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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

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Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Arranca o 9º Close-Up, contemplando o passado com mira para o futuro da cinefilia

Hugo Gomes, 11.10.24

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Celebramos a 9ª edição do Close-Up, desta vez com “películas” apontadas para o horizonte, o futuro para sermos precisos, ao encontro de uma Memória cinematográfica. Com arranque já no próximo dia 12 de Outubro, o Observatório de Cinema apresentará a sua mostra cinematográfica, uma compilação de filmes, temas e convidados com debate no presente para referir o futuro da cinefilia, com a Casa de Artes de Famalicão e o Teatro e o Teatro Narciso Ferreira como abrigos dessa resistência cultural. 

Como tem sido tradição, o Cinematograficamente Falando … conversou com o programador Vítor Ribeiro sobre o que nos espera este novo ano sob vista atenta do Close-Up.

Com a Infância enquanto tema anterior, seguimos em direção ao Futuro, às suas Memórias propriamente ditas. Se o Close-Up tivesse uma “bola de cristal” e tendo em conta esta programação, que Futuro terá o Cinema e a sua cinefilia?

Se a tarefa de antecipar o futuro não é coisa fácil, quando se trata do cinema a bola de cristal é ainda de maior dificuldade de acesso, atendendo às convulsões debitadas ao longo da sua história de mais de 100 anos. O que continuaremos a fazer é privilegiar a construção de programas que dialoguem com o público em espaço público, na promoção do cinema e dos seus autores. E a continuar a trabalhar, junto das gerações mais jovens, para proporcionar as condições para cimentar um território para os espectadores do futuro.

O Close-Up estende a sua proposta para além de uma mostra de filmes, temos cine-concertos, exposição (“Imagens da Nova Hollywood”) e outras atividades. O que nos pode dizer sobre elas, e a riqueza que assentam na programação do Close-Up.

O Close-up integra a programação de um Teatro Municipal, a Casa das Artes de Famalicão, espaço que privilegia a criação artísticas, nas diversas disciplinas: a música, o teatro, a dança e o cinema. Desde a sua primeira edição, que o programa do Close-up procurou articular o cinema com as outras artes, especialmente com a música, muitas vezes com a apresentação de cine-concertos em estreia, resultado de um processo de criação patrocinado pelo Teatro Municipal e os seus objectivos. 

Nesta edição,  o encontro das imagens com as outras linguagens terá: a apresentação em estreia do cine-concerto “O Cão Andaluz” de Luis Buñuel por Surma; a projecção de duas curtas de Charlie Chaplin, em formato lúdico, em concerto promenade, Orquestra da Costa Atlântica; o reencontro do piano de Joana Gama com as electrónicas de Luís Fernandes, fomentado pelas imagens de Eduardo Brito; e finalmente Glimmer, um espectáculo de cruzamento que extravasa a ideia de cine-concerto, ao juntar uma coreografia de Rui Horta à música dos Micro Audio Waves, com imagens a pontuar uma projecção do futuro.

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Sorcerer (William Friedkin, 1977)

Em “Histórias do Cinema”, temos um quarteto de filmes de William Friedkin, realizador incontornável que nos deixou ano passado. Poderia-me falar sobre esta seleção de filmes, da sua importância e que cenário pretende trazer sobre a memória do cineasta?

São quarto dos filmes mais importante de Friedkin e todos produzidos na década de 1970, período efervescente da Nova Hollywood, que aproveitou a crise e o consequente colapso dos estúdios de Hollywood, e as profundas transformações sociais e culturais da América, para fazer chegar ao poder de um conjunto de novos autores, que asseguraram uma notável marca autoral, que foi também um reflexo das turbulências políticas de uma época, como a guerra traumática do Vietname ou o escândalo Watergate. Estes quatro filmes – “The French Connection”, “The Exorcist”, “Sorcerer” e “Cruising” – demonstram a clara importância de Friedkin na época e na memória gerada nas décadas seguintes e serão para alguns espectadores uma porta de entrada para a obra do cineasta, enquanto outros os reencontrarão em sala, depois de talvez se terem cruzado com uma parte deles em dvd ou numa sessão televisiva.   

Gostaria que me falasse sobre os convidados, sobre a ternura de construir uma família “Close-Up” através de caras recorrentes nas várias edições, e obviamente sobre os “novos” oradores.

Os convidados do Close-up, que apresentam as sessões, são escolhidos em função da intensidade demonstrada com os filmes programados, quer seja através de um texto que escreveram sobre eles, ou com uma ligação mais evidente, se forem os seus realizadores. Mas também há outros critérios, como a afinidade entre obras artísticas produzidas por quem foi escolhido para comentar e o autor desses filmes, por exemplo. Em cada edição pretende-se uma renovação desses convidados, mas olhando para as edições anteriores já houve repetentes, nas áreas da crítica, da investigação, ou de outras áreas artísticas, que evidenciam afinidades que os vários programas aclaram. 

Na edição deste ano, temos várias novidades: o escritor Alexandre Almeida, que acompanhará a tradutora Alda Rodrigues na apresentação de “Saint Omer”; o crítico e programador João Antunes, na apresentação de “Marinheiro das Montanhas”; o programador João Palhares, que cultiva afinidades com a nossa reverência a William Friedkin; mas também escolhas menos óbvias, como a do argumentista e produtor Edgar Medina para comentar “The French Connection”.

Quanto à masterclass da dupla João Pedro Rodrigues e Guerra da Mata?

A partir da estreia do seu mais recente filme, “Onde Fica Esta Rua? Ou Sem Antes Nem Depois”, a dupla de cineastas desenhará um mapa de relações entre o seu trabalho e o movimento do cinema novo do cinema português, com o filme “Os Verdes Anos” de Paulo Rocha no centro.  Esta masterclass complementa a secção Fantasia Lusitana, que para lá de exibir “Onde Fica Esta Rua? Ou Sem Antes Nem Depois e “Os Verdes Anos”, atribuiu uma carta branca aos cineastas, que escolheram duas longas: “Dina e Django” (1981) de Solveig Nordlund e “As Ruínas no Interior” (1976) de José Sá Caetano.

Onde Fica Esta Rua? Ou Sem Antes Nem Depois (João Pedro Rodrigues & Guerra da Mata, 2022)

Voltando à pertinência do tema do Futuro, e em pergunta mais abstrata visto que o Close-Up lida com essa comunidade, questiono: podemos confiar na cinefilia para manter vivos e vitalícios eventos e propostas como estas?

Em parte, respondemos a esta questão na resposta à pergunta que abre esta entrevista. O Close-up, desde a sua génese que fez do cinema uma plataforma de diálogo com a comunidade, com as várias comunidades, desde a cinefilia devota do cinema de autor e da história do cinema, ao público escolar, mas também às famílias, e sempre atento na possibilidade de continuar a falar com públicos diversos, como o cinema sempre fez na sua história, como uma arte popular. Da nossa parte, esta possibilidade de colocar os filmes em diálogo uns com os outros, ao invés, por exemplo das competições, manter-se-á como o eixo principal das edições futuras, nesse diálogo continuado com o espectador, também privilegiado pela possibilidade de olhar para as mutações do cinema, da sua linguagem, e de o continuar a cruzar com as demais disciplinas.

Para o ano o Close-Up comemorá os seus 10 anos de existência, o que poderá “descortinar” sobre essa passagem e se está a pensar na próxima edição?

Sim, a meados de Outubro de 2025, o Close-up apresentará a sua 10.ª edição. Já temos uma ideia de mote orientador do programa, que se enreda com alguns dos anteriores, mas que será afinado pela pertinência dos autores e dos filmes que entendemos partilhar com os espectadores. Também já estão em marcha desafios para novas criações, à boleia do cinema, cruzamentos que no próximo futuro desenvolveremos e tornaremos públicos.

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Para mais informações sobre a programação, ver aqui

Falando com Nuno Beato, dos "Os Demónios do meu Avô" à arte de "vender" animação à portuguesa

Hugo Gomes, 16.10.23

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Os Demónios do Meu Avô (Nuno Beato, 2022)

Após um episódio de burnout no seu escritório despoletado pela notícia da morte do seu avô (o homem que a criou), a citadina Rosa (com voz de Victoria Guerra) revisita o lugar onde a viu nascer, Vale de Sarronco. O que acaba por encontrar estava longe do que havia imaginado: uma terra seca, abandonada à malapata e amaldiçoada com a embruxada aridez. À medida que Rosa reside no seu austero refúgio, tentando resgatar e restaurar o seu inicial brilho, vai descobrindo a verdadeira natureza do homem que tanto amor lhe trouxe à sua vida. "Os Demónios do Meu Avô" é uma animação negra, de uma rugosa ruralidade e de uma vincada portugalidade, que se destacou como a primeira longa-metragem em stop-motion portuguesa, uma ambiciosa produção da "Sardinha em Lata", estúdio e produtora lisboeta dirigido por Nuno Beato, que também assume o cargo de realizador da obra.

