Ele só quer 'brincar'. Quem? O Paracosmo!
Paracosmos! Palavra que nos chega embrulhada em estranheza, levando-nos a correr em direção aos dicionários após a sessão... Peço perdão quebra do mistério, mas trata-se da condição em que as crianças criam relações com a sua imaginação, vulgo "amigos imaginários". Portanto, paracosmo, no contexto do cinema de terror, é o diagnóstico precoce dado a qualquer “enfant” que entra em contacto com entidades paranormais, tinhosas ou tóxicas, muitas vezes negligenciadas pelos seus progenitores. "É apenas fruto da sua imaginação. Todos nós tivemos amigos imaginários. É perfeitamente normal", dirão uns aos outros com um sorriso condescendente enquanto observam os "pequeninos" a interagir com o invisível, mencionando a "moça do banheiro", ou o "amigo que morreu numa certa madrugada".
"Imaginary", esta nova produção da ordem de Jason Blum, hoje considerado uma espécie de Roger Corman, no qual o seu toque autoral parece transparecer até à cadeira de realização, muitas vezes ocupada por tecnicistas (como James Wan ou David Gordon Green), ou pela maioria de meros anónimos, como é o caso de Jeff Wadlow (realizador que tem no currículo um slasher genérico - "Cry_Wolf" - com Jon Bon Jovi como professor universitário), é uma narrativa recalcada desse mesmo mal, um trauma de uma criança que "conhece" um companheiro de brincadeiras de outras imaginações / dimensões. O resultado é o esperado, tal que não é preciso somar complexidades para prever aonde o recreio nos levará. Tudo é exposto em lugares-comuns, algorítmicos (como ‘agora’ estamos a designar frequentemente), que nos confrontam com o previsível, povoados por personagens da mesma matéria, papel reciclado e pouco cuidado. Ainda podemos argumentar que ao seu terceiro ato é exibido uma disposição estética por vezes agradável ao olhar (mas de imaginação igualmente tão devedora), com intensa aspiração a um cinema de género com alcance para maiores idades. Aliás, é o efeito "Gremlins", negro, infanto-juvenil, e por vezes delirante, só que a 'coisa' tem propensão a ser uma esquizofrenia de todo o tamanho, com ursos de peluche psicóticos, pesadelos à moda de Elm Street e uma inspiração assumida em "Poltergeist" de Tobe Hooper, hinos e canções que aqui ressoam como fragmentos desencantados.
Onde "Imaginary" triunfa, ainda que em pequenez, é na revelação da palavra "paracosmos", despertando-nos curiosidade e empurrando-nos de bruços para o dicionário mais próximo... ops, queria dizer, Wikipédias e plataformas virtuais. Pois é, velhos hábitos que demoram a morrer, assim como os clichés mal-emaranhados desta "imaginação limitada".