Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Caravaggio, sem sê-lo

Hugo Gomes, 20.07.22

1698831.jpg

Uma árvore … um amigo

É no leito da sua morte que a velha monarquia solta o último sopro do seu conservadorismo, “banhado” pelo quadro de José Conrado Rosa, uma representação longínqua, mas continuamente presente do espírito colonialista [o espírito da “apropriação”], a companhia ou talvez barqueiro da sua jornada pós-vida. O fim da monarquia, a realeza propriamente dita nos levará, enquanto espectador, às memórias corruptivas de quem, por via dos seus deveres reais, desejou obter utilidade na sua existência. 

João Pedro Rodrigues, que afasta e afasta, cada vez mais, do seu realismo frustrado e sujo (a estreia ainda hoje badalada de “O Fantasma” o assombra), lançando na procura por “gambuzinos”, o sugerido em “Morrer como um Homem” que se transformou no brasão familiar de todo o seu cinema. A juntar a isso, as declarações do próprio em alturas de “O Ornitólogo” (até à data o meu predileto da sua filmografia, o qual não escondo o fascínio pelo seu encanto febril), em que notava um erotismo bárbaro nas imagens sacra, isto, num filme recheado de reconstituições dessas mesmas gravuras em estatuetas vivas e de saliências lascivas agravadas. Essa readaptação, ou talvez deveremos antes insinuar reinterpretação da arte, qualquer que seja, parece ter encontrado “caminha feita” no cinema de Rodrigues, e "Fogo-Fátuo" (uma evidente curta metragem em vestes de longa), não oculta esse feito, integrado nos propósitos e no contacto do seu protagonista, o nobre Alfredo (Mauro Costa), que após o primeiro dia no quartel de bombeiros onde deseja voluntariar, é confrontado com reconstituições homoeróticas por parte dos seus “camaradas de armas”. 

Caravaggio, Vilhena, Bacon, Velasquez ou Rubens, obras não-identificáveis, mas cujos estilos dos seus criadores são preservados nestas celebrações humanas, os corpos nus relembram essa mesma arte, obviamente negada por Alfredo, que não reconhece tais trabalhos em lado algum. Isto porque essas peças não são mais que remontagens do seu criador máximo - João Pedro Rodrigues - que metamorfoseia este conhecimento artístico como seu. Por exemplo, é fácil apontar para Caravaggio montado nos pénis hirtos e nos troncos suados destes bombeiros erotizados, mas não se trata de Caravaggio nem uma réplica do mesmo, e sim de uma “pintura” aparte que o realizador nos vende como tal. 

As pessoas estão a ver-nos”, numa mesa de jantar no indeterminado palacete, proferido aviso de Margarida Vila-Nova enquanto quebra a quarta parede, o espectador é a partir deste ponto, assumidamente, um espectador (pelo menos adquire a percepção de tal) e esta mesma sequência, mesmo petrificado num certo burguesismo, é a evidência de como a galeria que iremos testemunhar nas cenas seguintes será de um âmbito, não provocatório, mas ostentoso à mão-criadora de Rodrigues. O desejo de ser um pintor, e para tal, remodelando as pinturas cujo senso-comum tornou-as como suas, em qualquer outra coisa. Talvez um ensaio, e o filme, "Fogo-Fátuo", aproveitando a deixa dessa personagem de Vila-Nova, têm a percepção da sua observação. Abrem-se as portas e a galeria é revelada. O pintor? João Pedro Rodrigues

O Descaramento Indiscreto da Burguesia

Hugo Gomes, 01.06.22

Captura-de-ecra-2022-04-26-as-14.54.56-1079x600.pn

Anunciado e noticiado, uma revolução acontece no exterior - um aparente caos - apenas ofuscado pela “tempestade perfeita” gerada no centro de quatros paredes, onde o qual o espectador, assim como o quarteto de personagens, testemunharão. Da janela, a revolta do título, é somente um espectáculo para os seus olhos, um fogo-de-artifício que atribui cores nunca vistas na cidade de Lisboa. Noite fatídica para o país, mas tal não interessa, o casal prepara o seu combinado jantar (nada neste mundo os demove a desmarcar tal 'coisa'), um convívio que junta mais dois amigos, cuja sua entrada naquele refúgio de privilégio funcionará como ignição para o cataclismo.   