O Cinematograficamente Falando... conversou [em setembro de 2022, em vésperas da sua estreia no festival MoteLX] com o realizador e produtor sobre a obra, ao som dos Gaiteiros de Lisboa, e os desafios que enfrentou no panorama nacional, especialmente no que diz respeito ao mercado, bem como à promoção do cinema de animação português, quer seja a “vender filmes” ou simplesmente dar a conhecer a nossa animação a um público que por vezes "olvida" da sua existência.

Começo esta conversa, por isso mesmo, pelo início, a génese, quer do projeto, quer da sua dedicação à animação?

Devo dizer que comecei como animador e tornei-me, rapidamente, num produtor, começando por realizar projetos muito pequenos. Posso garantir que a minha carreira está totalmente dedicada à animação. A minha maneira de pensar e o meu método, sem dúvida, estão profundamente ligados e encaixam-se perfeitamente nesse universo.

Quanto aos “Os Demónios do meu Avô”, a ideia original partiu dos vídeos na internet que ocasionalmente assistimos ou que nos são partilhados. Certo dia, deparei-me com um daqueles que demonstrava alguém numa súbita ira num escritório, atirando e partindo o computador, e, por fim, arrancando a impressora. Não vou negar que me diverti imenso com isso, mas depois comecei a refletir: "O que está por trás deste ato? Como é que se chega a este ponto? Porque é que alguém, com as condições que nós possuímos, vivendo em países privilegiados, se chega a este extremo? O que se passa? Por que não contar a história de alguém que se encontra neste ponto e entender a razão da sua desesperante raiva?" Foi por isso que decidi que o filme deveria começar sempre com essa questão em mente.

Portanto, o filme começa exatamente por essa ideia e conceito, como se fosse um vídeo online, o próprio vídeo. A minha ideia inicial surgiu aí. Mais tarde, durante o meu mestrado na Lusófona [Universidade], pude desenvolvê-la. Num dos cursos, foi-nos atribuída a tarefa de elaborar um tratamento para uma longa-metragem, e foi nessa altura que escrevi a história, que, na verdade, já estava bastante diferente naquela altura. Depois, a história ficou na gaveta por algum tempo, até que um dia decidi revisitá-la, questionando-me: porque não dar vida a isto? E foi assim que cheguei a este ponto.

E como é que chegou à aventurosa decisão da longa-metragem, e além disso, a opção pela estética do filme? Refiro obviamente ao stop motion.

Na verdade, desde que comecei a trabalhar em animação e me tornei produtor, sempre tive a ambição de dar um passo adiante na indústria do cinema, especialmente na área de animação a nível internacional. Em Portugal, tradicionalmente focamo-nos na produção de curtas-metragens, em parte devido ao financiamento disponível, principalmente através do ICA (Instituto do Cinema e do Audiovisual). A animação concentrou-se, por conseguinte, em curtas-metragens, algum trabalho publicitário e projetos diversos, mas houve uma ausência relativa de produção comercial, entendendo como tal a produção de séries e longas-metragens que pudessem competir no mercado internacional.

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Os Demónios do Meu Avô (Nuno Beato, 2022)

Sempre vi-me não apenas como um realizador, mas também como um produtor de séries ou longas-metragens, e isso foi uma progressão natural na minha carreira. Há alguns anos, comecei a considerar essa possibilidade, e quando surgiu a oportunidade de um projeto, senti que era o momento certo para arriscar e mergulhar no mundo das longas-metragens.

Obviamente, isso aconteceu em parte devido a mudanças políticas, como o lançamento de um subsídio pelo ICA de um milhão de euros para longas-metragens, o que certamente deu um grande impulso ao nosso projeto e à realização dela. Tudo isto, em grande medida, resulta de uma estratégia política bem delineada. Quando existe uma estratégia e uma vontade [política], as ideias florescem, desenvolvem-se e ganham vida.

Quando estou a fazer um filme, costumo explorar técnicas diferentes e caminhos diversos. Para mim, a técnica deve sempre servir a narrativa e não o contrário. Procuro que a técnica seja uma aliada na forma de “contar a história”. O argumento passou por várias revisões, com a contribuição do Possidónio [Cachapa] e de outros argumentistas, incluindo a Cristina [Pinheiro], que é uma historiadora. Queria que a técnica usada complementasse a narrativa. A personagem principal viveu em dois mundos distintos, ou experimentou dois momentos da sua vida de maneiras muito diferentes. Tentei expressar isso esteticamente, inicialmente optando pelo 2D para a primeira parte do filme, porque Rosa está na cidade e afastada dos outros, do avô e até de si mesma. Usei cores mais frias e traços rígidos para transmitir essa distância. O espectador também sente essa distância no início do filme. 

Quando a história se desloca para o campo, a estética muda, tornando-se mais acolhedora. A presença da cerâmica do avô, inspirada nas peças de Barcelos e na obra de Rosa Ramalho, é evidente ao longo do filme. O nome da personagem, Rosa, também é uma homenagem a essa tradição cerâmica. O barro tem uma conotação importante no filme, e a água desempenha um papel fundamental na história, refletindo nas paisagens e na narrativa.

A textura e a estética do filme desempenham um papel essencial na narrativa, ajudando-nos a compreender o que está a ser contado. Esta abordagem resultou numa diferença marcante entre o stop motion e o 2D, e permitiu-nos destacar a natureza bruta do stop motion. Assim como as peças de Rosa Ramalho são um pouco rústicas, nunca quis que o stop motion fosse demasiado polido e perfeito. Optei por um estilo mais áspero, destacando as imperfeições naturais do stop motion.

Algo que, tematicamente, agradou-me o seu filme é o de fugir à lógica, diria, disnesca, da sagrada família. Ou seja, aqui, Rosa vai descobrir os “fantasmas” que o avô guardava secretamente, demonstrando uma faceta demasiada ambígua, ou cruel, vá. O que quero dizer é que o seu filme revela que não conhecemos verdadeiramente as pessoas que amamos, ou julgamos conhecer, uma ideia que vai contracorrente às produções animadas dirigidas ao público mais jovem.

Na verdade, sou um pouco contra o estereótipo maniqueísta do bem e do mal. Todos nós detemos um pouco de bondade e um pouco de maldade, e isso pode depender das fases da vida em que nos encontramos e dos momentos que atravessamos. Tento refletir isso nas minhas personagens. Não gosto de contar histórias com personagens estritamente boas ou más, porque acredito que a vida não é tão simplista. Como o nome do filme sugere - "Os Demónios do meu Avô" - os demônios que menciono frequentemente não são necessariamente demónios físicos, mas sim os obstáculos que criamos nas nossas mentes. O filme aborda a ideia de alimentarmos esses demónios internos e de como podemos mudar a partir de dentro, em vez de esperar que os outros mudem.

Além disso, o filme trata principalmente das relações humanas e de como podemos resolvê-las através de uma transformação interna. Tentei incorporar essas ideias na história de forma a que seja acessível a um público amplo. Evitei criar um filme demasiado alternativo, porque não era esse o meu objetivo. No entanto, também não busquei uma abordagem estritamente mainstream. Prefiro encontrar um meio termo, onde possa contar histórias de forma diferente, mas que ainda sejam atraentes para o público em geral. O público é essencial para mim. Sinto-me frustrado se não conseguir alcançar um público mais amplo e se a minha história ficar restrita a um nicho dentro do cinema.

No que diz respeito à classificação do filme, é um desafio definir com precisão onde ele se encaixa. A animação muitas vezes é associada ao público infantil, mas aqueles que trabalham no campo da animação procuram demonstrar que pode ser apreciada por todas as idades e que existem produções voltadas para diferentes públicos-alvos. Este filme, apesar da história mais adulta, foi concebido tendo em mente o mercado e o desejo de chegar a uma audiência diversificada. Dado que, em muitos países, incluindo Portugal, o mercado de animação não infantil é praticamente inexistente, tive o cuidado de incluir elementos que podem ser apreciados tanto por crianças como também por adultos. A narrativa tem camadas que permitem que as crianças a entendam de uma forma mais simples, enquanto os adultos podem extrair significados mais profundos. Acredito que é uma história que pode funcionar bem para toda a família.

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Algumas marionetas usadas no filme "Os Demónios do Meu Avô" (Nuno Beato, 2022)

Durante o decorrer do Festival Guiões, Carlos Saldanha, o realizador de animações como “Ice Age” e “Rio”, afirmou em masterclass, que o segredo para escrever uma boa animação infantil é de nunca escrevê-la exclusivamente para esse público.  

