Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Em nome de Bay e do espírito santo ... yahoo!

Hugo Gomes, 03.06.24

JYhJDCRkW6PSAk9K4zSTp6-1200-80.jpg

Um quarto “Bad Boys” estava longe de integrar listas de sequelas mais desejadas, sendo que o terceiro filme - Bad Boys For Life - foi um dos últimos grandes êxitos [mais de 400 milhões de dólares em todo o mundo] antes do chamado e traumático lockdown de 2020. Portanto, da minha parte, ver Will Smith e Martin Lawrence, ‘velhotes’ a brincar aos buddies cops com testosterona em níveis máximos e em modo hiperativo e estilizado, é um regressar aos tempos de uma pandemia à porta e de uma Hollywood inapta em agir perante um iminente fecho dos cinemas. O aroma é idêntico, mas visto termos aqui a finalização da quadrilogia, e um pós-bofetada de Will Smith (o filme não deixa escapar esse zeitgeist como gag), embarcamos noutra tendência para lá da estante de “sequelas desnecessárias”, que é a deserdação, seja estilista ou formalizada, de franchises estabelecidos.

Resume-se a um sintoma da ultra-capitalização inserida em sagas em determinados atributos, espelhados como “marcas autorais” do seu conjunto, os distinguem dos demais. Esta Hollywood recusa a deixar franchises morrer e ao invés de declarar o seu óbito persiste em transferir o seu assinante, muitas vezes mimetização estéticas e narrativas dos anteriores, um “fenómeno” cada vez mais incessante. Vejamos; a Indiana Jones é cortado a sua rédea com Spielberg e sob novo senhorio reproduz o seu desgastado arco narrativo na desculpa de um “canto de cisne” apropriado, Star Wars, por sua vez, foi ‘roubado’ de George Lucas e entregue à disneyficação e normalização de uma franquia vista em tempos como eventos fulgurantes da cultura pop, Wes Craven deixou-nos de vez, e Kevin Williamson é recebido com um “pontapé no traseiro” e mesmo assim “Scream” prossegue na meta da meta linguagem e na escassez das suas ideias, enquanto isso, as notícias correm e pelos vistos teremos outro “Matrix”, mas desta vez sem as irmãs Wachowski.

Desde o seu muito demorado terceiro filme, “Bad Boys” emancipou-se de Michael Bay, só que nunca do seu frenesim barulhento; aliás, o espírito dele guia em todas as direções a acelerada batuta da dupla repetente Adil El Arbi e Bilall Fallah … nunca os abandonou… e até está lá fisicamente e em caricata vénia ao “legado” (basta procurar). Portanto, e noutro registo, é uma receita caseira oriunda da nossa querida avó que é executada por outras mãos: os ingredientes são os mesmos, o resultado é que não. E pior, soa-nos ultrapassado, regurgitado e rebelado contra o seu criador.

Enquanto os filmes de 1995 e 2003 correspondiam ao seu tempo e à progressão de Bay na sua devida “praia” (um mais contido, o outro dotado de hiperbólicos exageros), este “Bad Boys: Ride or Die” é deslocado e, em certa maneira, envelhecido, teimosamente envelhecido, negando essa mesma decrepitude na crença de uma jovial e fresca essência. Pode-se dizer que calhou um melhor argumento em relação ao anterior, e uma ação mais estilizada quanto ao seu estilismo de videojogo shoot’em up, mas tudo faz parte da promessa de um final mais digno ao franchise, não vá o box office trair o plano neste constante extração de Bay sem Bay ao volante. 

Robôs alienígenas são o que unem Michael Bay e Orson Welles!

Hugo Gomes, 06.06.23

014387_1393x784_638118466003083878.jpg

A caminho do visionamento de imprensa do novo “Transformers”, deparo-me com a onda de críticas “yankees” a preencher o meu feed virtual devido ao levantamento do embargo, entre elas, uma da Variety que ostentava o título - “A Less Bombastic, More Relatable Sequel” (“Menos bombástico e mais relacionável sequela”, isto em tradução literal). Dou por mim a pensar, possivelmente consolado de que não será um Michael Bay show que verei nas próximas horas. 

