo documentário de Samuel Barbosa [“A Távola de Rocha”] e o segundo pelo tão célebre “Black Cat, White Cat”, ou por Antonioni a Pasolini, bem representados com cópias restauradas na seção “Histórias de Cinema”, porém o grande destaque deste ano é o ciclo dedicada à documentarista Catarina Mourão, presente para conduzir uma masterclass, é uma oportunidade de conhecer e reconhecer a sua obra, uma reunião das suas primárias pegadas (“A Dama de Chandor”, 1998) ao seu mais recente trabalho (“Ana e Maurizio”, 2020).

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Vizinhos (Pedro Neves, 2022)

Sem esquecer da apresentação de dois livros sobre a nossa relação com o Cinema, seja pela sua História (“História do Cinema: Dos Primórdios ao Cinema Contemporâneo”, organizado pelo professor Nélson Araújo), seja pela sua pedagogia ("Hipótese de Cinema: Pequeno Tratado Sobre a Transmissão do Cinema dentro e fora da Escola” de Alain Bergala), e da estreia de “Vizinhos”, a nova curta-metragem de Pedro Neves (“Tarrafal”, “A Raposa da Deserta”), produzido pelo Teatro da Didascália e pela Red Desert, sobre a comunidade vivida no Edifício das Lameiras, a ser exibido na mesma sessão de “Black Cat, White Cat” de Emir Kusturica.

E é difícil o Close-Up falar sobre família e não demonstrar a sua. Como é habitual no Observatório de Cinema, todas as sessões são comentadas por diversos convidados, desde jornalistas a críticos, artistas e intelectuais, todos unidos para uma só tradição - celebrar o Cinema enquanto Família que somos.

Toda a programação poderá ser consultada aqui.

A protagonista que fugiu

Hugo Gomes, 02.02.22

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Difícil é mesmo desassociá-la do cinema de Antonioni, mas quanto a Monica Vitti, é no rosto da sua ausência que se debateu as possibilidades da ficção no cinema, e de como devemos tratar e retratar personagens sem olhar a meios para os seus adquiridos estatutos. "L'avventura" (1960) foi esse desaparecimento de peso, sem aviso e de distância anunciada - a protagonista que fugiu - a mesma que se transcreveu em “L'eclisse” (1962). Olhei para Vitti como uma forma inatingível, figura em permanente evasão aos seus privilégios de estrela, diva ou símbolo. Prova disso, infelizmente, foi o vazio deixado em 30 anos de afastamento dos ecrãs (por forças maiores), que nos levaram até ao dia de hoje. Dia em que fomos abatidos pela notícia do seu derradeiro retiro. Só que de ausências, o Cinema respira, e depois do luto, resta-nos somente a celebração.  

Obrigado Monica (1931 – 2022)