Talvez. Possivelmente já abordamos isso de forma bastante natural. Acredito que também existem diferenças nas abordagens entre a Europa e os Estados Unidos. Carlos Saldanha, embora seja brasileiro, trabalhou nos Estados Unidos durante um longo período. Para concluir, quando me refiro ao mercado americano, o Brasil pode ser uma boa adaptação. No entanto, quando atravessamos o Atlântico, percebemos que a maneira de encarar o cinema é um pouco diferente. Lá, estão mais alinhados com o estereótipo descrito do cinema americano, que é uma força impressionante. 

Aqui na Europa, mesmo assim, conseguimos buscar outras influências. Acredito que isso não deve ser encarado como uma barreira na forma de pensar. Ou seja, ainda não estamos condicionados a pensar em cinema de animação apenas para crianças. Essa mentalidade não está tão arraigada, até porque, ao longo dos anos, a produção de longas-metragens e até mesmo de curtas-metragens para crianças não foi muito explorada em Portugal. É mais o oposto; muitas vezes, precisamos recorrer a produções estrangeiras para atender às necessidades do público infantil.

Mas já que falamos desse mercado e com a intenção de lançar "Os Demónios do Meu Avô" no circuito comercial, e visto estar presente na programação do Motelx [em 2022], um festival dedicado ao género do terror, não tem receio dos medos que o mercado português possa suscitar. A questão que se coloca, ao entrar nesta vertente, não é apenas a perspetiva de realizador, mas também a de como se pode vender um filme como este?

Sem dúvida, é um risco. Apenas podemos nos dar ao luxo de assumir esses riscos graças ao financiamento público. Se dependêssemos de financiamento privado, seria muito difícil concretizar um projeto como este. No entanto, acredito que é para isso que serve o financiamento público: permitir que projetos inovadores vejam a luz do dia, projetos que talvez nunca fossem viáveis com financiamento privado. Claro, é essencial que esses projetos funcionem e conquistem o público.

Desafiar o público é sempre um caminho arriscado, porque as audiências estão muito acostumadas a filmes de animação cômicos, mesmo que não sejam necessariamente infantis. Filmes humorísticos costumam ter sucesso. Apresentar um filme de animação em Portugal, no mercado local, que não se encaixe no estereótipo ao qual o público está acostumado, é um desafio significativo. O receio de não conseguir atrair o público é real, especialmente quando se trata de um produto que não se enquadra na norma que estamos acostumados a ver. No entanto, a história foi concebida de forma a ser acessível ao público, embora desafie de alguma forma. Acredito que ela tem um lado original que, se as pessoas a assistirem, poderá ser apreciado.

Falo desta questão tendo como exemplo "Ma Vie de Courgette" de Claude Barras, que, para além da partilha do estilo de stop motion, apresenta uma história adulta que não conseguiu ter expressão no nosso mercado. 

É muito bom esse filme. Mas é verdade que a nível internacional acabou por ter bons resultados.

Isto pode ser uma questão óbvia, mas tem aspirações internacionais com o seu filme?

Sem dúvida, é importante pensar no cinema em Portugal a um nível internacional. Embora o mercado português seja relevante e interessante para mim, um filme com um orçamento de 3 milhões de dólares não pode ser pensado apenas com o objetivo de ter sucesso em Portugal, na Península Ibérica ou na Rússia. Precisamos considerar um filme que funcione a nível internacional. Se eu optasse por fazer um filme que seguisse a fórmula da Disney, não estaria competindo em igualdade de condições com uma empresa que é muito experiente nesse tipo de produção. Além disso, comparando um orçamento de 3 milhões com um orçamento de 100 a 200 milhões, seria impossível alcançar os mesmos resultados.

A única maneira de competir internacionalmente é com um produto que se destaque pela sua singularidade. Pode ser um produto que tenha características portuguesas, mas que seja contado de uma maneira que tente alcançar um público amplo, não se limitando a um público intelectual, por exemplo. Acredito que este é o caminho viável para Portugal no contexto do cinema internacional. Se conseguirmos obter reconhecimento internacional, isso acabará por beneficiar Portugal. No entanto, não podemos conceber o produto apenas para o mercado português. É essencial pensar em termos internacionais ao desenvolver um produto, seja um filme, uma série ou, neste caso, "Os Demónios do meu Avô". O objetivo deve ser criar algo que funcione em escala global. Claro, há considerações a fazer para entrar em mercados públicos, como a necessidade de garantir que o filme tenha um apelo mais amplo, sem ser catalogado apenas como um filme para adultos. Isso requer atenção cuidadosa no roteiro e na realização do filme.

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Nuno Beato / Foto.: Femma / Philippe Lebruman

Fica a pergunta da praxe para animações stop motion, fale-nos do processo e do tempo do processo [risos]?

Tivemos um ano de filmagens. Durante esse período, estávamos trabalhando simultaneamente com stop motion e 3D, com a colaboração de uma equipa que incluía Portugal, França e Espanha. Na maior parte do tempo, tínhamos seis animadores a trabalhar. Cada animador, quando atingíamos um bom ritmo, conseguia uma média de, aproximadamente, 100 fotogramas por dia, o que equivale a cerca de 4 segundos de animação por dia, por animador. É apesar de tudo uma média muito produtiva.

Trabalhávamos com 12 sets montados simultaneamente, o que é um número considerável. Era um processo intenso, quase como filmar uma telenovela, com vários sets em funcionamento ao mesmo tempo. Foram dois anos de trabalho intenso, especialmente durante o último ano das filmagens. Tivemos uma equipa relativamente grande para os padrões portugueses, e contamos com a contribuição de algumas pessoas de fora, principalmente devido a coproduções. Em Portugal, não temos profissionais em número suficiente para atender a esse tipo de produção, pelo menos nas cenas que exigem um maior número de recursos.

Você mencionou que já produziu alguns filmes, em colaboração com José Miguel Ribeiro, e gostaria de saber como vê a animação em Portugal. Há nomes internacionalmente conhecidos, como Regina Pessoa, Abi Feijó, e Laura Gonçalves, que estão a conquistar reconhecimento no exterior. Por outro lado, parece haver um certo desprezo geral, especialmente na comunidade cinematográfica e na imprensa, em relação à animação portuguesa.

Acredito que a animação, assim como muitos outros setores no nosso país, frequentemente depende do reconhecimento internacional para ganhar destaque. Isso é algo comum em Portugal, não apenas na animação, mas em várias áreas. A questão que eu sinto que é mais premente é a necessidade de alcançar o público. Enquanto podemos ganhar prémios de "Melhor Filme" em festivais internacionais, e Portugal já conquistou vários prémios e fez um trabalho notável, especialmente em curtas-metragens, o verdadeiro desafio é chegar ao público em geral. Porquê? Porque, em grande parte, essa animação não é um produto comercial. Quando digo isto, não estou a falar da qualidade do produto em si, mas sim do facto de não ser um produto com um objetivo comercial, ou seja, um produto destinado a mercados de vendas.

Quando conseguirmos produzir produtos comerciais, as pessoas começarão a conhecer melhor a animação portuguesa. Penso que toda a gente conhece "Os Patinhos" [risos], que é uma animação portuguesa, ou reconhecer "A Ilha das Cores", e esses produtos que chegam à televisão e a públicos mais vastos contribuem para um maior reconhecimento e valorização. Uma vez que o público conhece e tem acesso, a animação portuguesa começa a ganhar mais valor.

O que falta, às vezes, é essa chegada ao público, que só é possível ao entrar no mercado comercial. Penso que é o que nos falta. Temos a capacidade, temos talento, temos estúdios (embora ainda em número limitado), temos formação. No entanto, o crescimento do mercado tem sido lento ao longo dos anos. Isso está relacionado com a vontade e o apoio, e mais uma vez, isso envolve a vontade política. Quando houver um compromisso e apoio direcionado para transformar a animação num setor industrial, tal como ocorreu na Irlanda, visando tornar-se um mercado exportador, acredito que a situação mudará. Precisamos mudar de paradigma e obter uma escala maior. É isso que nos falta.

Imagino o porquê de qualquer jovem ir para uma escola de cinema, tirar a licenciatura de animação e querer logo trabalhar fora, numa Pixar, por exemplo.

Neste momento, posso afirmar que em Portugal não temos espaço para acomodar todas as pessoas que estão a ser formadas na área. Muitos dos formados irão, sem dúvida, buscar oportunidades no mercado internacional. Isso não é necessariamente negativo, pois hoje em dia a abertura de fronteiras é simbiótica. Muitas dessas pessoas podem passar alguns anos no estrangeiro, adquirir experiência e, eventualmente, regressar com projetos e parcerias com produtores. Portanto, essa mobilidade não deve ser vista como nefasta.

