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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

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Chris Rock contra Jigsaw, sem risos e com o sangue do costume

Hugo Gomes, 13.05.21

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Com um total de seis sequelas e um "spin-off", "Saw" foi um dos impulsionadores do terror gore moderno... e também um dos seus piores inimigos.

Estreado com alguma discrição em 2004, mas motivando uma atenção de culto vindo de fãs do hardcore, o thriller sangrento dirigido pelo desconhecido (na altura) James Wan e com guião de Leigh Whannell (que mais tarde seguiria em aventuras a solo em outros cultos como “Upgrade” e The Invisible Man) reciclou a tendência dos serial-killers moralistas, das torturas de predestinação e ainda do twist final (confessamos, inesperado).

Os ingredientes fizeram o sucesso de “Saw” e deram origem a uma das sagas de terror mais lucrativas. Houve um filme por ano, esticando até à exaustão o enredo e quando a saga começou a exibir sinais de desgaste nas bilheteiras, a equipa criativa assumiu a "morte" do legado em 2010 com um capítulo sublinhado como derradeiro: "Saw 3D". Mas sete anos depois, ainda foi “ressuscitado” pelas mãos dos irmãos Spierig (“Daybreakers”, “Predestination”), mas "Jigsaw" (2017) não causou grande entusiasmo. Em 2021, chega "Spiral", uma nova vertente orquestrada por Darren Lynn Bousman, realizador dos filmes II ao IV. Distante do original, concentra-se em trazer um pouco desse mundo e colocá-lo ao serviço de supostas "reinvenções" narrativas. Só que fica pelas promessas.

Comecemos com a “surpresa”, a de ver o comediante Chris Rock num papel mais dramático, mas nem por isso menos inventivo. Num aperitivo de stand-up comedy, a personagem é introduzida a explicar a desbocada e hilariante teoria de “Forrest Gump” como “filme impossível” de ser produzido em tempos governados pelo politicamente correto, mas isto não é mais do que reciclar o modelo do universo noir: um polícia de carreira, frustrado, cínico e ferido. Este último “puro” do seu rebanho sujo é um peão central numa demanda de justiça social, que sabemos de caras vir de um "copycat" [imitador] do mítico Jigsaw. Só que a nova figura promete uma reforma drástica na estrutura policial, sentenciando cada agente à imagem dos seus “pecados”.

Ou seja, mesmo entrando por outras vias que, de certa forma, trazem frescura a uma saga que estava em estado "rigor mortis", este “Spiral” continua a presentear-nos com a pseudo-filosofia condescendente e um vigilantismo abusivo. Mudam-se cenários e tramas, mas é só “fogo de vista”, porque regressa praticamente aos mesmos lugares-comuns e tiques manientos, como a montagem frenética digna de videoclipe nos momentos mais mórbidos e a já conformada dependência do twist final.

Apesar de tudo, “Spiral” é, de longe, a derivação de "Saw" mais interessante e estruturada. Só que a concorrência era fraca...