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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

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Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Nos "Intervalos" do cinema, o Cinema não foge! Arranca o 1º Encontro e Mostra de Cinema nas Caldas da Rainha

Hugo Gomes, 09.04.25

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"Rhoma Acans" (Leonor Teles, 2012), a ser exibido no dia 10 de abril

Alexandra Ramires, Laura Gonçalves, Leonor Teles, André Guiomar, Filipa Reis, João Miller Guerra, Mário Macedo e, sem sombra de dúvida, Manuel Mozos — entre outros — compõem a equipa reunida para preencher a edição inaugural do Intervalos: Encontro e Mostra de Cinema nas Caldas da Rainha, no mais apetecido sumo da cinefilia e cinematografia.

A acontecer na conhecida cidade de uma certa peça de olaria bem característica, entre os dias 10 e 12 de abril, no Centro Cultural & Congressos, esta mostra surge como uma nova iniciativa para descentralizar estas propostas culturais das metrópoles, trazendo um rol de debates, discussões e convergências para apimentar o Cinema nos seus lugares — e fora deles.

Para melhor “cortar a fita” deste novo espaço cultural, o diretor Mário Branquinho, que sob convite do Cinematograficamente Falando… teve a honra de nos oferecer uma breve visita guiada por esses três dias de Luzes, Câmara… Ação!

Antes de mais, gostaria de começar pelo princípio: qual foi a génese desta iniciativa, deste evento ou festival, como podemos ou devemos apelidar? No fundo, como e quando surgiu e começou a ser desenvolvida a ideia?

Estou como diretor do Centro Cultural das Caldas da Rainha há pouco mais de dois anos e, desde o início, quisemos dar continuidade ao trabalho já existente na área do cinema. Até porque tenho uma ligação de longa data ao meio – fui fundador e diretor de um festival de cinema durante mais de 20 anos [CineEco – Festival Internacional de Cinema Ambiental da Serra da Estrela, de 2000 a 2020]. Por isso, fazia todo o sentido incluir o cinema de forma estruturada na programação do Centro Cultural, não apenas com sessões ao ar livre no verão ou acolhendo pontualmente outros festivais, mas com algo mais próprio e identitário.

Foi assim que surgiu a ideia de organizar não exatamente um festival, mas uma mostra, um encontro de cinema. A intenção é que este evento se consolide anualmente como um marco na programação cultural das Caldas da Rainha. Uma mostra focada no cinema português, que promova o diálogo entre realizadores, críticos, distribuidores e o público – e que crie espaço para refletir sobre o estado atual do nosso cinema e um retiro cinéfilo.

E quanto ao nome "Intervalos"? Porque escolheram esse título?

Foi uma escolha do coletivo que organiza esta mostra. É uma alusão à ideia de pensar nos "intervalos" entre os filmes, mas também nas margens onde se encontram o espectador e a obra. Os intervalos são momentos de pausa, de reflexão, de diálogo – e é precisamente isso que queremos propor: um espaço de encontro entre filmes, pessoas e pensamentos. Após muita discussão, o nome acabou por surgir naturalmente nas conversas do grupo.

Como o próprio nome sugere, esta mostra pretende convocar múltiplas relações possíveis com o cinema, explorando o jogo de encontros e intervalos que se desenham e se estabelecem, a cada edição, seja entre imagens, entre filmes, entre filmes e espectadores, ou entre realizadores e público, em função de uma ideia ou proposta de programação específica.

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"A Glória De Fazer Cinema Em Portugal" (Manuel Mozos, 2015), a ser exibido no dia 12

Ao ler a carta de intenções do festival, chamou-me a atenção a aposta quase exclusiva no cinema português. Há aqui um lado claramente pedagógico, de formação de públicos. Pode falar um pouco mais sobre essa escolha e os seus objetivos?

Sim, sem dúvida. Há ainda um longo caminho a percorrer na valorização do cinema português, e isso exige um esforço coletivo: dos realizadores, dos programadores, dos distribuidores, das instituições. No meu papel como programador, sinto essa responsabilidade – e esta mostra é mais um contributo nesse sentido.

