"You gave me peace. You gave me what the world can't give. Mercy. Love. Joy. All else is cloud. Mist. Be with me. Always."
Há quatro tipos de realizadores a exercerem a sua função como tal no Cinema: o ilustrador ou “tarefeiro” [termo mais pejorativo, é verdade], o mero profissional no ramo dedicado a cumprir as ideias dos outros e os propósitos dos produtores; o megalómano, um pouco como as convenções formadas por Griffith que tornaram a cadeira de realizador em algo absoluto, competente para os seus propósitos como também dos seus superiores hierárquicos; os autores versáteis de ideias variadas que submetem a um gosto autoral criativo e sempre emergente; e por fim os conformados, os autores formalistas, preso a uma marca e guiados em redor de uma solitária criativa.
Nesses termos, Terrence Malick é um transcendente, tendo iniciado a sua carreira no terceiro tópico e atravessando atualmente no último, um realizador condenado a olhar constantemente ao seu próprio umbigo e a utilizar o mesmo “truque de magia” vezes sem conta, a fim de causar espanto. O que não apercebe é que o seu público poderá eventualmente cansar desta sua egotrip. Na mesma demanda de cineastas barricados no seu artesanato, surge nesta discussão Yasujiro Ozu, o nipónico “parte-corações” que nos presenteou verdadeiras obras-primas como “Tokyo Story” e “Equinox Flor”, foi também acusado de apresentar-se constantemente num registo fechado e formalmente identificável à sua pessoa nas suas últimas estâncias. Contudo, ao contrário deste Malick crente, as relações entre as personagens e a afeição destas para com a intriga encontram-se presentes e para além de gradualmente desafiadas e reinventadas.
Em “Knights of Cups”, a demanda é outra. O cunho de Malick é visível - a jornada esotérica soa como um mero caso de estética - o qual o nosso senhor repete a sua forma, assim como na invocação dos seus temas intrínsecos, entre os quais a sucessão patriarcal [“Tree of Life”] e uma busca por um amor absoluto, confinado à inexistência [“To the Wonder”]. Neste ciclo "malickiano" encaramos o sonâmbulo, cuja vida é escrita como uma premonição derivada das lidas cartas de tarot, e é através dessa vidência, que Rick (Christian Bale) vagueia num prolongado e interminável sonho. Esse mesmo que arranca com a morte de um ente querido, passando pela obsessão de um pai para que os seus herdeiros sigam um legado anteriormente construído. Morte e herança de braços dados tornam o nosso protagonista numa incompleta marioneta que se aventura na boémia do dia e na luxúria da noite para compensar o seu incógnito signo (o filme é repartido em capítulos consoante as místicas).
Neste caso até poderei anexar o nosso Malick àquela expressão “que tão bem eu filmo”. “Knights of Cups”, tal como os anteriores filmes do cineasta, é recorrente a montagens rápidas e instáveis, com personagens erguidas pelas presenças físicas dos atores e pelas divagações filosóficas sussurrantes em voz off, os diálogos são uma raridade e quando acontecem alienam a sua estabelecida narrativa. Os dramas de Rick, os seus dotes enquanto mulherengo são encurtados com as, admitimos, belíssimas imagens de Natureza ou da beleza encontrada em “cenários de cartão” ou edifícios imaculados pelo tempo e pelo espaço (quase como um Andy Warhol sem expressionismo).
Mas o descaramento é a não-reinvenção de Malick, um homem preso à sua “ilha” que concebe um produto visualmente belo, mas vazio, atropelando esse suposto trabalho de construção com citações pseudo-filosóficas e uma burla ingressada num ciclo rotineiro. A certa altura, numa breve passagem, Joseph (Brian Dennehy), pai de Rick, vagueia de forma apática pelos cenários emanados por Malick até chegar a um palco de teatro, observado por uma multidão indiferente. Essa sequência transmite a verdadeira essência de “Knights of Cups”, um ensaio pouco expressivo, exposto e rasurado de forma a soar na sétima maravilha do Cinema Contemporâneo. Infelizmente, tal como é dito a determinada altura “Se o nariz de Cleópatra fosse menor, o Mundo mudaria”, neste caso, se o ego de Terrence Malick fosse menor, até poderíamos ter um grande filme. Ao invés disso … postais e maliquices!