No entanto, a continuidade na área é de facto um desafio, pois a animação é ainda um campo um pouco precário em Portugal. É uma luta constante para conseguirmos sustentar-nos nas artes, fazendo o que amamos, apesar das adversidades. 

Os Demónios do Meu Avô (Nuno Beato, 2022)

E é devido a essa abertura de fronteiras, que a nível internacional, existem cada vez mais filmes de animação.

O mercado da animação tem crescido. Este setor experimentou um crescimento notável com o advento das novas plataformas. Embora as salas de cinema tenham registado uma diminuição de público, a visualização de conteúdos animados aumentou significativamente. A forma de comercialização pode ter mudado, mas o consumo de produtos de animação continua a crescer, e isso é uma tendência crescente. 

Voltando ao holofote, ou a falta dele, na animação portuguesa. O Fernando Galrito [diretor artístico e programador] costumava dizer que, durante o Festival Monstra [o qual dirige e programa], uma parte significativa da imprensa a negligenciava. Parecia que ninguém se importava com isso. E que também os críticos de cinema não têm conhecimento da animação portuguesa e, na verdade, não estão interessados, conforme ele constantemente mencionava. Se o cinema português já é considerado um nicho, a animação é ainda mais marginalizada...

Lá está, isto vai ao encontro do mesmo. Enquanto na imagem real os atores são conhecidos, aparecem na televisão, nas telenovelas, e por isso existe um mercado paralelo - existe o cinema e existe o mercado industrial - na animação, não. Portanto, nós não temos o outro lado. E essa distância para com o público não ajuda. 

Ter atores conhecidos, como Nuno Lopes e Victoria Guerra, associados aos filmes de animação é algo que já vimos noutros contextos e que ajuda a familiarizar o público. Isso, por si só, é uma porta de entrada para chegar ao público. Claro, sei que, mesmo assim, o público pode estar um pouco distante do cinema português, mas, pelo menos, essas associações ajudam a atrair a atenção da imprensa e outros públicos. Essas estratégias são muito úteis. Na animação, infelizmente, não temos essa tradição e é muitas vezes considerada um nicho.

Não é só em Portugal, mas também a nível internacional a animação acaba por ter um peso menor na imprensa em comparação com a indústria do cinema real. Isso é uma realidade.

 

O filme será exibido no 8º episódio do Close-Up: Observatório do Cinema de Famalicão, ver programação aqui

Cresce e aparece! Close-Up recorda infâncias e adolescências na sua 8ª edição

Hugo Gomes, 12.10.23

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O tema pode ser "Infância e Adolescência", mas, ao contrário do que indica, o Close-Up está bem "crescido" nesta 8ª edição. A decorrer de 14 a 21 de outubro na Casa de Artes de Famalicão, o Observatório de Cinema apresenta-nos mais uma galeria cinematográfica que orbita em torno desse território familiar, expandindo-se para eventos e diálogos, novamente pontuados com convidados de honra para enriquecer as sessões, concertos, leituras e sobretudo, amor pelas imagens, digamos, e à boa maneira, um amor bem "adolescente". Sobre a programação, ninguém melhor do que o programador, Vítor Ribeiro, para nos falar dela. Através deste convite do Cinematograficamente Falando ... chega-nos um teaser para este tão esperado "coming-of-age".

Gosto de pensar no Close-Up como algo animado, com vida própria, aproveitando os seus temas, títulos digamos assim, que fortalecem essa imaginada existência. Depois da viagem, o Observatório de Cinema assentou, constituiu família e agora recomeça sob o mote da Infância e Adolescência. Gostaria que me falasse do tema e de que forma enquadra-se na mostra deste anos, e já agora, sem querer revelar os ‘segredos’, como funciona a escolha destes temas, se esta narrativa é só da minha parte ou existe mesmo intenção de dar vida própria ao Close-Up?

Sim, a tua abordagem é correcta: há uma tendência dos motes se entrelaçarem com os anteriores, como se fossem sequelas de um filme que começamos a rodar em Outubro de 2016. O tema Infância e Juventude esteve no Close-up desde a primeira edição, inicialmente como secção. O cinema ao longo da sua história sempre integrou esta temática e permitiu apresentar olhares complexos sobre um dos períodos mais desafiantes da nossa existência, em que em simultâneo nos desafiamos na conquista da autonomia, enquanto assistimos à transformação do nosso corpo e das tensões que isso provoca com o contexto familiar e social. Curiosamente, nos últimos anos estrearam vários filmes de autores que trabalham esta temática, em que destacamos Jonas Carpignano, do qual exibiremos “A Chiara, o que permite uma boa mescla com filmes de autores importantes da história do cinema que revelaram habilidades particulares a lidar com a infância e juventude, como Abbas Kiarostami ou Maurice Pialat.    

É difícil falar de Infância no Cinema sem sequer mencionar o trabalho de Abbas Kiarostami, evidentemente o santo padroeiro do “Close-Up”, na programação o escolhido para representar essa filmografia é “Onde Fica a Casa do Meu Amigo” (“Where Is the Friend’s House?”, 1987). Sabendo que Kiarostami tem vasta obra sobre infância, crescimentos e até mesmo escolaridades, como recaiu a escolha deste determinado filme?

Onde Fica a Casa do Meu Amigo” é um filme muito importante dentro deste tema e também quando se olha para a obra de Kiarostami. Por um lado, não é possível fazer uma genealogia de um cinema sobre a infância sem incluir este filme, sem pensarmos nesta criança, em Ahmed, e na sua jornada para cumprir a missão de devolver o caderno do amigo. Uma criança que conquista a autonomia a pulso, que percorre uma larga distância num território difícil, analogia também de um regime político opressivo, o do Irão. É também o filme que abre a Trilogia do Terramoto, que permitiu a Kiarostami começar a desenhar a estrada da sua filmografia com a descoberta do seu cinema na Europa, premiado com o Leopardo de Ouro em Locarno

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História Trágica com Final Feliz (Regina Pessoa, 2005)

Reparei que esta edição seja provavelmente das que menos acompanha a “espuma dos dias” em relação aos filmes, temos este ano uma programação que reúne, não só Kiarostami de ‘87, mas como também John Cassavetes, Glauber Rocha, Maurice Pialat e a obra-prima de Vittorio de Sica [“Ladri di Biciclette”].  

O programa do Close-up procura sempre o cruzamento entre cinema do presente e história do cinema, na concepção de que o desenho de uma programação pode acrescentar importância e singularidade a cada um desses filmes, que assim conversam uns com os outros. Se há algo que define o cinema é a sua capacidade de incutir memórias, de as transmitir entre gerações. Procuramos aproveitar um crescente e positivo movimento na distribuição, na disponibilidade de títulos da história do cinema com obras restauradas digitalizadas. E procuramos retirar peso à ideia de história do cinema, e fazê-la chegar aos vários públicos, incluindo a população escolar, na exibição de “Ladrões de Bicicletas”, que para além de se constituir como um objeto incontornável do neorrealismo, é também uma narrativa sem tempo, uma história universal, a relação entre um pai e um filho. Quando juntamos Cassavetes a Glauber Rocha, procuramos um diálogo possível, estabelecido numa barra temporal, mas também num discurso e num conjunto de ascendências comuns a estes dois cineastas. 

O que me pode dizer sobre os convidados deste ano, e do foco da animação portuguesa (especialmente a retrospectiva a Regina Pessoa) neste Close-Up.

Na secção Fantasia Lusitana procuramos distinguir um cineasta ou uma corrente singular do cinema português. Num ano em que se assinala o centenário da animação portuguesa, Regina Pessoa foi a escolha imediata para esta edição. O percurso premiadíssimo dos seus filmes não é suficiente para definir a importância de uma obra dentro do cinema de animação, que estabelecerá por certo uma influência nas próximas gerações. Regina Pessoa convoca para o seu trabalho um conjunto de temas, arriscaria obsessões, que a tornam uma artista única e que deve ser vista também fora dos festivais de animação e por vários públicos, incluindo o escolar e quem está a aprender a trabalhar com imagens, animadas ou outras. 

Este ano temos Paul Schrader e terror à portuguesa, mas em leitura. Pergunto desta forma, cinicamente ingênuo, o Cinema também se lê?

