Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Star Wars é o que eles mais querem ...

Hugo Gomes, 17.02.23

antman-1.jpg

Em tempos “reclamava-se” do facto dos filmes da Marvel serem formulaicos, agora são desorientados, sem rumo algum, é como se jogassem à “cabra-cega” sem a crucial parte de encontrar alguém. 

Mas se fosse só isso, atiraríamos este “Ant-Man and the Wasp: Quantumania” para o balde de que muitos destes ‘blockbusters’ são feitos e passariamos à frente. O que se evidencia é que uma saga com esta longevidade precisa urgentemente de se reinventar, e como tal é a fadiga a tomar rédeas e conduzi-lo à catástrofe. Não refiro somente aos elementos narrativos ou das “surpresas encaixotadas” para atrair “adeptos e amantes” (e o stock já está a esgotar!), e sim, dos meios de produção (com orçamentos milionários e mesmo assim, nada impressiona, nem se beneficia enquanto espectáculo de sala), os efeitos especiais (contaminação de CGI, uma artificialidade que já não engana ninguém, nem mesmo uma criança de 5 anos), e os próprios atores servidos de “carne para canhão" (sublinha-se o esforço de Jonathan Majors, mas em vão). 

Nesse último ponto, estranhamente, é esta franquia que ainda remexe um falso-senso de “star system” lá para os lados de Hollywood, um carreirismo em busca da fama rápida e efêmera que prejudica mais o futuro destas estrelas do que propriamente a sua salvaguarda. Basta perceber que após algumas “portas abertas” - o dispositivo do multiverso - só as personagens entranhadas dos comics vingam acima de quem as interpretam. Os atores deixaram de interessar para a equação. 

Quanto a este terceiro “Ant-Man”, para além do obviamente mencionado, resume-se à refeita da velha tese de que “Hollywood só interessa produzir o mesmo filme e esse é o ‘The Birth of the Nation”, porém, mudam-se os tempos, mudam-as vontades (até porque falar do filme do Griffith é preciso algum cuidado extra hoje em dia), é “Star Wars” que eles mais desejam reproduzir. Hollywood está há anos a replicar George Lucas!

Dance with my self

Hugo Gomes, 04.02.23

A liberdade de um filme é medido pelo tempo que é dado às personagens para poderem dançar sozinhas. Ou parafraseando uma das obras menores de Ken Loach ["Jimmy's Hall"] - “We need to take control of our lives again. Work for need, not for greed. And not just to survive like a dog, but to live. And to celebrate. And to dance, to sing, as free human beings.”.

247166985167.jpg

Spider-Man 3 (Sam Raimi, 2007)

margot-robbie-1-1600x900.webp

Babylon (Damien Chazelle, 2022)

maxresdefault.jpg

La vie d'Adèle / Blue is the Warmest Color (Abdellatif Kechiche, 2013)

saturdaynightfever-1000x600.webp

Saturday Night Fever (John Badham, 1977)

still2_wide-f4478ad9af45dd687aeb8a5258f7ec0a0fd842

Frances Ha (Noah Baumbach, 2012)

tumblr_nxtf72ZQAc1r6lrdfo1_1280.png

Pulp Fiction (Quentin Tarantino, 1994)

Ya no estoy aquí (Fernando Frias, 2019)

f6ec20cd1c21755a1d8f90a420528e7a.jpg

Bergman Island (Mia Hanse-Love, 2021)

grigris.webp

Grigris (Mahamat-Saleh Haroun, 2013)

image-w1280.webp

L'événement / The Happening (Audrey Diwan, 2021)

kickboxer-dance-51.gif

Kickboxer ( Mark DiSalle & David Worth, 1989)

jimmys-hall-2.jpg

Jimmy's Hall (Ken Loach, 2014)

hUr3EpW7AEiDg6B7HMGIGc4iOKUapA_original.jpg

Cold War (Pawel Pawlikowski, 2018)

"Black Panther" morreu, Longa Vida à dinastia Marvel!

