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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

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"Yupumá", atrás de um movimento onde a "alegria é a resistência": conversa com Verónica Castro e Kawá Huni Kuin

Hugo Gomes, 17.07.24

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Yupumá (2024)

Era uma vez uma antropóloga na terra dos Huni Kuin, seguindo os preceitos estabelecidos pela antropologia de campo. No entanto, Verónica Castro tinha ambições diferentes; com uma câmara na mão, decidiu realizar um filme. O que poderia ter sido apenas mais um retrato do povo indígena amazónico revelou-se, nas suas palavras, um movimento. Tudo começou com a abordagem de Kawá, um aprendiz de pajé (curandeiro da aldeia), que lhe confidenciou um sonho que teve na noite anterior: viajar e conhecer a Europa. Esse sonho rapidamente se transformou num pedido - "Leva-me para a Europa".

Para isso, Kawá aprendeu outra língua, o inglês, para poder comunicar e transmitir aos europeus os costumes e a filosofia de vida dos Huni Kuin, denominada Yupumá, que significa o ato ou momento de fazer algo pela primeira vez. Hoje, após visitarem vários países, a dupla formada por Verónica e Kawá chega a Portugal. Com eles, além do filme cujo título é inspirado no conceito a ser difundido e da experiência do intercâmbio cultural, trazem um sonho de unir povos através de uma ideia.

"A alegria é uma resistência", perpetua Verónica, enquanto recebe o Cinematograficamente Falando... para uma conversa que nos transporta especialmente para aquela região do Acre brasileiro, às margens do rio Jordão, com a sua forma de ser em formato jiboia e a cultura representada por Kawá, que tem tantas histórias e impressões para partilhar.

O filme Yupumá” chega às nossas salas de cinema sob a produção Cedro Plátano. 

É através do rio que chegamos ao seu filme, e a sua “presença” ao longo desta. Gostaria que me falasse sobre a importância do elemento no seu filme, e se a quase onipresença é de algum significado aos Huni Kuin?

Verónica Castro: A água, como se pode imaginar, é muito importante. Existe uma interdependência nela. É a água que nasce, a que vem do rio, como também a água que vem do céu, ou seja, tudo o mesmo, só que em momentos diferentes. É muito importante para a comunidade e não poderia chegar ao Kawá sem o rio. Com o rio seco, seria impossível. O rio é essencial.

No rio temos a canoa que não é só para transporte, mas para muitas outras coisas. A canoa é usada por muitos para dormir, para cozinhar, as crianças brincam na canoa, também se lava a roupa, ou seja, a canoa é um espaço. Mas voltando à água, a sua fundamentalidade: serve para cozinhar, beber, lavar roupa, para os animais e para banho, especialmente na Amazónia, que devido às suas temperaturas uma pessoa toma três ou quatro banhos por dia, e mesmo quando está no duche, sua. Isto tudo para dar uma ideia da importância da água para tudo na vida, e para a comunidade do Kawá, ela liga e interliga tudo e todos, portanto, porque não ligar o filme a esse elemento.

Kawá Huni Kuin: O rio Jordão, na nossa língua Huni Kuin, chama-se “Renê Yurá”. Renê significa rio, Yurá é povo, ou seja, é o Rio do Povo.

Quando pensamos no rio, em cada trecho que divide as aldeias, é como se ele serpenteasse como uma jiboia. Assim, conforme se avança pelo rio Jordão, após meia hora de viagem de canoa, já se encontra uma aldeia. Ao subir pelo rio, após essa meia hora de viagem, já se vê outra aldeia. É aí que começa a divisão, com um igarapé – um rio muito pequeno – separando as aldeias. Mais adiante, outro igarapé faz o mesmo.

Dessa forma, as aldeias ficam divididas entre os igarapés.

Quer dizer que o rio assume-se como as fronteiras entre aldeias?

