Há 4500 anos, enquanto tu fazias a tua guerra, criámos a agricultura. Há 2000 anos, enquanto tu fazias a tua guerra, criámos a boa governação dos reinos. Há 1000 anos, enquanto tu fazias a tua guerra, criámos o chão do reggae e do jazz. Hoje, perante a tua guerra, criaremos contigo a tua paz.
Começo por citar John Lennon, “make love, not war”, frase, essa, celebrizada na cultura pop e muitas vezes adoptada em diversas manifestações sociais, aplica-se de tal forma a esta nova obra de João Viana, “A Batalha de Tabatô” (extensão da sua curta-metragem intitulada somente por Tabatô, que fora também apresentado no último Festival de Berlim), como forma de consolidar com os “fantasmas”, sendo que ainda se encontram presentes, na Guiné-Bissau. Viana parece utilizar as mesmas armas de Lennon nesta conquista da paz, sonho eterno e talvez inalcançável segundo os mais pessimistas, o que faz por via da música, neste caso o realizador ressurge com um trabalho de pesquisa de mais de cinco anos sobre as tradições, folclore e as questões sociais do país em questão, para nos trazer uma obra que se refere a muito, mas que igualmente parece dizer pouco.
Sem querer cair no equívoco, saliento que “A Batalha de Tabatô” é uma espécie de retrato pacifista, onde as críticas e as crónicas levadas a cabo pelo realizador são colocadas no grande ecrã através do sentido figurado. Viana utiliza influências dos mestres vanguardistas portugueses (talvez fruto do seu trabalho como assistente de realização), planos longos, simetricamente enquadrados, salientando uma consideração étnica a Guiné-Bissau, a representação generalizada de um povo que tem que lidar e exorcizar os seus próprios espectros.
Em cada plano, João Viana remete às mais diferentes questões e através dos seus “truques de câmara” liberta-se perante elas, desde as almas dançantes referentes a um estado de espírito libertador até à fotografia vermelha que desperta repentinamente como sangue que remete os horrores de uma guerra que parece ter deixado um povo de certa forma fragilizado e afetado com os tais “estilhaços” e as casualidades bélicas. Até os mesmos cenários transmitem tal mutação como as diferentes faces de Guiné-Bissau, invocadas também elas nas personagens que raramente cruzam o olhar entre si, transmitindo a ideia de medo nas interações ou nos afetos humanos, tudo isto resumindo em desempenhos algo vazios e diálogos escassos mas prolongados através de pausas por via do silêncio em memória daquilo que não deve ser pronunciado, mas sim esquecido.
“A Batalha de Tabatô” é um filme que em termos estéticos e aparentes soa a vácuo, e quase nada invoca em termos emotivos, mas que nos deixa assombrados perante uma alma inerente após do seu vislumbre. Desde então apercebemo-nos que por vezes é por via do silêncio que somos remetidos à paz de espírito, contudo é através da música que consegue ser o nosso meio de libertação, uma liberdade que precisa ser alcançada prioritariamente por dentro de cada um de nós. Vencedor do Prémio Revelação do último Festival de Berlim, “A Batalha de Tabatô" é uma obra com alma.