Já vínhamos a promover sessões regulares de cineclube no CCC, muitas delas com filmes portugueses, e também nas sessões ao ar livre temos tentado dar espaço ao cinema nacional. Mas com a Intervalos, queremos ir mais além: criar um verdadeiro encontro, um espaço de debate, onde diferentes obras e gerações de cineastas se cruzem.

Um exemplo disso é a proposta de darmos “carta branca” a um realizador, permitindo-lhe escolher um outro filme que dialogue com o seu, e assim gerar um momento de reflexão partilhada. Esta mostra quer ser um contributo vivo para a promoção, discussão e valorização do nosso cinema.

Falou há pouco num “retiro cinéfilo”, e fiquei muito curioso com essa ideia, e como também em entender no que consiste esse retiro cinéfilo?

[Risos] Chamamos-lhe “retiro cinéfilo” de forma informal, claro. Mas a verdade é que queremos criar um espaço e um tempo concentrado, durante três dias, em que nos dedicamos por inteiro ao cinema português. Um momento de imersão.

É um encontro onde conflui o olhar dos realizadores, dos críticos, dos académicos e do público. Onde se criam condições para refletir, debater, pensar novas direções. Um espaço onde, esperamos, possam surgir ideias novas e contributos para o futuro do cinema português. Se conseguirmos tornar isto uma prática anual, acredito que será extremamente relevante para o panorama cinematográfico nacional.

Estamos então perante a primeira edição de uma mostra que se quer duradoura. Fale-me um pouco da programação e da escolha de Manuel Mozos como figura homenageada.

Desde o início quisemos que cada edição homenageasse um realizador português. No diálogo do coletivo que organiza a Intervalos, o nome de Manuel Mozos surgiu naturalmente. É uma figura incontornável do cinema português – realizador, montador, pensador do cinema – e tem uma obra que merece ser destacada e celebrada. Foi uma escolha unânime.

A programação estrutura-se em torno dessa homenagem, mas também inclui outros momentos importantes: sessões de filmes em diálogo, onde duas obras se confrontam e se complementam; debates com realizadores; a presença da Associação Portuguesa de Realizadores (APR), que vem apresentar uma publicação sobre a sua história; e a participação da ESAD.CR [Escola Superior de Artes e Design de Caldas da Rainha], que traz um contributo académico muito importante, incluindo uma mostra dos trabalhos das residências artísticas dos alunos do Mestrado em Artes do Som e da Imagem.

A abrir, teremos por exemplo “Rhoma Acans” de Leonor Teles em diálogo com “Cama de Gato” de Filipa Reis e João Miller Guerra. Acredito que será uma sessão muito rica, com debate posterior. Ao longo dos três dias, teremos outros diálogos entre filmes, conversas e até uma sessão final de live cinema protagonizada por estudantes.

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"Cama de Gato" (João Miller Guerra e Filipa Reis, 2012), a ser exibido no dia 10 de abril

Na programação, encontramos a informação de uma visita guiada, um momento para “descomprimir” do retiro [risos]? Pode contar-nos um pouco mais?

Sim, haverá uma visita especial ao espólio cinematográfico de Mário Lino, que está exposto numa sala do Museu do Centro de Artes das Caldas da Rainha. Trata-se de uma coleção pessoal, reunida ao longo de anos, que certamente irá surpreender. É uma forma de ligar o cinema à cidade, de abrir o festival à comunidade e proporcionar outros olhares sobre a história do cinema.

E no futuro? Ainda antes da primeira edição acontecer, já se pensa no que pode vir a seguir? Quais são as ambições para a Intervalos?

Claro que sim. Só o facto de termos conseguido convencer parceiros importantes como a Câmara Municipal das Caldas da Rainha e o ICA a apoiarem esta primeira edição é já motivo de grande satisfação. Isso dá-nos confiança para o futuro.