KHK: Exatamente! [aponta para o mapa e dedinha a zona do Acre] Depois de chegar a essa aldeia, ao continuar a subir mais à frente, há uma reserva que ainda não é considerada terra indígena, mas, após uma hora de viagem, entramos em terra indígena. A partir desse ponto, chegamos a outro rio. Dali para a frente, é terra indígena. As águas dividem cada aldeia, dando nomes às aldeias. Aqui é um igarapé, que é um pequeno rio. Assim, temos uma aldeia. Depois de passar por este igarapé, encontramos outra aldeia. Portanto, o rio é importante porque também serve como limite das aldeias, uma fronteira natural entre elas.

Quando se chega a uma aldeia e se quer passar para outra, é preciso atravessar o rio a pé. Ao atravessar o igarapé, já se chega a outra aldeia.

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Verónica Castro e Kawá na rodagem de "Yupumá" (2024) / Foto.: Cedro Plátano

Mas esse rio é inconstante, certo? Quer dizer, você o comparou a uma jiboia - bonita imagem -, quer dizer que essas “curvas e contracurvas” que o rio faz aí nesse mapa, pode alterar de um dia para o outro?

KHK: Hoje em dia, as coisas estão a mudar muito porque está a chover bastante e há muitas inundações. Quando alaga, o rio corre com muita força e derruba as árvores das margens, tornando o rio ainda mais diferente. Na época de Verão, o rio fica tão seco que nem uma canoa pode viajar. Por vezes, temos que andar a pé. No caso da canoa, apenas duas ou três pessoas podem ir para que a viagem seja rápida. Agora, se levarmos uma canoa com três famílias e crianças, é muito difícil. Demoramos quase três dias ou uma semana para chegar apenas à aldeia, porque é muito complicado e o rio seca muito nesse período. Quando enche, enche muito rapidamente e alaga completamente. O rio hoje está a sofrer este tipo de mudanças. Os nossos avós contam que o rio não era assim; era profundo tanto no tempo de verão quanto no tempo de inverno, durante a época de chuva. O rio era diferente, mas hoje está a mudar. Contudo, as voltas que faz, semelhantes a uma jiboia, são normais para o rio.

No cartaz do “Yupumá” [aponta para o poster do filme] representa-se a floresta, a terra, a água e a jiboia. Porquê a jiboia? Porque ela mora debaixo de um poço no rio Jordão e é muito grande. A jiboia também significa, para mim, que foi ela que nos ensinou a nossa geometria.

Mas acerca da decisão de incluir o rio como uma personagem central [voltando-se para Verônica Castro] …

VC: Essa decisão? Bom, quer dizer, é a vida na aldeia e também a vida na canoa. E também é uma vida em relação ao rio e para mim. Então, voltando ao mapa, quando mostrei que comecei, comecei no meu primeiro encontro com um aperto de mão. “Bem-vindo!” Oito dias na canoa e não havia nem perguntas, nem discussões, nem preparações; era algo que acontecia do nada, como se caíssemos de paraquedas.

Obviamente, essa experiência marcou-me por ser a minha primeira experiência com o rio e com as comunidades indígenas, porque estava nesta canoa com 15 pessoas.

Quinze pessoas!? De que tamanho eram essas canoas?

VC: Máximo tamanho o tamanho deste quarto [faz um gesto que especifica-se o redor da divisória]. Assim, só que mais fininha. Eu posso mostrar uma foto? Então, estava na canoa com 15 pessoas, uma família única e duas pessoas de outra etnia que chama-se Yawanawá e o condutor da canoa - um brasileiro que mora lá, da comunidade dos ribeirinhos - com a sua mulher e uma criança, também estava lá um outro antropólogo. Então, o que é que aprendi em oito dias na canoa? No segundo dia parei de perguntar quando chegaríamos, porque tinha percebido que o tempo não existia tal como conhecia. Depois do segundo dia, percebi que podia estar aqui para o resto da minha vida. Sim, com uma noção de tempo completamente dissolvida.

Eram aquelas atividades que mencionei há pouco que substituíram a noção do tempo. Era só navegar, e os pequenos momentos reforçaram a nossa relação com a natureza.

KHK: Quando viajamos, levamos a nossa comida dentro da canoa, cozinhamos enquanto navegamos ou então encostamos e preparamos a comida na praia. Fazemos pesca, recolhemos lenha e cozinhamos na praia. Por isso, a viagem demora muito, pois vamos fazendo essas paragens, mas depois continuamos a viagem tranquilamente.