Hugo Gomes, 10.11.22

black-panther-wakanda-forever-teaser-trailer-2.web

Sem Chadwick Boseman, óbvio, por razões trágicas, a esperada sequela de “Black Panther” reveste-se de um branco fúnebre (o luto origina um renascimento), tentando com isto receber-nos com uma cerimónia de pesar, um evento em torno da memória de um, infelizmente, ator “tardio” [com carreira iniciada em 2003] sem tempo para demonstrar estar mais para além do universo Marvel (e em “pequenos” passos conquistaria esse lugar). Foi redesenhado da mesma forma que o sétimo “Fast & Furious” fora após a sua própria tragédia [Paul Walker], e como tal, a morte é aqui servida de um espectáculo algo “pop”, digamos até facilmente universalizado. Contrariamente, o tributo é desvanecido no preciso momento em que a morte de um “ser fictício" instala-se com mais impacto emocional e até peso na narrativa que a pontuada ausência do genuíno Pantera Negra

Neste segundo filme é notável a sua faceta atabalhoada, caótica, derivada às inversões de marcha da repentina partida que o destino os obrigou a tomar, alterando todo o rumo que esta saga dentro de uma saga planeava seguir. Embora o seu lado trapalhão seja suscitado por um excesso de confiança quanto ao seu próprio universo e inconscientemente desligando-se dele. Tal leva, por exemplo, a que o "afrofuturismo", elemento vencedor do filme de 2018, seja rascunhado e limitado a meras piscadelas de continuidade, para que “Wakanda Forever” se esforce no enfoque a geopolíticas com aproximações ao nosso “mundo real” (outro “Civil War”?). Um mau fígado para este tipo de cinema que deseja abordar o seu exterior através do seu interior e fantasiado núcleo, não contribuindo com nenhuma reflexão para além do simplismo infantilóide enquanto “soluções” a forças globais - um exemplar de proto-fascismo - contudo, não discutiremos tais conceitos aqui, porque é cinema de super-heróis, e como cinema de super-heróis tais vertentes encontram-se à baila da rotina. Aliás, a rotina tornou-se lugar-comum aqui.

a1d7c8a9-5d8c-472e-8409-bb4faf4b2b7c-black-panther

O anterior “herói independente”, Ryan Coogler (“Fruitvale Station”), regressa à direção da franquia, aqui desacostumados aos seus habituais e vistosos travellings, e rendido à decoupagem industrializada. A sua “mão” encontra-se mais homogênea, vencida pela força da sua megalómana produção. Apesar disso, persiste num episódio espirituoso (comparativamente com 90% do universo partilhado que se insere, este “leopardo heroico" destaca-se pelo seu modelizando exotismo, ora estético, ora sonoro), mas sob as constantes cãibras quanto à sua “longa” narrativa. 

A sublinhar ainda o seguinte: a normalização da ação refém ao CGI, batalhas “campais” dependentes dos fins tecnológicos e sem grau algum de consequência. Efeito videojogo ou não? Ou simplesmente a empatia substituída pela artificialidade que transforma personagens em meros peões de efeito? Conforme seja a resposta, o que importa é que há guerra, sem nos conectarmos devidamente aos seus desígnios. Por isso, passamos (mais) um episódio à frente … muda-se o “rei”, mantém-se o reino. 

A Cura ... ou como devemos amar "Morbius" nestas horas drásticas

Hugo Gomes, 12.06.22

01144558591276.jpg

Desejamos alternativas aos formatos impostos pela Disney no território do cinema-pipoca, mas o que deveríamos ter aprendido é que nem sempre o segundo prato corresponde à iguaria fantasiada.

“Morbius”, a anedota viral das últimas semanas, é um filme composto por odores de outros tempos (sem com isto lhe atribuir contornos saudosistas). Já no universo de super-heróis, subgénero que adquiriu uma seriedade dominante nos dias de hoje, sentimo-nos novamente à luz das produções corriqueiras (como aquelas da Marvel segunda liga a despachar fita como sucessos efémeros), revelando-se numa incompetência aos mais diferentes níveis, entre os quais a lição nunca aprendida dos malefícios do excesso de CGI e a qualidade retalhista dele. A esse ponto estético, estamos conversados, demasiado artificial para o seu próprio bem, cujos visuais sem afinco nos remetem aos jargões de “tal e qual como um videojogo”.

Porém, Daniel Espinosa (“Safe House”, “Child Nº44”) não só assinou um objeto obsoleto nesse ramo, como também “orgulha-se” de ser autor de um anonimato requentado. De enredo fácil e sem espessura, personagens de cartão (até Jared Leto e os seus "métodos" performativos aperceberam da 'treta' aqui em causa) e a incoerência narrativa ao rumo.

Não é, definitivamente, o filme a qual devemos pôr o nosso dente. Agora, cura para as insónias, isso é, um filme-salvador.

Doutor Estranho Amor e a Loucura controlada

Hugo Gomes, 03.05.22

doctor-strange-in-the-multiverse-of-madness-movie-

O regresso de Sam Raimi ao terreno do cinema de super-heróis (“Darkman”, a trilogia de “Spider-Man”) é o pretexto, mais que suficiente, para respondermos com expectativa a mais um capítulo de um universo montado e pensado ao milímetro. Contudo, mesmo com os seus elementos presentes ao virar-da-esquina (a conotação mais negra e a rédea mais estendida às estâncias do terror e da série B), é a sua convivência com um guião preguiçoso e uma produção megalómana e glutona (tal como “Spider-Man 3” é de notar dois e diferentes filmes em conflito na sua cerne) que não fundamentam milagre algum.

