Silenciosamente, aprendendo com o Spielberg
Mas o que ainda há para mostrar depois do primeiro "A Quiet Place"?
A questão aqui não é certamente o que se tem para mostrar, mas sim, como mostrar. A continuação do sucesso de 2018 é um filme que não inova a representação do seu pós-apocalipse. Possivelmente, não o deseja, preferindo trazer para primeiro plano a emoção enquanto espetáculo neste género de filmes. É fácil acabar com o Mundo... tarefa mais árdua é fazer com que o espectador se preocupe com isso. E é aí que entra John Krasinski, desta vez menos como ator e mais focado na sua posição de realizador.
Onde “A Quiet Place” era um filme de cerco, com monstruosidades pelo meio e uma proposta falível, mas esforçada (a de tentar, no meio de tanta e estridente banda sonora, elaborar um filme de silêncios), aqui interagimos com o que inicialmente parece ser uma sequela, sem surpresas e sem novidades, narrativamente em linha direta. Krasinski não elabora "twists" nem revelações de última hora, foca-se numa família (aliás, o que sobra dela) e a sua sobrevivência num ambiente hostil. E é nisso que o espetáculo dramático é aprimorado.Num terreno familiar, "A Quiet Place Part II" procura apresentar uma experiência do foro emocional, extraindo daí um suspense crescente e estabilizador, graças às opções de câmara, aos "jump scares" contínuos e, por fim, uma narrativa "salta-pocinhas" que deixa as audiências em plena intermitência.
A ação persiste em acompanhar estes peões da resistência do último bastião da Humanidade – a solidariedade -, nunca saindo destas perspetivas para apresentar sub-enredos "informativos". O espectador encontra-se em pé de igualdade com estas personagens e, apesar de alguns "saltos" específicos na ação, nunca nos separamos delas. É curioso encontrar em Krasinski essas qualidades um pouco perdidas nesta Hollywood tão tecnológica e dependente de marcos de cultura popular. Percebe-se que o nosso ator e realizador aprendeu este estilo de “storytelling” com um dos mais célebres da área, Steven Spielberg, hoje algo associado a um cinema datado.
Um herdeiro "spielbergiano"? Existem registos dessas qualidades (talvez legado, quem sabe?), mas antes que o exagero nos atinja ou seja apontando, a resposta é não. Não se encontra aqui o “know-how” digno de um “Jaws” (1975), tanto mais que as "criaturas" estão mais que presentes e vistosas, mas existe esta economia da representação apocalíptica e é essa a sua arma: a emoção colhida nesta variante de extermínio da raça humana. Ou seja, é avançar para um Spielberg trinta anos mais tarde, o de “War of the Worlds” (2005), onde a invasão alienígena era concentrada no prisma dramático de uma família só, persistindo nesse registo.
Voltando ao início, não basta erradicar o Mundo, há que criar nos espectadores empatia para essa causa. “A Quiet Place Part II”, sem inventar coisa alguma, aprendeu devidamente essa lição.