Esta primeira longa-metragem de Tiago R. Santos (argumentista de alguns filmes de António-Pedro Vasconcelos [“Call Girl”], Leonel Vieira [“O Leão da Estrela”] e Sérgio Graciano [“Perdidos”]), resume-se como uma representação da sua contemporaneidade, um projeto à imagem do seu tempo - os inícios da pandemia onde tudo era “pintado” de branco ou preto - o qual a distopia idealizada cumplicita com o cenário de perturbação social e com isso trazendo para o aquário uma burguesia conformista figurada no casal-protagonista (o qual somos introduzidos entre o calor de corpos que “se esfregam” num sofá de sala).  

Contudo, foi na limitação dos seus recursos que a “Revolta” encontra o seu mote de “know-how”, o de abraçar a sua escassez para extrair a criatividade, e não só. Convenhamos afirmar que os dois factores que sobressaem no filme são, respectivamente, as duas causas perpetuadas pelo realizador (agora emancipado como tal) neste seu percurso pelo panorama português; a priorização do guião e por sua vez o trabalho de atores, duas “qualidades” (as aspas servem no ‘goto’ do leitor, conforme seja a sua ideologia na abordagem a estas propriedades) que dão as “mãos” nesta entropia de relações.   

Por entre o “filme de cerco”, ou a “colisão entre egos”, este primo afastado de “Quem tem Medo de Virginia Woolf?” (equação de desastre em que “forças exteriores” perturbam a "harmonia" do casal) se apronta como uma obra de referências vistosas, incumbidas de trazer uma hipotética “revolução” para apresentar tópicos há muito desvanecidos no cinema português (a sátira em prol da divergência entre classes). Tiago R. Santos apela nesta sua história de catarses e epifanias altamente freudianas, um olhar pelo nosso umbiguismo existencial, pela relação sedentária para com o restante mundo e a distância com que olhamos para as mudanças em redor. Ricardo Pereira e Teresa Tavares interpretam esses seres “parasitários” à sua rotina, uma relação que “sugará” os outros dois peões, todos contribuindo com os seus fados, seja a deriva tempestuosa, seja a solidão disfarçada.   

Captura-de-ecra-2022-04-26-as-14.51.20-e1650981344

Se é óbvio que os calcanhares de Aquiles de primeira obra estão à vista (como fraturas expostas digamos) - desde as menções e as influências não devidamente embrulhadas (um erro em atribuir uma causa à “revolução exterior” o qual  se poderia ficar pela sugestão, notavelmente mais carpenteriano), até pelas quebras rítmicas que os diálogos ocasionalmente demonstram no seu arranque conflituoso - Tiago R. Santos não se camufla no anonimato, há uma vontade própria na sua câmara em dirigir-se naquele espaço, nem que seja a (re)criar uma ligação quase carnal para com Teresa Tavares (a atriz é facilmente destacada até porque inconscientemente o filme a torna no vector físico e emocional do turbilhão). 

No fim de contas, o exercício aliado à necessidade produtiva (sendo um filme rodado no auge da pandemia, contrariando o congelamento de produções e restrições sociais) funcionou, quer na prática e na teórica, como uma ideia executávelmente simples e, simultaneamente, propício a inúmeras interpretações. Através dessa simplicidade deparamos com uma fórmula vencedora que muitos (sobretudo os trovadores do “cinema para grande público”), até então, evitaram, sem razão alguma. 

Ama-se o plano para nunca odiar o Cinema

Hugo Gomes, 12.06.17

nmj.jpg

Há 10 anos,  estreava entre nós o filme “O Capacete Dourado”, um romance de contornos shakespearianos transportado para o contexto social atual e que, de forma vampírica, beberia de uma tragédia que tanto “apimentou” os medias portugueses. Infelizmente, apesar da passagem em Locarno, a atenção não foi a devida o que, em conjunto com os “trambolhões” que o sistema de validação e financiamento de projetos cinematográficos deu na última década, procrastinaram este tão esperado regresso (sem querer afirmar com isso que Jorge Cramez é uma espécie de D. Sebastião do cinema português). Cinema, esse, que ao contrário do pensamento demagógico, não precisa de ser salvo.