Doctor Strange in the Multiverse of Madness” é aquilo que os fãs desta saga (palavra caída em desuso após a dominância do termo “universo partilhado”) pretendem, nada a desapontar por estas bandas (ou dimensões) para esse público-alvo, excepto a falta de carinho pelas personagens, nomeadamente aquelas retornadas em forma de cameo (mal habituados à nostalgia honrosa e por vezes ternurenta de “Spider-Man: No Way Home”) e pela cedência fácil aos mandamentos mais que entranhados de uma “casa” como a Disney. Aliás, por mais que tentássemos encontrar espessura neste festim de CGI, o que deparamos é inconsequência como um tramado reino moral.

Confesso-vos, esperava sentir uma vibe aqui, e senti até aos últimos cartuchos uma esperança de reconquistá-la … pois, em vão. No fim de contas, Elizabeth Olsen torna-se definitivamente o melhor e igualmente o pior desta “Loucura” de nome, porque é nela que se reflete mais Raimi e ao mesmo tempo o síndrome da utopia disnesca.

Finalmente temos Aranha!

Hugo Gomes, 20.12.21

6b5ac9113e.jpg

Pegando na tocha acendida por Bryan Singer e a sua trupe de mutantes (“X-Men”, 2000), Sam Raimi conseguiu em dois filmes aquilo que se tornaram nos alicerces de muito do chamado cinema de super-heróis que viria a desaguar este Universo Cinematográfico da Marvel. Começou com a prova dos nove quanto ao êxito de Spider-Man (2002) e sequencialmente, dois anos depois, a bases existencialistas e dramáticas de uma musculada e convicta sequela. Por outras palavras, a duologia de Raimi sobre o aranhiço (encenado por Tobey Maguire) constituiu numa radical mudança quanto à nossa visão dos super-heróis em grande tela (colocando-os nas possibilidades dramaturgias e evidentemente de costura com outros géneros inteiramente cinematográficos). 

Renegar atualmente o cinema dominante dos heróis é renegar uma parte da contemporaneidade quer industrial, quer formal, de um tipo de produção norte-americana ou de importação cultural expandida pelo resto do globo. E tal sucedeu com esta famosa criação de Stan Lee, e apoiada por um realizador anteriormente arriscado nesse tal género embrião com isolados casos de êxito (falo de “Darkman”, a sua criação, em oposição dos felizes exercícios de Batman de Tim Burton e Superman de Richard Donner, duas figuras que transcendem a mera intenção de comics, prestando-se como parte cultural de uma América do século XX), o restante surgiu como apreço à temática do “render do peixe”. O terceiro tomo (em 2007) foi sabotado por um estúdio em consolidação com as “wishlists” dos fãs, debilitando todo um arco de vingança e redenção que Raimi havia estruturado neste fim de trilogia, deitando por terra qualquer descendência. 

A Sony Pictures como resposta elaborou um novo “homem-aranha”, desta vez com Andrew Garfield e com inspiração no tal universo cinematográfico de Kevin Feige a ser elaborado “ali ao lado”. O dito reboot só viveu duas vezes, fãs e crítica viraram “costas”, deixando o estúdio e os direitos do tão valioso personagem na ameaça da Disney / Marvel Studios, cuja solução é encontrada num acordo entre cavalheiros, e assim, como bem sabemos, Tom Holland veste o fato e balança de forma vigorante na teia do aracnídeo humano. Quer dizer, vigorante ao serviço de um dialeto imperativo de uma forçada continuidade, desprezando as anteriores encarnações de Maguire e Garfield (unidos pela tragédia e pelo dilema entre o seu alter-ego e a vida pessoal que desmoronava), numa figura acriançada, colorida bem ao jeito do toque de Midas da Disney. A este foi-lhe entregue uma panóplia de gadgets, um subenredo de legado para com um outro herói estabelecido, e tramas sob tramas colegiais. É o homem-aranha na ótica do seu público-alvo, ou diria antes, do público atual. 