O modelo da mostra é sólido, os parceiros estão envolvidos e entusiasmados, e sentimos que há espaço para crescer. A nossa ambição é consolidar a Intervalos no calendário cultural da cidade e da região. E, acima de tudo, contribuir ativamente para que o cinema português continue a afirmar-se, a renovar-se e a dialogar com o público.

Toda a programação poderá ser conseultada aqui

"Elas Fazem Filmes", e fazem mesmo!: Mostra de realizadoras segue pelo país fora através da MUTIM

Hugo Gomes, 18.09.24

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Frágil como o Mundo (Rita Azevedo Gomes, 2001)

Arranca hoje (18/09) a mostra itinerante “Elas Fazem Filmes” - uma colaboração entre a associação MUTIM (Mulheres Trabalhadoras das Imagens em Movimento) e a Cinemateca Portuguesa, com o apoio do ICA. A mostra parte da “casa-mãe”, o Museu do Cinema, com uma sessão dupla: Cães que Ladram aos Pássaros, curta-metragem de Leonor Teles, e a segunda longa-metragem de Monique Rutler, “Jogo de Mão”, cineasta a ser redescoberta, e prossegue com a ambição de chegar a 14 cidades de todo o país até julho de 2025, trazendo uma coleção de obras, célebres e algumas esquecidas que merecem uma nova apreciação, todas dirigidas por mulheres - cineastas portuguesas que desafiam o cânone ou oferecem uma um novo olhar sobre a História do Cinema Português.

A mostra inclui fragmentos de Barbara Virginia, indiscutivelmente a primeira mulher realizadora em Portugal, com “Três Dias sem Deus” (dos 102 minutos, só restam atualmente 25), a inaugural produção portuguesa a competir no Festival de Cannes. Inclui também as primeiras obras de Rita Azevedo Gomes (“Frágil Como o Mundo”, 2001), Manuela Viegas (“Glória”, 1999) e Margarida Gil (“Relação Fiel e Verdadeira”, 1987), documentos históricos de Raquel Soeiro de Brito (“Erupção Vulcânica dos Capelinhos”, 1958) e de Ana Hatherly (“Revolução”, 1975), animação (trabalhos de Laura Gonçalves, Regina Pessoa e Alexandra Ramires) e documentário (Catarina Mourão, Cláudia Varejão ou Susana de Sousa Dias), entre outros. Um verdadeiro “espectáculo de variedades”, uma montra polivalente de filmes cujo único elo comum é o facto de terem sido conduzidos, concebidos e produzidos através do trabalho árduo e dedicação de mulheres.

O MUTIM disponibilizou-se a responder a algumas questões do Cinematograficamente Falando… não só sobre o ciclo itinerante, como também sobre as projeções e ativismos que “Elas Fazem Filmes” pretende alcançar, bem como sobre a natureza e a estrutura do coletivo. Mariana Liz, professora e co-autora do livro “Realizadoras Portuguesas: Cinema no Feminino na Era Contemporânea”, e Marta Fernandes, distribuidora e programadora [Midas Filmes], aceitaram o desafio, e respeitando o espírito do movimento, falaram em nome de todas, e não apenas uma. Assim, o MUTIM assume uma entidade coletiva e própria neste informativo diálogo. 

Qual foi o impulso inicial para dar vida à mostra “Elas Fazem Filmes” e quais os obstáculos enfrentados ao longo do processo de curadoria e produção?

Desde a sua criação em Abril de 2022, que a MUTIM promove sessões de filmes realizados por mulheres, sessões que contam com debates e a presença sempre que possível de realizadoras ou membros da equipa e de outras profissionais que possam discutir os filmes. As sessões começaram em Lisboa, em parceria com o Goethe-Institut, e mais tarde passámos também a promovê-las no Porto, em conjunto com a Casa das Artes. O ano passado e depois das conclusões do estudo do meio sobre “A Condição da Mulher nos Sectores do Cinema e Audiovisual em Portugal achámos que devíamos criar uma iniciativa que nos permitisse promover o cinema feito por mulheres em Portugal, mas também discutir a nível nacional e com os espectadores as conclusões a que o estudo chegou. As mulheres ganham menos, ocupam menos cargos de chefia, tem mais entraves à progressão da carreira, são vítimas de discriminação de género, assédio, racismo. 