Já isso tinha sido firmado com o antecessor reboot Bumblebee”, a essência de ser mais Spielberg do que o realizador assinante dos cinco anteriores filmes. Porém, como havia referido nessa estreia, e novamente sentindo, o paradoxo de Bay, com ou sem. Ora se sem Bay relaxamos as vistas, despedimos da montagem freneticamente hiperativa (e ocasionalmente indecifrável), do humor brejeiro e crises hormonais de adolescente tardio que minam o seu dito universo, para além do lenço branco a tiques e toques do mesmo, por outro, somos "bombardeados" com o mais genérico e o puramente despersonalizado espéctaculo à moda de Hollywood. Com que ficamos então? Pela mera parvoíce estética, ou a homogeneização de um “produto produzido em massa para massas”? 

Este “Transformers: Rise of the Beasts” é o filme, baseado na popular linha de brinquedos da Hasbro, que tende em desviar das minas e armadilhas deixadas pelo legado do anterior contramestre. Exibe um desenvolvimento (nem que seja sugestões de) nas suas personagens humanas e apresenta um vilão intimidante para acelerar o clímax (deixemos os antagónicos «sacos de pancada» fáceis), só que tais encargos são meras rotinas, oleadas operações que insuflam um sensação de dever cumprido perante ao que se pensa ser exigência dos espectadores. Vacuidades tecnológicas, desconsiderações narrativas, ação salta-pocinhas (Machu Picchu torna-se desta vez o cenário de armagedão improvisado) e o CGI que após uns primeiros passos cautelosos assume imperatividade no último ato. Por um momento ou outro, fica-se o desejo de retornar aos antepassados (ao “bayhem” propriamente dito), mas tal regressão é automaticamente deixada pela sobriedade da produção, para não delirarmos mais uma vez. 

Ponto curioso, o grande vilão deste episódio - “Unicron” - surgiu pela primeira vez em 1986 na longa-metragem animada dirigida por Nelson Shin, vocalizado pelo, nada mais nada menos que Orson Welles, na altura desesperado e endividado. Conta o criador e argumentista Ron Friedman que a colaboração com o homem por detrás de “Citizen Kane” foi caótica. Welles encontrava-se rendido aos vícios da sua “má vida”. Um momento de trivialidades para uma crónica de um filme que é mais que trivial.

"Queriam o quê? Telenovela mexicana!"

Hugo Gomes, 15.01.20

df-02373_r-2000-1e00ba9f45d24bbdb990bd069b5e43a1.j

A certa altura de "Bad Boys For Life", depois de todos os encontrões e reviravoltas, Martin Lawrence expressa como só ele sabe e estamos tão habituados “que telenovela mais marada!”. E Paola Nuñez, que aqui se apresenta num papel relevante em constante malabarismo de interesse amoroso com arquétipo de mulher forte (segundo a definição da indústria), realmente veio desse mundo de “soap operas” mexicanas. O que se pretendemos dizer é que ele tem razão: tudo aqui é material de uma telenovela “over the top”, um caça-emoções através de truques baratos, escudado numa etiqueta “cheesy” dignamente e assumidamente anos 90s.

E não é por menos. “Bad Boys” foram criados em 1995 numa parceria do produtor Jerry Bruckheimer com o então contido Michael Bay, subjugada a uma formulaica premissa "buddie cops" com Will Smith, nos seus anos mais “quentes”, e Martin Lawrence, a um passo de se tornar numa recorrente anedota de Hollywood. O resultado foi um sucesso, não só pela dupla polarizada que funcionou com o público, como também do ritmo oleado e das sequências de ação, que oscilavam entre a ferocidade e o ridículo.

Em 2003 surgiu a sequela, com promessas de mais e “melhor” em todos os quadrantes. Acertaram em alguns pontos: mais longo, mais disparatado (era Michael Bay a entrar aqui na sua delirante fase “autoral”) e, acima disso, mais polarizado em relação às personalidades (Will Smith mais durão com a lente centrada nas suas “complexidades” e Martin Lawrence mais “apalhaçado”). Mas apesar deste mais, o resultado ficou-se pelo mais do mesmo. Ao todo, a dialogia arrecadou mais de 400 milhões de dólares a nível mundial e, como se diz em Hollywood, o que rende tem de render mais... mesmo que se tenha esperado 17 anos.

Bad Boys For Life” instala-se entre nós por uma via, a da nostalgia a saldos, vendida a peso de ouro, e faz isso embatendo estas personagens com o peso do tempo. Martin Lawrence (44 anos) dá uma de Danny Glover em "Lethal Weapon" e constantemente relembra-nos o desejo de reforma, enquanto Will Smith (50 anos), em melhor forma física, é confrontado com a iminente “velhice” e a “necessidade” de se retirar para um conforto familiar ou monogâmico (conforme a opção). São dois "velhotes" que desejam relembrar os tempos áureos e para isso rendem-se, de mãos para cima e com as armas despachadas, à mera fórmula.

