Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

O Cinema e o Medo [Índice]

Hugo Gomes, 15.11.23

O medo é um fantasma mais “penado” que Rebecca.

Hugo Gomes, 29.10.23

rebbeca.jpeg

Joan Fontaine em "Rebecca" (Alfred Hitchcock, 1940)

Sentir medo será à partida um lugar comum no dia a dia dos humanos, na verdade, senti-lo pode muito bem ser um dos clichês mais evocados na vida, não só naquilo a que chamamos de quotidiano, mas também na “vida do cinema”. A nossa existência está cheia de clichês que a sétima arte adotou, e viceversa, sim, porque, se por vezes eu tenho medo de tomar duche de cortina fechada, não foi porque o aprendi na serenidade da minha rotina, mas porque em algum momento, o cinema me mostrou que cenas em chuveiros, podem ser efetivamente dramáticas, e como já devem ter reparado, estou de forma muito clichê a referir-me ao plano do filme “Psycho”, em que a personagem de Janet Leigh é surpreendida por um assassino durante o banho. 

Os clichês foram roubados de um lado para o outro, e sinto que muitas vezes já não sei distinguir o que é que vem da realidade, ou o que é apenas ênfase da ficção. Por exemplo, nunca caminharam à noite e pensaram que a qualquer momento ia aparecer o Michael Myers? Já estiveram sozinhos num sótão e sentiram que a probabilidade do Ghostface surgir era altíssima? Ou ainda, numa sala de uma avó junto a um relógio daqueles que fazem muito barulho, nunca se perguntaram o que é que o Padre do “Exorcista”, diria naquela circunstância? O medo está em todo o lado, e acho que muitas vezes, ampliado por aquilo que o cinema nos deu. 

Por falar em atrizes nos filmes de Alfred Hitchcock, há vários depoimentos de personalidades da indústria, que partilharam várias situações sobre a falta de sensibilidade do realizador, em dirigir as atrizes que com ele trabalhavam. Muitos são os testemunhos, que apontam para o facto das mesmas terem sido terrivelmente manipuladas no set, para constantemente estarem em tensão, com o objetivo de tornar o medo, real nos seus rostos, tão real que a câmara o captaria implacavelmente. 

Medo, o realizador queria provocar medo nas intérpretes, queria juntar aos seus olhares intensos e doces, um ingrediente que nos provocasse a nós espectadores, pavor. A doçura do medo no olhar, tão perversamente perpetuada por Hitchcock, ficou consequentemente iconizada no cinema do século XX.

Embora mais conhecida pela sua leveza em comédias e romances, também Doris Day experienciou o medo nos filmes do senhor Alfred, em “The Man who Knew too Much”, com a sua complexa e delicada personagem Josephine Mckenna, provou os dissabores da intensidade de um homem, que queria realizar mais do que a ficção dos próprios filmes. 

A esplêndida Grace Kelly, também ela ao longo de três longas-metragens, mergulhou nas tensões de um realizador obcecado pela sua imagem, bom depois decidiu que afinal queria mesmo era ser princesa, o que também não deixa de ser um bocadinho assustador. Viram? Mais um momento em que não percebemos muito bem quem é que está a imitar quem, se a vida, se a ficção ou se todas ao mesmo tempo, de qualquer das formas, deixar de ser atriz para ser princesa do Mónaco, deve dar um medo dos diabos. 

Joan Fontaine em “Rebecca”, que a psicologia adotou para explicar mais um complexo, aqui relacionado com os medos do passado, medo dos fantasmas do passado, neste caso bem literal, já que o próprio do fantasma em questão, aqui é mesmo o espírito de uma ex-mulher que deambula pela casa, tentando terminar com a paz do casal. 

Se nunca tiveram que aturar uma assombração dessas, onde pessoas obcecadas pelos vossos companheiros vos tentam incendiar a vida (para quem viu o filme, perceberão a escolha do verbo incendiar), que bom para vocês, aqui Fontaine teve não só que aturar histórias do passado, como também um Hitchcock “passado”. 

O medo está em todo o lado, desenganem-se aqueles que pensam que o medo está só nos thrillers, filmes de terror e suspense, o medo vive até nas comédias mais românticas, ou acham que em “Love actually”,  a personagem de Colin Firth não sentiu medo de falhar, enquanto caminhava por um típico bairro Lisboeta, para declarar o seu amor? 

O medo vive entranhado nas nossas vidas e arrisco a dizer que até o mais feroz dos vilões, ainda que na ficção, o sentirá em grande escala, ou acham que os pesadelos do próprio Freddy Krueger, são mais leves que os das crianças que sonhavam com ele? Dada a circunstância da personagem, não me parece. Freddie Krueger tem medo, medo de si mesmo, medo de não trazer medo suficiente para a sua vingança, ele tem medo da sua própria história.

E o medo de não sentir medo? Bom, sobre esse atrevo-me sempre com muito cuidado, porque o medo é também ele uma medida exímia que nos livra muitas vezes de tantos males. Por hoje fico-me  pelo medo debruçado no cinema, porque quando a tela se apaga e as luzes se acendem, posso voltar tranquila para o meu quotidiano sereno e feliz, mas onde tantas vezes insisto para que seja efusivo, dramático e belo como aquele que aprendi a ver nos filmes. 