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Jogo de Mão (Monique Rutler, 1983)

Relativamente aos entraves, o apoio que conseguimos do ICA, sendo fundamental para levarmos a cabo a mostra, foi, infelizmente, inferior ao solicitado e por isso não nos permitirá ir a tantas cidades como ambicionávamos. E no processo de programação, existiram também filmes que gostaríamos muito de ter incluído, mas que não foi possível por uma questão de inexistência de cópias disponíveis ou por questões de direitos. 

A mostra reúne cineastas de diferentes gerações, de géneros como também de movimentos artísticos. Como se deu a seleção dos filmes e de que modo acreditam que essa diversidade de perspetivas traduz o panorama do cinema português à luz das mulheres?

A programação da mostra “Elas Fazem Filmes” foi, como aliás todo o processo desde a procura de financiamento até à produção em curso, um trabalho colectivo, feito a muitas mãos. Queríamos apresentar uma programação inédita que permitisse ser um ponto de partida para reflectir sobre o cinema feito por mulheres em Portugal. E para isso era fundamental apresentar filmes de cineastas de diferentes gerações, a trabalhar em diferentes géneros cinematográficos de forma a que pudéssemos ter uma diversidade fértil de olhares e estabelecer diálogos entre filmes e realizadoras. Quisemos ter o máximo de géneros presentes, ter animação, documentários, documentários mais experimentais, aproximações ao fantástico e ao terror, ao filme etnográfico, à ficção científica. Mostrar que o cinema feito por mulheres em Portugal é muito variado e rico. E ajudar a desmontar preconceitos que existam relativamente ao cinema português e especificamente ao cinema realizado por mulheres. 

A colaboração com a Cinemateca Portuguesa, nomeadamente no que toca à digitalização de filmes, foi um ponto essencial para a concretização deste projeto. Como vêem o impacto dessa parceria na preservação e disseminação da obra cinematográfica de mulheres portuguesas?

É um trabalho imprescindível. Parte dos filmes que iremos mostrar só é possível fazê-lo graças a este trabalho da Cinemateca. Seria muito difícil exibir fora de Lisboa e da Cinemateca muitos dos filmes que programamos. É possível fazê-lo porque existem hoje cópias digitais. É preciso ter sempre presente a questão do acesso. Quando, no passado, outras cidades reivindicavam o direito a ter uma Cinemateca, estavam a pedir a descentralização. É claro que o acesso a cópias em 35mm é sempre difícil e por questões de preservação pode ser limitado. Com a digitalização, a circulação torna-se possível e os filmes passam a ser programados mais facilmente, salvando-os de uma invisibilização a que eram sujeitos por uma questão de suporte. Mas é um trabalho que tem de continuar a ser feito, e deve ser defendido e promovido, porque continuam a existir muitos filmes por digitalizar. 

A MUTIM defende uma maior equidade no sector cinematográfico e audiovisual. Na vossa opinião, que transformações mais urgentes precisam de acontecer para garantir uma verdadeira representatividade das mulheres no meio?

Há várias medidas que podem ser postas em prática e que contribuíram não só para uma maior representatividade das mulheres, mas também uma maior igualdade do setor do cinema e audiovisual em Portugal. Por exemplo, a MUTIM defende o estabelecimento de parcerias com instituições públicas, como a

Comissão para a Igualdade de Género, no sentido de explorar sinergias ao nível do aproveitamento de políticas que tenham impacto no nosso sector, e na sociedade de forma mais lata. Inspirando-nos no que já acontece em outros países europeus, propomos também que se implementem, nos concursos públicos de apoio ao sector, incluindo os do ICA, majorações nos projetos que cumpram critérios de representatividade de género e nos projetos que tenham como criadores e/ou chefes de departamento pessoas racializadas. 