Os livros começaram a aparecer naturalmente no programa do Close-up, quando criamos a rubrica Café Kiarostami, que permite desenhar tangentes com a sala de cinema, através de outras disciplinas. Os livros sobre cinema são um contributo indispensável para uma relação privilegiada com o cinema, no âmbito da crítica ou da estética. Os exemplos desta edição ajudam a esclarecer as nossas motivações. O livro do Paul Schrader – “O Estilo Transcendental no Cinema”– auxilia a relação com um dos autores importantes do cinema americano, primeiro como guionista e cronistas dos anos setenta, para depois se impor como realizador, um autor que mantém a sua relevância no presente. O caso da edição de “O Quarto Perdido do Motelx", ajuda a descobrir filmes e autores do cinema português, com várias vozes que nos orientam nesse labirinto. 

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Where Is the Friend’s House? (Abbas Kiarostami, 1987)

40 Anos de Sétima Legião … Comemoração, ou urgência de reavivar a banda de sucesso, hoje, digamos, muito discreta?

Um dos destaques de cada edição do Close-up são os cruzamentos artísticos, principalmente entre cinema e música, que conduziu em anos anteriores a respostas a encomendas da Casa das Artes que resultaram em filmes-concerto em estreia por Sensible Soccers, Dead Combo, The Legendary Tigerman, Mão Morta ou Orquestra Jazz de Matosinhos. É uma forma, também, de dialogar com a história do cinema, que foi o que proporcionou esta relação com a Sétima Legião, com quem queríamos há muito colaborar. Esta apresentação da Sétima Legião abrirá com a música em diálogo com “Um Tesoiro” (1958), uma curta-metragem de António Campos, um autor com quem a Sétima Legião encontrou fortes afinidades temáticas neste trabalho conjunto. O concerto que se seguirá, celebrará de forma viva quarenta anos de canções, de uma das bandas que melhor preenche o património das nossas memórias.  

Tendo em conta o percurso do Close-Up, para o ano estará a viver os primeiros romances?

Daria um bom mote. Mas para o episódio 9 ainda não o definimos, até porque ainda estamos a pensar nas réplicas do episódio 8, três momentos de programação (Janeiro, Março e Maio) onde voltaremos ao tema Infância e Juventude, e às obras de John Cassavetes e Glauber Rocha. O mote de cada edição, além dessa preocupação de se relacionar com as edições anteriores, depende em grande medida dos filmes e dos autores que queremos mostrar e associar. Como um bom treinador, que define a sua equipa não tanto através da obsessão de cumprir uma táctica ou um sistema, mas antes na preocupação de colocar em campo os melhores jogadores.

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Ver toda a programação aqui

À 7ª edição, o Close-Up decide reunir a "Família". Arranca o Observatório de Cinema de Famalicão.

Hugo Gomes, 14.10.22

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Mamma Roma (Pier Paolo Pasolini, 1962)

Para muitos Cinema é somente ver “pictures on a screen”, parafraseando Hollywood, esse oásis do espectáculo, mas existem outros que deparam com estas imagens em grande ecrã em afetividades, emoções envolvidas e devolvidas para mais tarde serem partilhadas por quem compaixão nutre para com tais sensações e impressões. Chama-se cinefilia, o que não é menos que uma “Família”, improvisada, mas sustentada por essa paixão pela Sétima Arte. Família é também o novo estado do Close-Up, o Observatório de Cinema em Vila Nova de Famalicão (a decorrer na Casa de Artes a partir do dia 15 de outubro até 22 de outubro), a 7ª edição, ou como bem gostam de se apresentar, o 7º episódio desta iniciativa que tem magnetizando cinéfilos e cinefilias para a cidade.  

Como já é tradição, o primeiro dia será marcado pela espetacularidade envolvido em memórias de “fantasmas do Natal Passado”, neste novo episódio a tarefa cabe ao grupo musical Glockenwise (Nuno Rodrigues, Rafael Ferreira e Rui Fiúsa) para acompanhar “Melodie der Welt” (Walter Ruttmann, 1929), com isto esperando trazer até ao seu público toda a melodia que o Mundo contém. O Close-Up também nos convidará a regressar ao Gabinete do doutor Caligari (“Das Cabinet des Dr. Caligari”, Robert Wiene, 1920) através de um filme-concerto assinado por Haarvöl, e a fechar a edição com “Memorabilia”, de Jorge Quintela, desta feita com acompanhamento dos Miramar.  

A programação “passeará” por universos familiares da nossa cinefilia, de Paulo Rocha a Emir Kusturica, este primeiro representado pelo documentário de Samuel Barbosa [“A Távola de Rocha”] e o segundo pelo tão célebre “Black Cat, White Cat”, ou por Antonioni a Pasolini, bem representados com cópias restauradas na seção “Histórias de Cinema”, porém o grande destaque deste ano é o ciclo dedicada à documentarista Catarina Mourão, presente para conduzir uma masterclass, é uma oportunidade de conhecer e reconhecer a sua obra, uma reunião das suas primárias pegadas (“A Dama de Chandor”, 1998) ao seu mais recente trabalho (“Ana e Maurizio”, 2020).

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Vizinhos (Pedro Neves, 2022)

Sem esquecer da apresentação de dois livros sobre a nossa relação com o Cinema, seja pela sua História (“História do Cinema: Dos Primórdios ao Cinema Contemporâneo”, organizado pelo professor Nélson Araújo), seja pela sua pedagogia ("Hipótese de Cinema: Pequeno Tratado Sobre a Transmissão do Cinema dentro e fora da Escola” de Alain Bergala), e da estreia de “Vizinhos”, a nova curta-metragem de Pedro Neves (“Tarrafal”, “A Raposa da Deserta”), produzido pelo Teatro da Didascália e pela Red Desert, sobre a comunidade vivida no Edifício das Lameiras, a ser exibido na mesma sessão de “Black Cat, White Cat” de Emir Kusturica.

E é difícil o Close-Up falar sobre família e não demonstrar a sua. Como é habitual no Observatório de Cinema, todas as sessões são comentadas por diversos convidados, desde jornalistas a críticos, artistas e intelectuais, todos unidos para uma só tradição - celebrar o Cinema enquanto Família que somos.

Toda a programação poderá ser consultada aqui.

Na 6ª edição do Close-Up, a Comunidade é o que mais importa!

Hugo Gomes, 14.10.21

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As Tears Go By (Wong Kar-Wai, 1988)

Aquilo que poderia soar a um clube de cinéfilos depressa se transformou num dos mais ascendentes eventos culturais e cinematográficos do país: Close-Up: Observatório de Cinema, uma iniciativa da Casa de Artes de Famalicão, chega à sexta edição, com uma programação fiel à sua génese e igualmente com mais vitalidade.

São filmes, convidados, conversas e eventuais tertúlias pós-projeções: o programador Vítor Ribeiro convidou-me a conhecer as surpresas e ambições de mais uma colheita cinematográfica, com destaque para o cinema de Basil da Cunha (O Fim do Mundo”, “Até Ver a Luz”) e em dois pólos do cinema asiático, Wong Kar Wai (Hong Kong) e Hong Sang Soo (Coreia do Sul).

O Close-Up arranca a 16 de outubro (sábado) com um filme-concerto dos Sensible Soccers através de dois filmes de Manoel de Oliveira (“Douro Faina Fluvial” e “O Pintor e a Cidade”), e o adeus será com “Metropolis”, o grande clássico de Fritz Lang, acompanhado pelo pianista Filipe Raposo e a Orquestra Sinfónica Portuguesa.

Chegamos a uma 6ª edição de Close-Up, aquilo que poderíamos definir como um espaço cinematográfico e cultural. A primeira questão prende-se na própria formalização e idealização do Close-Up, o que o separa de um festival de cinema, por exemplo?

O Close-up é uma programação da Casa das Artes, o Teatro Municipal de Famalicão. É um Observatório de Cinema instalado no Teatro, que apesar de apresentar um momento intenso de propostas [em Outubro], permanece na agenda da Casa das Artes durante todo o ano, o que fortalece a sua ligação à comunidade, com os vários públicos. Por exemplo, com a comunidade escolar, com quem estabelece um diálogo estreito e permanente. Organizado em panoramas, que articula produção do presente e história do cinema, também privilegia um programa orientado por um mote, com várias paisagens, o dar a ver.

A primeira sessão deste Close-Up é o filme de Philipp Hartmann – “66 Cinemas” – que se centra na viagem de um cineasta por 66 cinemas por toda a Alemanha para mostrar e debater sobre o seu mais recente filme. Pondo as coisas desta maneira e seguindo a trajetória imaginária do filme, como vê a importância de uma iniciativa do Close-Up ou do Cineclube de Joane [um dos apoios] para existência do espaço cinematográfico fora das grandes metrópoles?

