A Lã e a Neve: a congeneridade entre cinema e o teatro!
A Lã e a Neve são gémeos estéticos, ambos brancos, mas as diferenças são muitas, mais do que aquelas que estão a mercê dos nossos olhos. A temperatura, a textura e a transformação (enquanto que um é já transformado, o outro está por vias de transformar), a essência destes dois elementos transmitem a natureza dos gémeos, seres fotocopiados de espíritos em plena descoincidência. A Lã e a Neve, tendo de forma intacta essa mesma definição, é também um espectáculo coreografado por Madalena Victorino, um teatro experimental ditado pelo improviso que a coreografa deseja chegar aos palcos, porém, no cinema é cosido sob a tela pelas mãos de João Vladmiro (Lacrau). Trata-se de uma obra encomendada sobre o processo criativo deste mesmo espectáculo, a sua conceção até à chegada ao público.
A Lã e a Neve nunca esconde o seu registo de encomenda, a automatização deste processo e a câmara sem personalidade nem química para com as imagens, quase alusivo à longa batalha de Victorino em criar relações de confiança e simbiose entre o seu leque de atores, que não se escondem do ridículo das suas performances frente ao "testemunho". “Ridículo”, esse, que poderá ser julgado pelo espectador e influenciando a sua opinião acerca desta obra filmada. Todavia e mesmo sem este julgado intolerante da diversidade artística, A Lã e a Neve [o filme] não revela nenhum novo autor como havia sido proclamado em Lacrau, ao invés disso presenciamos alguém que ousa em desafiar o academismo (e ainda bem!) mas que não encontra a sua identidade.
João Vladmiro demonstra-se amorfo, mas esforçado em construir uma coerência a esta "epopeia" artística. Faltava-lhe visão e uma incisão mais profunda na condição de ator e da sua relação com o espaço coletivo. Curiosamente, o filme e a peça filmada funcionam sob a temática da Lã e a Neve, gémeos idênticos, mas de diferentes inerências.