Para além disto, defendemos a atribuição de um valor monetário extra a produções que cumpram 50%/50% ao nível da paridade de género na constituição das suas equipas e respetivas direções de departamento; e a atribuição de um valor monetário extra para a seguinte produção de produtora que continue a cumprir o critério dos 50% / 50% na composição de género das equipas. No que tem a ver com composições de jurados de prémios e financiamentos ao setor, é muito importante não só ter paridade, mas também formar as pessoas no sentido de combater o unconscious bias do sector e diminuir os estereótipos das candidaturas. Dar aos jurados Inclusion Checklists para acompanhar a leitura dos projetos pode também ser útil se contemplado no regulamento, e prevendo a atribuição de pontos extra na avaliação aos projetos que os cumpram. 

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Três Dias sem Deus (Barbara Virgínia, 1943)

Finalmente, recomendamos que seja posta em prática uma avaliação interna contínua sobre representatividade de género e racial, sendo que, na sequência do nosso estudo, acreditamos que ganhar consciência anual dos dados factuais que compõem ou não a diversidade das produções e das narrativas é um primeiro passo fundamental para a construção de um setor mais diverso e menos desigual. Aliada a esta visão, propomos também o estabelecimento de metas percentuais de representatividade e consequente aplicação de medidas para as concretizar.

De que forma a mostra “Elas Fazem Filmes” procura fomentar uma reflexão crítica sobre a imagem e o papel das mulheres no cinema português, tanto no conteúdo narrativo como nas oportunidades de participação?

Todas as sessões da mostra terão uma conversa / debate no final que contará com as realizadoras, profissionais mulheres que integraram a equipa técnica e artística dos filmes apresentados e associadas da MUTIM. E tentámos organizar as sessões de forma a que duas realizadoras de gerações diferentes pudessem conversar sobre as semelhanças e diferenças nos desafios de filmar nas suas gerações. Ao convidar não só realizadoras a falar sobre o filme, mas também outras profissionais, queremos sublinhar o trabalho da criação de um filme como um trabalho colectivo e valorizar todas as profissionais que para nele trabalham. Como já foi dito, queremos também que associadas da MUTIM estejam presentes para discutir as conclusões do estudo do meio, porque falar das conclusões do estudo é o primeiro passo para a mudança. 

A interseccionalidade tem sido um pilar nas discussões da MUTIM. De que modo este princípio influenciou a escolha dos filmes e como têm procurado dar palco a mulheres de diferentes contextos sociais, raciais e geográficos?

É algo que temos sempre presente e que tentamos cumprir o máximo possível e como tal influenciou parte das escolhas que fizemos de programação. Sabemos que as dificuldades que as mulheres enfrentam no cinema e no audiovisual são ainda maiores quando falamos de mulheres fora dos centros urbanos ou de mulheres imigrantes, racializadas ou trans. O nosso trabalho tem obrigatoriamente de passar por ajudar a eliminar essas barreiras.

A mostra vai passar por várias cidades do país. Como esperam que a itinerância contribua para a receção das obras e para a criação de novos públicos, especialmente fora dos grandes centros urbanos?

Quando começámos a pensar a mostra, pareceu-nos crucial que não fosse mais uma mostra que se centrasse unicamente nos grandes centros urbanos, até porque já organizávamos sessões regularmente nas cidades de Lisboa e do Porto. Tendo em conta que é muito mais difícil aceder a cinema português fora das grandes cidades, e mais ainda a filmes realizados por mulheres, achámos desde o início que a itinerância e levar estes filmes ao máximo de cidades possível seria uma necessidade. Mas mais que mostrá-los, os filmes serão acompanhados pelas realizadoras e por associadas da MUTIM porque queremos que se estabeleça um diálogo com os públicos, queremos ajudar à formação de públicos para o cinema português, mas também ajudar ao debate sobre as questões de género. E tentaremos em todas as cidades por que passarmos e com a ajuda dos nossos parceiros locais fazer um trabalho junto do público escolar, trabalho que nos parece de extrema importância.