Eis que surge “Amor Amor”, a transformação atual da peça La Place Royale ou l’Amoureux Extravagante, de Pierre Corneille (escrito em 1634), para uma intimidade ritualizada que o autor assume. Tratando-se de uma história de encruzilhadas amorosas entre cinco personagens, todas elas remetidas a amores secretos e a planos ocultos para a concretização dessas mesmas paixões, tudo decorrido no último do ano.

O quincôncio é inserido em diferentes signos, como figuras estampadas de qualquer baralho de tarot, tendo a nosso dispor a Trágica (Ana Moreira), o Manipulador (Jaime Freitas), a Cínica (Margarida Vila-Nova), o Ingénuo (Nuno Casanovas) e por fim, o Romântico (Guilherme Moura). Figuras que incentivarão esta tragicomédia a seguir sob um registo coeso e igualmente boémio em relação às suas tramas. Uma festa, uma praia e por fim o réveillon como reinício, as três etapas que adensarão estas relações em constantes choques.

amor.jpg

Mas o que nos motiva a gostar imensamente deste “Amor Amor”, não é o seu enredo, nem as suas personagens, nem sequer os diálogos, nem mesmo as suas sofredoras paixões e compaixões que servem de linguagem meta-cinematográfica. O que realmente realça a nova obra de Cramez de muitas outras produções nacionais (sobretudo aquelas com as quais compete no Indielisboa), é o afeto evocado pelo plano. O realizador constrói um filme tendo em consciência prioritária de como filmá-lo, e nesse modo atribuir uma narrativa vivaça, fortemente rica e sobretudo de um virtuosismo rigoroso em relação à sua estrutura técnica. “Amor Amor” separa-se dos imensos produtos televisivos (sempre associados à palavra – técnica) por essa dedicação à perspetiva do espectador, incutindo com isso algumas das sequências mais belas do cinema português recente. E que amor esse! Pelo plano conjunto, de tão difícil marcação, pelo grande plano que tenta invocar a introspeção quase direta da alma das personagens (a mencionar a transposição dos quadros de arte e do olhar do artista a essa transfiguração).

Mas esta experiência, o bem-vindo reencontro da longa-metragem, não é de todo perfeita e Cramez, apesar de acertar na narrativa visual, falha sobretudo na narrativa temporal. Tarkovski referia o tempo, não como uma simulação, e sim como um retrato realista. “Amor Amor” pode não ter a ousadia de elaborar uma intriga de 24 horas de ordem fiel, porém, não conseguiu transmitir essa sensação de tempo. Um dia é mais atribulado que uma semana e devido a isso, o espectador perde-se neste registo temporal. Trocando por miúdos, há demasiados eventos para 24 horas.

Ivo M. Ferreira: "É estranho como uma tragédia do século XX não é falada, nem estudada"

Hugo Gomes, 01.09.16

still_2_3_1360x765.png

Tudo começou com correspondência. As cartas escritas pelo jovem alferes António Lobo Antunes para a sua primeira mulher, tornaram-se com o passar dos anos mais do que um romance de longa-distância, num olhar intimista e desesperante duma realidade deslocada, porém, certa para muitos dos jovens portugueses de ’68. As Cartas da Guerra ganharam notoriedade como livro, desvendando um escritor em busca de si mesmo no mais austero dos cenários, agora convertido num filme com tamanha dimensão política e sobretudo existencialista. Ivo Ferreira foi o mentor deste bélico português onde a verdadeira guerra reside no interior de cada ser. O Cinematograficamente Falando … com o realizador sobre a sua terceira longa-metragem, um “parto” difícil que resultou num filme ímpar da nossa cinematografia.

Gostaria antes de mais, perguntar o porquê de António Lobo Antunes e o porquê deste livro concretamente?