VC: Mas não era só uma viagem de lazer. Estávamos a viajar com uma canoa alugada e o condutor queria levar-nos rapidamente, mas não podíamos ir contra a natureza. Aprendi muita coisa nesta viagem. Na minha primeira introdução, além da relação com a água e da perceção do tempo que se dissolve completamente, também aprendi como se organiza o espaço dentro da canoa. Percebi que era interessante estar dentro daquela canoa com duas etnias indígenas, o vizinho com quem eles coexistem, uma família ribeirinha, um brasileiro de 73 anos e um antropólogo que conhecia muito bem essas terras, tendo trabalhado lá por mais de 40 anos.

Foi um microcosmo de vida na Terra. Comecei a observar as relações entre as pessoas e como essas dinâmicas se manifestavam dentro da canoa. Coisas tão básicas como onde as pessoas se sentam, quem pode sentar-se à frente da canoa e quem vai conduzir.

Hierarquia?

VC: Não se tratava de hierarquia, mas de lugares. Sim, lugares e a maneira como os espaços são ocupados. Enfim, isso é outra história. Mas só para dizer que esta viagem de canoa revelou tantas, tantas possibilidades para eu desenvolver a minha pesquisa. Certamente, é por isso que o rio, a canoa e estas viagens são inextricáveis. Não se podem separar, pois são como um fio central que guia a narrativa.

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Poster de "Yupumá" (2024)

Sobre essa questão da jiboia ensinar geometria, o qual também está claro no filme, essa relação com os animais. Para a sua cultura [virando para Kawá], cada animal teve um papel importante na aprendizagem humana.

KHK: Os animais são os nossos principais mestres da floresta. Os nossos mais velhos e os pajés [curandeiros] sabem contar essas histórias como se fossem mitos. Mas não são mitos, são histórias reais que aconteceram com os animais, numa época em que eles se comportavam como seres humanos, falavam, comunicavam com os parentes, e continuam a comunicar até hoje.

Temos essa história, uma das maiores sabedorias que transmitimos até hoje, porque aprendemos com essa habilidade, com os animais, com a natureza. Por exemplo, temos uma história sobre como o ser humano aprendeu a caminhar com o papagaio. O ser humano caminha igual ao papagaio, devagar, passo a passo. Havia outro pássaro que queria nos ensinar a caminhar, mas o seu caminhar era como o de um sapo, que pula. Se caminhássemos assim, seria diferente. Mas o papagaio caminha colocando um pé à frente do outro, como o ser humano.

Então, recebemos o caminhar do papagaio. Quanto à barriga, foi a barriga do japó [espécie de ave] que nos foi dada. Por isso, temos a barriga aqui. Se tivéssemos recebido a barriga do papagaio, ela estaria no peito, pois a barriga do papagaio é no peito. Então, eles decidiram: “Ah, tu vais dar o teu caminhar e eu vou dar a minha barriga.” Isso é um exemplo, essa história continua.

Para cantar, por exemplo, nós seguimos a tradição até hoje. Para as crianças começarem a falar, temos uma medicina chamada Eva, que tem o mesmo nome de um pássaro que imita outros pássaros. Quando a criança começa a falar, damos banho com isso e passamos na língua. Os animais são muito significativos para nós. Os mais velhos que cantam muito, que detêm o conhecimento, são como os canários, os cantadores. Aprendemos a cantar com o pássaro cantador, aprendemos com a jiboia e com outros animais, como a paca.

Cada um desses animais nos ensinou algo útil que utilizamos até hoje. A aranha ensinou-nos tecelagem, introduzindo-nos ao algodão. A jiboia ensinou-nos geometria. Outro pássaro de bico comprido, que vive nos lagos e pesca, introduziu-nos uma medicina da mata. Quando tiramos essa erva, machucamos, fazemos um bolo, colocamos na água e o peixe começa a pular. Cada animal nos introduziu algo significativo que preservamos na nossa cultura até hoje, por isso a nossa relação com os animais é tão especial. 