O "66 Cinemas" é um ótimo filme para discutir as comunidades e os fluxos de memórias que as salas de cinema podem gerar: encontramos salas que preservam uma solenidade, em extensas plateias sob balcões, com poltronas de veludo, candeeiros de lustre e cortinas que ocultam o ecrã, ou régies, já com projetores de digital instalados, pois as cópias em película desapareceram do circuito de distribuição. Em que se acumula "memorabilia", matéria em tempo de digital, como projetores de película, bobines, cartazes, livros, catálogos de festivais, cassetes VHS. O que procuramos em Famalicão, a partir da Casa das Artes, é constituir um conjunto de propostas ecléticas, que tratam o cinema com a mesma elevação das outras artes, em que a proposta pode ser erudita, com marca autoral, mas também lúdica ou popular – algo intrínseco ao cinema e à sua história, com a condição de que o centro da proposta seja o cinema e não o seu inverso. O espectador de Famalicão, no que depender do nosso trabalho, tem acesso às mais diversas propostas, como uma boa dieta do que poderia encontrar nos centros urbanos de Lisboa e Porto. Esta pandemia agravou um panorama já deficitário de distribuição de salas de exibição em espaço público de cinema, algo que as políticas públicas devem contrariar, na participação do cinema como uma arte transversal, com capacidade para dialogar com plateias muito distintas.

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Cristina Coelho e Hugo Gomes, na apresentação de "Les Miserables" de Ladj Ly, na ediçaõ de 2020 do Close-Up

No Close-Up, a maior parte das sessões são pontuadas por intervenções e apresentações de variados convidados (cineastas, críticos, jornalistas, artistas, investigadores, etc.). Com que parâmetros seleciona essas importantes partes do programa? O que define um “convidado Close-Up”?

O que se procurou com o destaque atribuído aos filmes comentados é a possibilidade de singularizar as sessões, de acrescentar algo ao visionamento, de intensificar relações com outros filmes do programa e com a memória do comentador e do espectador. Na escolha dos convidados-comentadores valorizamos a relação dessa pessoa com a obra, começando pela relação mais óbvia - do realizador com o seu filme -, em que se privilegiam convidados que escreveram sobre o filme e a obra do realizador, mas também procurando trazer para a apresentação das sessões artistas e investigadores de outras áreas artísticas e do conhecimento que desenham tangentes ao cinema.

Algo que se vem percebendo no Close-Up é que poderá servir como barómetro do melhor que é produzido, distribuído e visualizado num ano cinematográfico no nosso país. Como funciona essa seleção?

Desde a primeira edição que definimos um mote que percorre o programa. Mas não é esse mote que define a seleção e os panoramas, é mais o seu inverso. É como quem coleciona filmes e autores que quer mostrar e, a partir de determinada altura, esboça-se algo que agrega aquela seleção e que, queremos acreditar, valoriza os filmes e o seu visionamento naquele espaço de tempo. Nesta edição, o mote Comunidade surge reforçado pelo contexto da pandemia que afastou o público das salas de cinema. Sendo que os filmes que aqui juntamos procuram estabelecer esse diálogo a partir da comunidade de espectadores, num vaivém com um ecrã povoado pelas mais diversas comunidades, que são histórias do cinema, do nosso presente, mas também do movimento das coisas, outros tempos que o cinema permite imprimir num imaginário coletivo.

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66 Cinemas (Philipp Hartmann, 2016)

Um dos destaques deste ano é a dualidade de um conjunto de obras de Hong Sang-soo e Wong Kar Wai. No programa impresso encontramos um propósito, mas gostaria de saber pelas palavras do programador o que o levou a juntar dois artesãos das relações afetivas no grande ecrã de estirpes e nacionalidades diferentes.

Na secção Histórias do Cinema procuramos não só mostrar um conjunto de filmes de um autor, mas também colocar em diálogo dois ou mais cineastas, sendo que, curiosamente, a primeira edição também veio de terras asiáticas, com a partilha de mundos, de temas, das famílias e dos lugares de Yasujiro Ozu e Isao Takahata. Nesta edição, ao longo do processo de inventariar possibilidades, apareceram muitas vezes os nomes de Wong Kar Wai e Hong Sang-soo. Se Kar Wai, através da reposição de cópias novas, intensificou a memória dos espectadores que fomos há mais de 20 anos, Sang-soo é um realizador prolífico que nos chegou tardiamente, mas que ocupou o seu lugar na comunidade cinéfila. E se muitas vezes as propostas de um e de outro parecem funcionar por oposição, a velocidade das imagens em movimento de Kar Wai versus um caráter mais contemplativo, também aos pares, de Sang-soo, talvez o coreano seja um autor do nosso tempo, com o cinema, a criação e as suas frustrações, como assunto, enquanto lá atrás Kar Wai usava a cultura popular para nos apontar a vertigem da viragem do milénio.

Como poderá crescer ainda mais o Close-Up? Que outros desafios terão num futuro próximo?

Para lá da exibição, dos encontros entre documentário e ficção, entre produção do presente e história do cinema, na procura de fazer emergir as potencialidades humanistas do cinema, há uma vertente que também pontuou as seis primeiras edições e que é inerente à condição de integrarmos um Teatro Municipal: o apoio à criação. Apresentámos filmes-concerto em estreia, respostas de encomendas da Casa das Artes, cruzamentos artísticos, a que responderam Sensible Soccers, Dead Combo, The Legendary Tigerman, Os Mão Morta, Orquestra Jazz de Matosinhos, Black Bombaim e Luís Fernandes. Paralelamente, promovemos o apoio à produção de filmes de Mário Macedo, Tânia Dinis, Eduardo Brito ou Luís Azevedo, em formato de curta-metragem e associados a ciclos e cartas brancas com esses realizadores. 

Um desafio para edições futuras será intensificar esse apoio à criação, fazendo-a ter ainda mais peso no programa. Se os filmes-concerto relacionam história do cinema com novas criações, obras importantes que chegam a outros espectadores transportados por outras bandas sonoras, há outra ambição, também relacionada com o património do cinema, que é a de proporcionar panoramas de obras de realizadores importantes, mas que não obtiveram distribuição, que foram pouco mostrados em Portugal, para lá de exibições na Cinemateca Portuguesa e que passará, também, por concertar parcerias com outras estruturas de programação.

O Desejo mata, destrói e corrompe-nos ...

Hugo Gomes, 11.10.20

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Neste novo “choque” com “L’Âge d’Or” (“A Idade de Ouro”) de Luis Buñuel apercebi - possivelmente influenciado pela sonoridade da banda Black Bombaim e eletrónica de Luís Fernandes num cine-concerto na Casa de Artes de Famalicão (âmbito do Close-Up: Observatório de Cinema) - que o coração deste devaneio surrealista, dirão alguns, é o Desejo.

Mas antes de condensar tudo numa palavra cada vez mais comum e alicerçada aos mais diferentes campos, saliento que este desejo é particular … é um desejo que nos faz salivar pela destruição das ‘coisas’ ao nosso redor que dão origem à nossa índole. O pretexto de um amor platónico, magnético e insaciável de dois amantes que antes disso chafurdavam na lama onde quatro entidades papais (possivelmente a equivalência somada dos quatro cavaleiros do Apocalipse) permaneciam no seu descanso eterno. Aí, perante a violência a seres animalescos, nasceria uma “civilização” sobre o signo apaziguador dessa natureza apelativa ao fim de tudo alguma vez criado - ao armagedão.

O reencontro dos “apaixonados” complementa-se com um inevitável senso de mutilação, suicídio e autodestruição quer do corpo carnal, quer do espírito. “A Idade de Ouro” resgata o desejo dos confins infernais o qual a Religião o aprisiona, para depois servir de olhar inquisidor a essas mesmas “morais” doutrinadas. Porém, o desejo, novamente ele, emancipado torna-se num vetor de pulsão e impulsão, a entropia em todo este universo sem o seu devido nexo. E a partir do Desejo que nasce essas novas … religiosidades e as sua respetivas pregações.

Há Tempo para degustar o Cinema! Arranca o 4º Close-Up, Observatório de Cinema de Famalicão

Hugo Gomes, 10.10.19

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Les Yeux sans Visage (George Franju, 1960)

O Tempo destrói tudo, isso é mais que sabido, mas ele também constrói. Constrói uma perspetiva, uma noção e acima de tudo a História. Neste caso a História do Cinema, que é novamente revisitada no CLOSE-UP – Observatório de Cinema, neste seu quarto episódio, como é habitual, a ter lugar na Casa das Artes de Famalicão, entre os dias 12 a 19 de outubro.