*Texto da autoria de Mia Tomé, atriz, voice artist e criadora, foi bolseira da Fundação Calouste Gulbenkian para estudar no The Lee Strasberg Theatre and Film Institute, em Nova Iorque. É licenciada em Teatro pela ESTC, e Mestre em Educação Artística pela FBAUL, onde investigou o tema “Cinema e Educação”. Foi autora e apresentadora do programa “Querem Drama?” no Canal Q, mas também do “Por uma Canção” na Antena 3. Atualmente tem em mãos Projeto Natália, que celebra o centenário de Natália Correia. Desde 2021 que está a desenvolver um projeto no Arizona, sobre as mulheres do Oeste Norte Americano.

Curtas, curtinhas, a origem: 1ª edição dos Prémios Curtas

Hugo Gomes, 13.03.23

DSC00827.jpg

Os premiados e os jurados / Fotografia.: Ricardo Fangueiro

Foi através de uma curta que Portugal desbravou caminho em direção à Kodak Theater, a nomeação à tão cobiçada estatueta norte-americana automaticamente entrou para a História audiovisual do nosso país, e então porquê de estarmos constantemente a reduzi-los a "protótipos" de futuras longas-metragens?

André Marques teve um sonho, criar uma cerimónia de festividades, premiações e de comunhão a esse universo bem português, a resistência do Cinema na sua mais natural essência, a simples e de rápida dicção, a curta. Para isso juntou oito magníficos* e fundou um júri, aliciou e arrecadou apoios, e “convidou” a todos os participantes a inscrever o seu trabalho. A sua vontade fez com que o seu desejo se materializasse. No passado dia 10 de março, sexta-feira nervosa devido à nomeação de “Ice Merchants”, cujos Óscares seriam revelados no domingo seguinte (“será desta?” pensavam todos os que presentes), o Auditório Fernando Pessa em Lisboa encheu-se (deve-se sublinhar), para receber a primeira edição, modesta, ainda com o seu quê de improviso, muitas vezes ocultado graças ao malabarismo e carisma de Rui Alves de Sousa, radialista da Antena 1, que assumia o papel de anfitrião. Intercalado pela dita premiação e pela projeção de três curtas referentes aos três géneros-base (ficção, documentário e animação), a cerimónia ficou marcada pelas promessas do seu fundador, ambicionando seguintes edições em maior escala e a ambição de um “microfestival” em celebração daquilo que a curta-metragem tão bem representa - o Cinema, aqui e agora.   

Quanto à premiação, a noite consagrou “Azul” de Ágata de Pinho com cinco prémios, no qual incluem as categorias de Curta de Ficção, Realização, Argumento, Atriz (também Pinho) e Fotografia (assinado por Leonor Teles). “O Homem do Lixo” de Laura Gonçalves arrecada três distinções (Curta de Animação, Curta Documental, Banda-Sonora), igualando com “Punkada” de Gonçalo Barata Ferreira (Montagem, Caracterização, Guarda-Roupa). Os outros prémios; Vítor Norte recebe o de Melhor Ator (“O Caso Coutinho” de Luís Alves), Nuno Nolasco como Ator Secundário (“Tornar-se um Homem na Idade Média” de Pedro Neves Marques), Rita Tristão na categoria de Atriz Secundária (“As Feras” de Paulo André Ferreira), Rodrigo Manaia em Interpretação Infantil (“By Flavio” de Pedro Cabeleira), e ainda a animação “Garrano” de David Doutel e Vasco Sá no campo dos Som / Efeitos Sonoros juntamente com a ‘dobradinha’ de “2020: Odisseia no 3.º Esquerdo” de Ricardo Leite (Direção Artística, Efeitos Visuais).

DSC00340.jpg

Rui Alves Sousa e eu / Foto.: Ricardo Fangueiro

DSC00752.jpg

Vítor Norte brama ao Cinema após vencer o Prémio de Ator / Foto.: Ricardo Fangueiro

DSC00693.jpg

André Marques, fundador do evento, discursa / Foto.: Ricardo Fangueiro

*Bruno Gascon (realizador de “Carga” e “Sombra”), Mia Tomé (atriz e radialista), Edgar Morais (ator), Inês Moreira Santos (crítica e blogger do Hoje Vi(Vi) um Filme), Teresa Vieira (curadora, crítica e radialista da Antena 3), Rafael Félix (crítico e fundador do Fio Condutor) e André Pereira (videografo e editor de vídeo da Renascença).

Prémios Curtas - 1ª Edição

Hugo Gomes, 07.03.23

Formato-A3-com-novos-logos-scaled.jpg

Na próxima sexta-feira (10 de março) irá decorrer a 1ª Cerimónia de entrega dos Prémios Curtas, Auditório Fernando Pessa (Lisboa), apresentado por Rui Alves de Sousa (jornalista e radialista da Antena 1) e com exibição de três curtas-metragens (“Glória de Fazer Cinema em Portugal” de Manuel Mozos, “Arena” de João Salaviza e a animação “Nestor” de João Gonzalez [o mesmo de “Ice Merchants”, nomeado ao Óscar]). Integrei o júri em conjunto com Bruno Gascon (realizador de “Carga” e “Sombra”), Mia Tomé (atriz e radialista), Edgar Morais (ator), Inês Moreira Santos (crítica e blogger), Teresa Vieira (curadora, crítica e radialista da Antena 3), Rafael Félix (crítico) e André Pereira (videografo e editor de vídeo). 

310406751_134249426016908_989044000923197852_n.jpg

Os nomeados poderão ser conferidos aqui.

334087322_775379693525755_3954648030986053004_n.jp