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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

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Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Música "Maestro"!!

Hugo Gomes, 09.12.23

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A vida concebida como uma sinfonia, uma pauta clássica que transcende qualquer simplificação cinebiográfica. “Maestro”, o segundo empreendimento de Bradley Cooper na sua demanda na realização, é um objeto estimável de tecnicismo e virtude, há mestria, atentado ao termo, nesta orquestra em desconstrução da sua figura biográfica - Leonard Bernstein (1918 - 1990) - compositor, condutor, pianista e mais que isso, um mentor que moldou não apenas um século musical, mas também o cenário cinematográfico (o que dizer da sonoridade de “West Side Story”, aqui fazendo perninha zeitgeist?). 

Cooper, cresceu como ator, passando de típico galã, o bonito da boysbandThe Hangover” até a sniper no filme vendido de Clint Eastwood (“American Sniper”), com o cineasta e também ator (bem) americano ao que parece terá aprendido devidamente o ofício, e sem meias medidas, aventura-se com Lady Gaga na terceira versão de “A Star is Born”, uma conquista garantida de público, e metido no goto de críticos e Academia. Nesse filme, Cooper, também protagonista, sob fintas atrás de fintas narrativas, trouxe-nos uma obra seca quanto à sua musicalidade, obviamente trazendo parte e parte da sua experiência com Eastwood, de um classicismo quanto à sua natureza, mas nunca na sua fórmula estetizada. Com “Maestro”, um projeto há muito ‘abraçado’ por Martin Scorsese, mas nunca avançado por ele (conta-se que o impedimento estava em de nunca ter conseguido encontrar um ator à altura do papel), Bradley Cooper dedica corpo (e nariz, a ‘parva’ controvérsia envolto do seu nariz prostético) e alma nesta composição, em vista grossa na sua narrativa temos o comum neste tipo de cinema. 

Tudo começa em modo confissão ensanduichada, cujo condimento resume-se a saltos acrobáticos por entre factos e personalidades, como uma lição estudada e decorada da sua personagem. No entanto, dois pontos (e não menores) emergem nesta experiência biográfica. O primeiro, a desconstrução embicada na personagem, que tal como “A Star is Born” é através da presença feminina, a coadjuvante, que é germinado como atalho para a persona incorporada por Cooper. Lady Gaga, a estrela em ascensão em contraponto com a queda de um rockstar no filme anterior, interliga, aqui, com Carey Mulligan (interpretando a atriz costarriquenha-chilena Felicia Montealegre), a esposa dedicada ao sucesso do seu marido (um homem, deve-se salientar, de um única mulher, mas de vários homens). É através da sua presença, a sombra de Bernstein, que gradualmente somos sequestrados à sua óptica, desviando o centro do filme à personalidade-homenagem, excepto quando, munido da sua batuta, conduz esplendorosamente as orquestras ao longo da sua vida. Uma magnífica sequência de mais de 6 minutos, catedral em redor, com Cooper manejando a sua “vareta”, que segundo consta, aprendeu verdadeiramente em nome da veracidade.

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E por aí mesmo que chegamos ao segundo ponto, ou nota musical como apropriação temática, o virtuosismos técnico (os travellings que invejam o espaço, os enquadramentos, o trabalho em fora de campo e para lá dele), fotográfico (as cores, ou a falta delas, desde os tons à saturação, um respeito e por si só contextualização histórica com prisma no cinema corrente) e até na montagem (as transições que entram em diálogo com a memória cinematográfica, e em especial caso com a tradição do musical hollywoodiano), com inspirações e aspirações scorseseanas (associação a nós trazida pelo nome do realizador no registo de produção). 

É um espéctaculo de “directing” à moda que só Hollywood pomposamente conseguiria “parir”, e hoje algo perdido pela automatização e pela validação do realismo-imperador, contudo, é a prova que Bradley Cooper desponte como um dos realizadores do futuro daquela casa do cinema cada vez mais órfã. Juntamos a confirmação do seu nome ao lado de outros talentos em voga como Damien Chazelle (em paralelo com o seu subestimado “Babylon” há uns quantos campos cruzados, nomeadamente a música como transportadora da emoção dos seus personagens), e por fim, Cooper superando-se ainda mais como ator, num desempenho longe da dependência da protética e da mimetização, enquanto que Mulligan, apontada como uma das favoritas à estatueta e com a confiança total do seu parceiro e realizador, possui mais responsabilidade do que condução. Mas o seu “estado de graça” está a funcionar … 

Nada, convém sublinhar, que retire a este “Maestro” a sua grandeza.