O porquê deste livro? Bem, porque quando o li tive a consciência que estava perante de material fortíssimo, quer em termos históricos (é em todo o caso um documento), topográficos, estamos a falar de um melhores escritores de sempre da Língua Portuguesa … e do Mundo, e é composto por uma magnífica história de amor. Não consigo responder exatamente o porquê de António Lobo Antunes e deste mesmo livro, mas é fantástico este acumular de cartas, organizadas pelas suas filhas, tendo em conta que eram cartas guardadas pelo autor enquanto alferes miliciano. Cartas que trocava com a sua mulher, que na altura estava grávida da primeira filha. Ainda mais fantástico é a forma como ele olha e descreve as pessoas em seu redor, esses homens que estão a sair do seu país, “empurrados” totalmente para aquela guerra absurda e fora de tempo. 

Fala-se de complicações na produção. O filme demorou bastante tempo a ser concretizado, por algum motivo?

Houve complicações porque o Estado faliu e o ICA não tinha dinheiro. Época, Guerra e África são três componentes que afastam qualquer produtor entusiasmado, e quando começou-se a construir a parte financeira do projeto, a parte portuguesa não estava concretizada, isso não só bloqueou o filme, como também repugnou a tentativa de coprodução. Porque Cartas da Guerra era por si um filme com interesse em ser internacionalizado. Mais tarde quando veio o dinheiro tivemos a consciência que se íamos filmar em África iríamos gastar todo o dinheiro do “bolo“, logo na rodagem. Estávamos todos falidos, então lancei-me numa jogada arriscada – e se eu terminar o filme?

Um facto é que iniciamos a rodagem em Abril, começamos a montar de imediato, fomos a Veneza, pelo qual fomos selecionados pelo European Gap-Financing Market para participarmos num fórum, e em dois dias conseguimos financiamento para o resto do filme. O filme demorou muito tempo, sim, mas não foi porque andamos a “empatar“, não sei se é recorde mundial, mas desde o momento em que começou a rodagem até à Competição em Berlim, foi bastante rápido.

Em Berlim, Cartas da Guerra foi constantemente apontado como um dos potenciais candidatos ao Urso de Ouro. Como se sentiu perante tais aclamações?

Só o facto de estar em competição num dos melhores festivais do Mundo já é fantástico, não com isto seja falta de ambição mas é por si um motivo para estar satisfeito com o filme.

É verdade que os atores foram submetidos a uma “recruta de preparação“?

Algo que temos que ter em conta, visto que vamos ter atores a desempenhar soldados num cenário de Guerra, é garantir que os atores tenham ou conheçam formação militar. Muitos dos atores já nem se lembravam dos seus tempos militares, outros nem sequer foram à tropa, então teria que haver rigor nesta encenação. Os atores teriam que, por exemplo, saber como pegar uma arma ou até mesmo subir um Unimog [designação de uma série de caminhões off-road produzida pela Mercedes-Benz, utilizados sobretudo em serviço militar]. Aliás, as primeiras imagens dos nossos atores fardados e munidos com a G3 a tentarem subir pela primeira vez um Unimog, era realmente um filme muito cómico. Eles também teriam que experienciar a “pressão“, nesse aspeto os Comandos foram “simpáticos“, não para os recrutas como é óbvio, porque era preciso que eles sentissem a violência, quer física e psicológica, como preparação para uma eventual guerra.

800.jpg

Ricardo Pereira, Margarida Vila-Nova, Miguel Nunes e Ivo M. Ferreira no Festival de Berlim

As Forças Armadas Portuguesas tiveram um importante papel na rodagem do filme?

Sim, portuguesas como também angolanas. Tivemos sobretudo um apoio imenso das Forças Armadas Angolanas. Esta ajuda não foi preciosa, nem dispensável, foi completamente impossível fazer este filme sem o apoio deles. Eles proporcionaram-nos tudo, desde logística a armamento. Falamos também em helicópteros, Unimog, Kamazes que foram emprestados pelo exército para transportar mais de 40 toneladas de material para a construção do aquartelamento. Nós construímos aquilo do meio do nada, tivemos até que reconstruir a ponte que dava acesso ao aquartelamento.