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Para mais informação sobre a mostra ver aqui

Curtas, curtinhas, a origem: 1ª edição dos Prémios Curtas

Hugo Gomes, 13.03.23

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Os premiados e os jurados / Fotografia.: Ricardo Fangueiro

Foi através de uma curta que Portugal desbravou caminho em direção à Kodak Theater, a nomeação à tão cobiçada estatueta norte-americana automaticamente entrou para a História audiovisual do nosso país, e então porquê de estarmos constantemente a reduzi-los a "protótipos" de futuras longas-metragens?

André Marques teve um sonho, criar uma cerimónia de festividades, premiações e de comunhão a esse universo bem português, a resistência do Cinema na sua mais natural essência, a simples e de rápida dicção, a curta. Para isso juntou oito magníficos* e fundou um júri, aliciou e arrecadou apoios, e “convidou” a todos os participantes a inscrever o seu trabalho. A sua vontade fez com que o seu desejo se materializasse. No passado dia 10 de março, sexta-feira nervosa devido à nomeação de “Ice Merchants”, cujos Óscares seriam revelados no domingo seguinte (“será desta?” pensavam todos os que presentes), o Auditório Fernando Pessa em Lisboa encheu-se (deve-se sublinhar), para receber a primeira edição, modesta, ainda com o seu quê de improviso, muitas vezes ocultado graças ao malabarismo e carisma de Rui Alves de Sousa, radialista da Antena 1, que assumia o papel de anfitrião. Intercalado pela dita premiação e pela projeção de três curtas referentes aos três géneros-base (ficção, documentário e animação), a cerimónia ficou marcada pelas promessas do seu fundador, ambicionando seguintes edições em maior escala e a ambição de um “microfestival” em celebração daquilo que a curta-metragem tão bem representa - o Cinema, aqui e agora.   

Quanto à premiação, a noite consagrou “Azul” de Ágata de Pinho com cinco prémios, no qual incluem as categorias de Curta de Ficção, Realização, Argumento, Atriz (também Pinho) e Fotografia (assinado por Leonor Teles). “O Homem do Lixo” de Laura Gonçalves arrecada três distinções (Curta de Animação, Curta Documental, Banda-Sonora), igualando com “Punkada” de Gonçalo Barata Ferreira (Montagem, Caracterização, Guarda-Roupa). Os outros prémios; Vítor Norte recebe o de Melhor Ator (“O Caso Coutinho” de Luís Alves), Nuno Nolasco como Ator Secundário (“Tornar-se um Homem na Idade Média” de Pedro Neves Marques), Rita Tristão na categoria de Atriz Secundária (“As Feras” de Paulo André Ferreira), Rodrigo Manaia em Interpretação Infantil (“By Flavio” de Pedro Cabeleira), e ainda a animação “Garrano” de David Doutel e Vasco Sá no campo dos Som / Efeitos Sonoros juntamente com a ‘dobradinha’ de “2020: Odisseia no 3.º Esquerdo” de Ricardo Leite (Direção Artística, Efeitos Visuais).

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Rui Alves Sousa e eu / Foto.: Ricardo Fangueiro

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Vítor Norte brama ao Cinema após vencer o Prémio de Ator / Foto.: Ricardo Fangueiro

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André Marques, fundador do evento, discursa / Foto.: Ricardo Fangueiro

*Bruno Gascon (realizador de “Carga” e “Sombra”), Mia Tomé (atriz e radialista), Edgar Morais (ator), Inês Moreira Santos (crítica e blogger do Hoje Vi(Vi) um Filme), Teresa Vieira (curadora, crítica e radialista da Antena 3), Rafael Félix (crítico e fundador do Fio Condutor) e André Pereira (videografo e editor de vídeo da Renascença).