Novamente, uma programação recheada de filmes, concertos, temáticas, round tables e muitos convidados naquela que já é a mais respeitada comunhão de cinefilia do país. E voltando ao Tempo, a História do Cinema que é constante revista, CLOSE-UP contará como prato principal dois acompanhamentos musicais a dois dos grandes clássicos do cinema russo; o sempre incontornável “Battleship Potemkin” / “O Couraçado Potemkin”, de Sergei Eisenstein, com a Orquestra de Jazz de Matosinhos a condizer, e o aclamado filme de Boris Barnet, “The House on Trubnaya Square” / “A Casa na Praça Trubnaya”, onde os Mão Morta assumem uma original banda-sonora. Já nas sessões especiais, a História do Cinema pelos olhos delirantes de Quentin Tarantino, “Once Upon a Time... in Hollywood”, e a antestreia da mais recente obra do filipino Brillante Mendoza, que volta a debruçar-se pela teias criminosas e marginais de Manila em “Alpha: The Right to Kill”.

A fortalecer a temática do Tempo, ainda temos o historial condensado num folhetim imagético em “Le livre d'image”, do sempre intemporal Jean-Luc Godard, ou do tempo enquanto dispositivo manipulável em “John McEnroe: O Domínio da Perfeição” / “L'empire de la perfection”, de Julien Faraut. A Lenda e o Contemporâneo do atual Cinema Francês, dois pontos de partida para uma das secções fundamentais desta anual mostra cinematográfica – Histórias de Cinema – que nos brinda com um Passeio pelo Cinema Francês com dois protagonistas: Agnès Varda e Jean-Luc Godard.

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Halito Azul (Rodrigo Areias, 2018)

Aí, para além dos filmes da cineasta que apaixonou gerações pela sua criatividade e dinamismo e o realizador que continua a fomentar cinefilias, passearemos por alguns dos clássicos ante-Nouvelle Vague de uma das cinematografias mais fortes a nível internacional. Será o brilhante “Les Yeux sans Visage”, de George Franju, ou a viagem pela metrópole americana em “Deux hommes dans Manhattan”, de Melville, ainda as histórias trágicas e tragicómicas de “Le Plaisir”, de Max Ophuls, e até mesmo um dos mais belos casamentos de imagem e música de “Ascenseur pour l'échafaud”, de Louis Malle, a fazer as delícias dos amantes de cinema? A resposta é sim.

Na também habitual Fantasia Lusitana, espaço dedicado aos ascendentes protagonistas do cinema português, conheceremos (ou revisitarmos) o trabalho de Eduardo Brito, realizador, argumentista e fotógrafo, descrito pelo seu olhar perfeccionista e dedicado aos enquadramentos. Aqui deparamos com uma seleção de curtas da sua autoria, incluindo a estreia de Úrsula, como também vídeos experimentais, videoclipes e ainda uma longa-metragem escrita pelo próprio com a realização de Rodrigo AreiasHálito Azul”.

O cinema terror também terá o seu tempo de antena, ao integrar o espaço de Cinema do Mundo, este ano centrado no género profundo (“Mandy”, “The Love Witch” e “It Comes at Night”, compõem o trio de sessões que explicita o terror e o medo na América). Além disso, o CLOSE-UP contará ainda com sessões dedicadas às escolas e de família, com as exibições de “Toy Story 4” e “The Lion King”, como ainda tempo exclusivo para o legado de João César Monteiro, onde serão mostradas algumas das suas curtas como ainda lidas os seus poemas. Para a cadência das suas palavras, Isaque Ferreira será o responsável pela leitura.

"Chegamos ao Lugar!" Arranca 3ª edição do Close-Up

Hugo Gomes, 12.10.18

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Florida Project (Sean Baker, 2017)

A memória levou-nos à viagem, e em consequência disso, guiou-nos ao Lugar. Mas qual lugar? O Cinema encaminha-nos para espaços, não-lugares, cenários, etapas que resumem a leitmotiv cénicos. Neste terceiro episódio de Close-up: Observatório de Cinema, prosseguimos na jornada de desestruturação do Cinema propriamente dito. De que matéria é feita? Para onde segue? Quais as suas convergências e divergências? Com o Lugar, tema desta nova edição, chegamos, não ao destino, mas possivelmente a uma nova partida.

A decorrer entre os dias 13 a 20 de outubro, Close-up tem convertido num seminal evento em aproximação daquilo que chamamos de ano cinematográfico em revista, sem com isso reduzi-lo a um catálogo de estreias recentes repostas, mas um núcleo de temáticas e capítulos no nosso encaminhar cinéfilo. Prova disso, é a abertura oficializada com a projeção de “Lobos”, o grande trabalho de Rino Lupo, realizador italiano que na sua passagem em Portugal inseriu todo um novo olhar cinematográfico. A sessão será acompanhada por Paulo Furtado, o Legendary Tigerman, uma autêntica ousadia em cruzar a História de um passado remoto com os acordes atualizados do músico. Como encerramento, outro clássico e cruzamento, “Sherlock Holmes Jr.”, o qual Buster Keaton irá adquirir novo fôlego ao som de Noiserv.

Neste terceiro tomo há espaço para novas rubricas, o Café Kiarostami será inaugurado, uma mesa-redonda onde convidados de diferentes sectores do Cinema (realizadores, investigadores e críticos) reunirão para debater sobre os variados cantos e recantos da Sétima Arte. Contudo, serão os filmes, as verdadeiras estrelas destes sete dias rodeados de Cinema e a sua respectiva vénia.

Este ano, alguns dos destaques evidentes será a apresentação de “Cabaret Maxime” pelo próprio realizador, Bruno De Almeida. Possivelmente o melhor exemplo de Lugar neste espaço, um filme em que o cineasta transforma uma Lisboa noturna e soturna em “nenhures”, um território imaginário e igualmente real. A guerra entre cabarés é só o pico do iceberg, que é constituído pelas reposições de “Isle of Dogs”, de Wes Anderson (novamente frisando o “não-lugar”, neste caso inserido num Japão neofeudal e industrial), “Ramiro” de Manuel Mozos, a Lisboa saudosista e melancolizada no qual é embebido o espírito do homónimo protagonista e um dos grandes filmes do ano - “Florida Project”, de Sean Baker - um oásis situado nas fronteiras da Disneyland. Todas as sessões contarão com participações de personalidades ligadas ao Cinema, que debaterão com o público, a questão de espaço e lugar na compostura cinematográfica.

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Sansho, The Bailiff (Kenji Mizoguchi, 1954)

Apesar dos lugares serem vários e indeterminados, existe um específico que promete ser paragem obrigatória neste evento – a América Latina. O Close-Up irá exibir um leque de filmes recentes das diversas cinematografias latino-americanas, passando pela esplendorosa escuridão das minas bolivianas de “Viejo Calavera”, de Kiro Russo, pelos paraísos perdidos das promessas nucleares em “La Obra del Siglo”, de Carlos Machado Quintela, e as fantasmagóricas selvas em busca de Vicuña Porto em “Zama”, a mais recente longa-metragem de Lucrecia Martel.

Mas a História (H grande aplica-se) é também ele um lugar de obrigatória paragem, dando continuação à rubrica, este ano Close-Up aprofunda no Japão assombrado de Kenji Mizoguchi, projetando quatro das suas principais obras (“Sansho, The Bailiff”, “The Crucified Lovers”, “Ugetsu” e “The Street of Shame”). A lição de História passará pelos influenciados, e precisamente os portugueses que espelharam esses signos mizoguchianos nas suas respectivas filmografias. Nesse leque poderemos contar com Pedro Costa (“O Sangue”), Paulo Rocha (“Mudar de Vida”) e João Pedro Rodrigues (com a curta documental, “Allegoria Della Prudenza'').

Já na secção Fantasia Lusitana, serão destacados Diogo Costa Amarante, vencedor do Urso de Ouro da Curta-Metragem no 67º Festival de Berlim e visto como um dos mais promissores nomes da cinematografia portuguesa, e Mário Macedo, jovem realizador que também tem feito um premiado e igualmente promissor percurso em festivais. Ambos realizadores serão frutos de retrospectiva (no caso de Macedo, haverá estreia absoluta de um novo trabalho). Como anexo deste espaço, Diogo Costa Amarante teve direito a Carta Branca e a sua escolha recaiu na obra de Agnès Varda, “Vagabond” (1985).

Close-Up ocorrerá, como é habitual, na Casa de Artes de Vila Nova de Famalicão. Por entre o Cinema e os debates, ainda haverá “lugar” para a Exposição Fotográfica e de Vídeo de Ana Cidade Guimarães e Virgílio Ferreira intitulado de A Natureza do Lugar e o Lugar da Natureza.