No fundo, o Ivo Ferreira filmou um filme de guerra, cuja guerra está ausente.

Ausente no pensamento deles. Aquilo é uma guerra pouco convencional, é a guerra do “toque e foge“, os aquartelamentos estavam perdidos no meio do nada, supostamente eram posições estratégicas, uma estratégia um pouco questionável portanto, eles estavam a tentar defender a Zâmbia. Aquilo é que era o quotidiano daqueles soldados, o afastamento, o isolamento, eram essas as verdadeiras guerra daqueles homens. No filme, os inimigos são eles próprios. 

Em determinada cena, enquanto os soldados se limpam numa casa de banho de campanha é possível visualizar um retrato de Salazar numa pia. Tal imagem é uma provocação ou somente uma demonstração do desgaste psicológico e da consciência política destes homens após meses no aquartelamento?

Os soldados estavam a viver numa altura difícil. Encontravam-se a lutar numa guerra moribunda, uma guerra falida, uma guerra “estúpida” fora de época, simplesmente porque a ditadura não permitiu uma fácil descolonização. Aliás, em 68 (o ano em que decorre o filme) não havia qualquer motivo para persistir em colónias, a Guerra da Argélia já terminou há anos.  Essa imagem só esclarece a segunda fase desta estadia, o facto dos soldados encararem o fascismo, essa ditadura, como o verdadeiro inimigo. Obviamente que mais para a frente o inimigo acaba por ser eles próprios, ou seja, o pensamento deles passa a ser “e se sobrevivermos“. 

Uma natureza entre os soldados, algo que está descrito no filme, é que estes sonham regressas à vida civil, porém, não sabem concretamente o que fazer com esse retorno.

O que sei, é que os suicídios ocorridos durante esse período, não aconteciam durante a Guerra propriamente dita, mas sim, no regresso a casa. Estes aconteciam antes de voltarem a Portugal, derivado ao facto deles terem mudado tanto, mas tanto, que não sabiam mais como receber a dita “vida normal“. Por isso, sim, esse é o grande drama da personagem principal.

Mas nesse drama é também acrescentado, como refere o próprio Lobo Antunes, com um aparecimento de uma consciência política.

Sim, ele próprio diz isso nas suas cartas: “O meu instinto conservador e comodista tem evoluído muito, e o ponteiro desloca-se, dia a dia, para a esquerda: não posso continuar a viver como o tenho feito até aqui.” Essa consciência politica também foi alimentada com o constante contacto com um Capitão, que foi o Capitão Ernesto Melo Antunes, que no filme é o seu parceiro de xadrez.

ng7533854.jpg

Quanto a novos projetos?

Vou começar a filmar uma nova longa ainda este ano, na China-Macau, intitulado de “Hotel Império“, uma coprodução portuguesa com atores portugueses e chineses.

Também, estou a preparar um outro trabalho, um filme pesado com um orçamento de igual adjetivo, sobre um tema idêntico a este da Guerra Colonial. Este filme, que terá data para 2018, será sobre as FP25, as Forças Populares 25 de Abril, uma organização terrorista portuguesa.

Perguntam-me constantemente, “mas para quê? Se os que lá tiveram, os que viveram isso não querem falar sobre o assunto, porque raio você quer ?

Como nasceu essa necessidade de falar daquilo que ninguém quer falar? Acredita que temas como este [Guerra Colonial] devem ser abordados para as novas gerações, por exemplo?

Sou fascinado por buracos negros, baús fechados e quartos privados e se sinto que há um assunto interdito, tabu, quero mais que tudo “falar” sobre ele. É muito estranho como é que na nossa História recente, os nossos livros de História passam do Estado Novo com duas ou três imagens, tocamos na Guerra Colonial com duas ou três linhas, passamos por uns indivíduos com cravos nas mãos e pronto chegamos a uma bandeira azul e umas estrelas. É estranho como uma tragédia do século XX não é falada, nem estudada. Claro, é olhando o passado que poderemos preparar o futuro.