Embora o filme seja exatamente aquilo que se pretendia, com a intenção de ir bocado mais nas virtudes dramáticas destas personagens (e aí entramos na referida comparação da telenovela), há um pormenor interessante que poderá colocar este terceiro tomo na preferência dos fãs da saga: a inexistência de Michael Bay. Quer dizer … exatamente por detrás das câmaras (nem sequer escalado na produção). Apesar dos tiques e das intermitentes vénias estéticas ao “criador” estarem lá para não anonimizar esta franquia, o afastamento torna o filme mais terra-a-terra e mais preciso na sua montagem (depois de termos experienciado um Bay sem rédeas em “6 Underground”, era de temer o pior).

No geral, é cinema-pipoca visto e revisto como muitos, datado (cartéis mexicano, lá vamos nós outra vez), pingarelho e sem novas ferramentas para adicionar ao género. Nesse aspeto, o fracassado “Project Gemini”, de Ang Lee (também protagonizado por Will Smith) foi mais progressista e virtuoso. Enfim, se o que o público quer é telenovelas, eis uma que é quase mexicana.

E agora ... um gesto autoral de Michael Bay!

Hugo Gomes, 13.12.19

79588192_10215398664936706_4134856099230646272_o.jUm conselho: contar até 3 e respirar, porque Michael Bay chegou e sem rédeas algumas, para além disso, com um guião desgraçado para nos obrigar a questionar sobre as nossas próprias vidas. Assim temos “6 Underground”, onde experienciamos um exemplo de autor na sua estética que se vê aflito (ou não) em procurar uma maturidade artística. Infelizmente, por entre explosões e os seus acostumados (nem por isso menos cansativos) maneirismos, somos “torturados” por uma espécie de purgatório de anarquia cinematográfica. Ainda a recuperar ...

"Bumblebee": a versão light do devaneio de Michael Bay

Hugo Gomes, 20.12.18

a19b7e932bf3465ce1e7a812c1fe7c00.jpg

Entramos aqui de porta escancarada num pleno paradoxo. Se por um lado, este “Bumblebee” será para muitos dos adeptos da saga (e não adeptos) o “mais filme” dos sete (saliento com isto a comodidade da narrativa de três arcos e dos reconhecidos elementos que formam, por exemplo, os êxitos crowd pleaser), é também o menos personalizado. É que, para o bem ou para o mal, os tiques visuais e a megalomania de Michael Bay atribuíam a este franchise uma “casa à sua marca autoral”. Mesmo com o sufoco narrativo, perversamente esmagado num sexto filme, havia uma liberdade que se sentia nesta jornada cinematográfica dos famosos produtos da Hasbro.

É certo que de Bay existe uma presença tóxica que por si só afastou “The Last Knight” do habitual target de audiências (605 milhões não é nada em comparação com a entrada na casa dos mil milhões de dólares dos capítulos anteriores). Com “Bumblebee”, focando sobretudo na origem do carocha que sempre se pontuou como um dos favoritos dos fãs, Travis Knight (vindo das animações stop-motion da Laika) prescreve um filme anacrónico da cultura-pop dos anos 80 (moda nostálgicas … check), sob a vencedora pasta de “family-friendly” como os norte-americanos gostam de apelidar. Ou seja, povoando um território mais familiar, mais contido (até mesmo as sequências de ação são mais elegantes e perceptíveis), este spin-off/prequela de “Transformers” é uma fórmula vencedora no que requer a citar os atributos desejados do público mainstream.

Convém salientar que a sobriedade de Knight no storytelling concentra aqui a sua melhor qualidade/ambição, extraindo da loucura à lá Bay estas personagens e insemina-las em fertilidades “spielbergueanas” (Steven Spielberg mantêm o seu cargo como produtor). Porém, como entretenimento, "Bumblebee" abdica da espetacularidade em nome da arte de contar uma história para as massas. Infelizmente, é com isso que se converte em “mais um filme”.

Profundamente despersonalizado e anónimo, Travis Knight (mesmo tendo entregando a preciosidade de “Kubo and the Two Strings”) é um jogador fiel às suas regras e Michael Bay um desalmado que mina os seus filmes de devaneios catastroficamente artísticos (goste-se ou não, há que reconhecer que Bay é um autor destes novos tempos) que pouco quer saber desses mesmos regulamentos da indústria. No final, só um ficará para a posteridade. As nossas apostas estão nos “trambolhos” narrativos de Michael Bay