Viajamos para Famalicão! Arranca a 2ª edição do Close-Up, Observatório de Cinema

Hugo Gomes, 13.10.17

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"El espíritu de la colmena" (Victor Erice, 1973)

Numa viagem, no seu sentido mais poético e elusivo, o que menos importa é o destino. São os trilhos, essas veias sanguinárias que nos transportam para uma experiência à mercê da vivência. E são as experiências que vão este segundo episódio do CLOSE-UP – Observatório de Cinema de Vila Nova de FamalicãoDe 14 a 21 de outubro, a ocupar os mais diferentes espaços da Casa das Artes, e tendo como mira o sucesso da edição anterior, o CLOSE-UP apresentará mais de 40 sessões de cinema, workshops direcionados a escolas e famílias, uma produção própria (de Tânia Dinis) incluída no panorama no feminino de produção portuguesa, e a exposição fotográfica de André Príncipe (realizador de Campo de Flamingos, Sem Flamingos), intitulada de “O Perfume de Boi”, a ter lugar no foyer.

O primeiro dia será marcado pelo filme-concerto de “A Man with a Movie Camera”, de Dziga Vertov, devidamente sonorizado pelos Sensible Soccers (encomenda do CLOSE-UP). O gosto da melodia pop do grupo a tentar provar cadência para com uma das obras mais influentes da História do Cinema. Como qualquer viagem, digna do seu nome, o CLOSE-UP será dividido por diferentes etapas (secções) que nos acompanharão ao longo destes sete dias de pura reflexão cinematográfica. O Tempo de Viagem revela-nos uma metáfora sobre a maturação, o crescimento induzido por esses caminhos dados a lugares incertos. Andrei Tarkovsky é a “rock star” desta secção com “Nostalghia, a sua “aventura” em Itália. O existencialismo procurado por um poeta russo em terras toscanas e romanas funciona como um sacrifício que nos guia quase em modo retrospectivo e introspectivo ao cinema do seu cineasta. Wim Wenders é outro importante signo deste mesmo espaço, não fosse ele um dos grandes “caminhantes” do road movie.

Em “Fantasia Lusitana” esperam-nos quatro longas-metragens portuguesas em oposição a um programa de nove curtas, incluindo uma sessão dedicada a Tânia Ribeiro com a estreia de “Armindo e a Câmara Escura”. No lote nacional, destacamos principalmente as exibições da mais recente longa de Salomé Lamas, "El Dorado XXI", e de Luciana Fina, “O Terceiro Andar”. Vinda da nova vanguarda soviética, a cicerone Larisa Shepitko e Elem Klimov serão figuras relembradas nesta edição de Histórias de Cinema. Mas não serão as únicas. A partilhar o espaço está a dupla Peter Handke e Wim Wenders com “The Left-Handed Woman” e o sempre poético “The Wings of Desire”, bem como David Lynch, indiscutivelmente o realizador do ano, nem que seja pelo reavivar da série “Twin Peaks” que tanto deu que falar, no Observatório, representado pelo spin-off cinematográfico, “Fire Walk with Me”.

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Eldorado XXI (Salomé Lamas, 2016)

O resto da programação será constituído por sessões direcionadas para escolas e família, e ainda Infância & Juventude, que como o nome indica será um olhar coming-to-age; desse crescimento que por si deverá ser visto como uma viagem. E que melhor filme para transpor essas duas jornadas alusivamente interligadas que “American Honey” de Andrea Arnold? Claro que nem todas viagens são felizes e a juventude pode ser inconstante, inconsequente e até inconcebível, como o caso de “The Tribe”, de Myroslav Slaboshpytskyi, filme que, infelizmente, chegara demasiado tarde ao circuito comercial português, tendo em conta o seu historial de controversas passagens em festivais por esse Mundo fora. Nesta seção destacamos ainda o clássico de Victor Erice, “El espíritu de la colmena”.

A música e o cinema vão se fundir para criar um encerramento memorável, assim promete esta 2ª edição do CLOSE-UP, com três curtas de Reinaldo Ferreira, ou Repórter X + Dead Combo. A proposta parece indigesta, incompatível e sobretudo experimental, mas o cinema é um experimento que se transformou, como se pode verificar, na mais complexa das experiências. A viagem está marcada. 

Arranca o Close-Up, Observatório de Cinema em Vila Nova de Famalicão

Hugo Gomes, 16.10.16

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Steamboat Bill, Jr. (Charles Reisner & Buster Keaton, 1928)

Vila Nova de Famalicão será, durante os próximos quatro dias, o derradeiro Observatório de Cinema, o Close-Up, para ser mais exato. E é já a partir de amanhã (27 de outubro), que esta iniciativa projetada pelo Cineclube de Joane, arrancará com uma impressionante programação de filmes e eventos paralelos, que ligam o passado, presente e futuro do Cinema. Reflexões sobre a Sétima Arte, os primórdios em jeito de arqueologia, assim como os caminhos a seguir ou previsivelmente a instalar-se, muitos convidados e uma mostra selecionada de filmes, com principal ênfase às produções nacionais, dividido em oito sessões temáticas, preencherão a Casa das Artes da cidade.

Temos como principal destaque o ciclo “Noite e Nevoeiro – 70 anos de Imagens do Holocausto“, que tal como o título focará sobretudo no registo cinematográfico e documental dos horrores cometidos na Segunda Guerra Mundial. Inserido na sessão Paisagens Temáticas, neste espaço serão exibidos filmes, que vão desde o recente e premiado “Saul Fia”, de László Nemes, sobre um prisioneiro de Auschwitz que reencontra a sua Humanidade até ao mais novo trabalho de Sérgio Tréfaut, “Treblinka”, um testemunho materializado daqueles que partiram contra em comboios cujos destinos são impensáveis. Passando pelo biográfico “Hannah Arendt”, de Margarethe Von Trotta, sobre a mulher por detrás dos pensamentos da Banalidade do Mal, até chegar, por fim, ao documentário “The Decent One”, de Vanessa Lapa, que retrata a vida de Heinrich Himmler, o mentor da chamada “Solução Final”, o extermínio dos judeus. Elena Piatok, diretora do Judaica: Festival de Cinema e Cultura, e a jornalista e escritora Clara Ferreira Alves, serão as oradoras.

Em “Fantasia Lusitana “, espera-nos sete filmes que no seu todo formam um quadro, quer etnográfico, quer artístico de um país. É uma seleção de documentários nacionais sobre pessoas, animais, lugares e estados, escolhidos a dedo e interligados de alguma forma. Destaca-se as exibições do filme-testamento de Manoel de Oliveira, “Visita ou Memórias e Confissões”, seguido pela homenagem de João Botelho ao “mestre” em “O Cinema, Manoel de Oliveira e Eu”.

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Saul Fia (László Nemes, 2015)

Dois dos mais venerados autores japoneses, Yasujiro Ozu e Isao Takahata, serão analisados e reavaliados nesta edição de Histórias de Cinema. De um lado, o dramático e emocionalmente expoente Ozu, um realizador marcado pela sua maneira inconfundível de filmar, planificar e dirigir os seus atores sobre um conjunto de falsos raccords. E do outro “canto”, Takahata, um dos mestres da animação nipónica, que poderá não ter gozado da mesma aclamação que o seu colega Hayao Miyazaki desfrutou, mas que mesmo assim, se apresenta como o criador de algumas das mais emotivas obras da Ghibli Studios. Animação e ação real, duas dimensões entrepostas neste olhar pelo cinema japonês.

Um dos mais ascendentes cineastas brasileiros da atualidade será homenageado no Close-Up. Serão cinco, as obras exibidas nesta secção Cinema do Mundo, dedicada ao “outro Brasil” de Gabriel Mascaro. Nesta retrospetiva poderemos encontrar os muito aclamados “Ventos de Agosto”, um atípico romance de verão, e o recente Boi Neon, que nos leva ao outro lado dos rodeos brasileiros sob uma confrontação com a própria ode da masculinidade.

O resto da programação será constituída por sessões direcionadas para escolas, com foco principal no tema da juventude. Vale a pena salientar que a primeira longa-metragem de Andrei Tarkovsky, "Ivan 's Childhood”, encontra-se integrada no programa. Para além disso, está agendado uma Oficina de Animação dedicada aos mais novos. Close-Up ainda exibirá uma sessão especial de O Ornitólogo”, a quinta longa de João Pedro Rodrigues que remete o espectador a uma viagem esotérica de um observador de pássaros, perdido nas encostas do Douro.

Por fim, como sessão de abertura, temos um “double bill” constituído pelo filme-concerto “Steamboat Bill, Jr”., um dos grandes clássicos do “rei do slapstickBuster Keaton, será transformado sob a vertente musical de Bruno Pernadas. E “Cinco para Kiarostami”, o filme-homenagem a Abbas Kiarostami, o cineasta iraniano que infelizmente nos deixou recentemente, uma produção da Casa das Artes e do Cineclube de Joane, com direção de Vítor Ribeiro e Mário Macedo.