Spider-Man-No-Way-Home.jpg

Havia nele uma ausência de nuances trágicas, humanas aliás, que pudessem resgatar a personagem de Tom Holland da mera caricatura de “rookie”. A consolidação chega-nos na forma de um evento multiversal e à sua maneira, uma vénia ao legado do heroísmo moderno que o cinema abraçou como seu predileto “cinema-pipoca”. A tragédia adquire forma, conduzindo a este homem-aranha no endereço do coming-of-age, do crescimento necessário, contrariando fórmulas disnescas onde a morte e a perda (pode não soar, mas são elementos, ou ausências, bem diferentes) tem finalmente lugar e o luto converte-se em matéria de existencial emancipação. 

O que se pode verificar por detrás da pirotecnia previsível deste “No Way Home” é a ruptura da Sony para com as matrizes do seu estúdio “irmão-inimigo”, Holland é por fim uma personagem à medida desse estúdio, crescida, despida do militarismo anteriormente associado, uma figura propícia às suas próprias aventuras, como vemos no último e esmorecido ato, e o ator dotado em seguir a tal requisitada espessura nessa subjacente carreira. 

Agora, se “No Way Home” é a tremenda obra-prima do subgénero ou a melhor encarnação da homónima personagem no cinema? Obviamente que não. Todavia é a peça que precisávamos para que o Homem-Aranha de Holland encontrasse finalmente o seu humanizado lado.

A crítica de cinema e os spoilers

Hugo Gomes, 14.12.21

qZUbVSeuqG4GiiYnhEUCMP.jpg

No sentido em que a crítica de cinema é tomada como cúmplice do marketing do filme (muitos creem nisso com tamanha fé num modelo de subserviência capitalista), o grande desafio, em termos diplomáticos, é o de continuar a expressar ideias sobre cinema em contextos onde a “ditadura dos «no spoilers» ” impera com as suas devidas condenações. Por isso, como escrever sobre “Spider-Man: No Way Home” sem cair nas minas e armadilhas montadas pela dominância desses códigos de cultura popular? As opções são … ou somos uns “bastardos danados” pronto para sacanear a surpresa de outros em nome da antecipação, ou somos seres criativos e subtis para não assumirmos como serventes da publicidade em marcha.

Nada é eterno aqui ...

Hugo Gomes, 02.11.21

d6e84499a8798c72193a.jpg

Declarações de amor eterno (ou diríamos antes intemporais) às portas do armagedão tornam "Eternals" uma porção do nosso próprio veneno. Se por um lado pedíamos à Marvel/Disney uma reformulação da sua formula, eis que nos entrega um pastelão malickiano que não deixa assim de percorrer os mais variados lugares-comuns e ainda pretende ser uma reflexão à nossa mortalidade. Falhada produções de milhões com Chloé Zhao convidada por engano.

Everybody was Kung Fu fighting

Hugo Gomes, 26.08.21

15301632-simu-liu-shang-chi-main-pic-data.jpg

Wuxia tecnológico com o seu quê de inclusão. Nesse sentido, o Universo Partilhado da Marvel fintou maior criatividade em Wakanda e o seu afro-futurismo (até o enredo era mais carpinteiro), aqui é a americanização das artes marciais e do folclore chinês que Hollywood sempre fixou ao longo destes anos, não há deslumbramento, aliás, os chineses têm feito … e fazem … filmes como estes (basta ver o recente êxito de “A Writer’s Odyssey”, de Yang Lu) com maior imaginação. Salva-se Tony Leung pelo espírito trazido nas suas associações cinematográficas, porque de resto “Shang-Chi and the Legend of the Ten Rings“ é cedido ao vazio, como aquelas frases moralistas e feitas dignas dos “bolinhos da sorte”.

Uma Víuva (nada) Alegre!

Hugo Gomes, 30.06.21

fbd0920_comp_9a27fe41.0.jpeg

Num momento em que os fãs estão enviuvados da personagem Natasha Romanoff (Scarlett Johansson), que tal mal tratada foi durante este longo franchise, ‘cai-nos’ uma aventura-a-solo meio caricatural (russos e mais os associados estereótipos pregados em Hollywood) meio negra (aliás o mais sombrio desta indústria disnesca) da tardia emancipação desta “action woman”. “Black Widow” entrega-nos aquilo que nos foi prometido e ainda deposita-nos alguma esperança quanto à linha de montagem criada pela Marvel Studios. Não vos vou mentir, possivelmente é dos melhores capítulos deste universo partilhado, o mais independente quanto à forçada continuidade, o mais solido no seu enredo e acima de tudo, a mais concebida heroína deste mesmo universo. Depois há a versátil Florence Pugh e o seu sarcasmo semi-adolescente e aquilo que considero, automaticamente, das melhores ‘coisas’ que vi nesta marvelesca saga (que já dura 13 anos) … um arrepiante e energético genérico ao som de Smell Like Teen Spirit …. Obrigado Cate Shortland!