Alguns animais não comemos porque nos são sagrados, como a jiboia. Também não comemos o pássaro cantador, pois o respeitamos. Não comemos a onça, porque ela também nos ensinou a cantar. Existem cantos de onça, e cada palavra que usamos nesses cantos é poderosa e sagrada. Por isso cantamos, para curar e para nos conectar com esses animais, na língua da natureza, em que o som vem de uma fonte central.

Na aldeia, quando acordamos de manhã, escutamos primeiro os “capelães” a cantar. Depois vêm os outros pássaros, alguns cantam prevendo a chuva. Toda a comunidade o escuta, sabemos que a chuva vem à tarde. Na manhã seguinte, escutamos outro pássaro a cantar, os filhos do sol, que nos indicam que o dia será solarengo. Isso nos anima a trabalhar.

Os pássaros comunicam connosco e são os nossos meteorologistas. Essa conexão com a natureza ainda existe hoje. A nossa cultura continua a mostrar que a conexão com os animais e a natureza é profunda.

E em relação à sua viagem na Europa, como vê essa relação com os animais? Sente que nós, “europeus”, escutamos e compreendemos os pássaros?

KHK: Aqui, se prestarmos atenção aos pássaros que querem comunicar, somos capazes de entender o que eles desejam transmitir. Na Grécia, vi muitos turistas a comer hambúrgueres ou pães, e os pássaros vinham todos nas suas direções. Para mim, aquilo significava que os pássaros precisavam de comida. Se continuarmos a pesquisar o que os pássaros querem comunicar, é possível reconectar-nos com eles, porque acredito que não prestamos atenção suficiente aos animais.

Nós não damos a devida atenção a eles, sejam pássaros, gatos, cães, lobos ou outros. Aqui, é provável que essa conexão tenha sido perdida. Mas, se realmente quisermos nos conectar com os animais, é possível. Quando estive na Irlanda, na floresta, escutei diferentes sons dos pássaros, percebi outra energia, outro espírito, uma outra conexão. As pessoas não se apercebem dessa necessidade de reconexão.

Estou a sentir e a ver que é um mundo diferente. Temos de prestar mais atenção ao que os animais nos estão a tentar dizer para podermos reencontrar essa ligação que tivemos no passado.

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Yupumá (2024)

O curioso é que no filme quase todos os animais surgem no ecrã ou estão mortos ou a ser pescados?

KHK: Na minha opinião, o valor dos animais não está a desaparecer; pelo contrário, estamos a exaltar cada vez mais o seu valor. Por exemplo, o papagaio oferece muito. É o espírito do papagaio que se manifesta, e acreditamos que ao consumir a memória do papagaio podemos melhorar a nossa habilidade linguística.

Escuta duas ou três vezes sem gravar. Então, entende-se a ciência que o papagaio nos dá. Se comermos o miolo e a carne do papagaio, que é escura como o feijão, isso fortalecerá o nosso sangue. Usamos as penas do papagaio para fazer brincos, cocares e também as guardamos para defumar crianças, protegendo-as. Cada pássaro e objeto dos animais têm um valor especial para nós.

Antigamente matávamos a jibóia, tirávamos a pele, usávamos os ossos e a gordura para tratar ferimentos e outras coisas. Hoje em dia, o meu pajé, que é o meu professor mais velho, ensinou-me que não devemos mais matar a jibóia. Apenas a seguramos, falamos com ela e deixamo-la ir. Nas outras aldeias, ainda matam a jibóia, mas cada animal que comemos tem o seu espírito, que precisa ser purificado para evitar doenças.

Para prevenir isso, utilizamos a ciência da floresta, as ervas medicinais. O pajé, que é o curandeiro, dá banhos nas crianças, e os pais são obrigados a batizá-las com medicinas para que recebam a energia da planta e cresçam saudáveis. Desde que a criança nasce, já começa a receber tratamentos com medicinas e banhos. Durante a gravidez, a mãe deve tomar muitos banhos de ervas e ouvir cantos para que a criança nasça forte.

Durante a gravidez da minha esposa, eu não posso matar certos animais. Se eu o fizer, pode causar problemas para mim ou para a minha família. Por isso, respeitamos os animais especialmente nesse período.

Toda a nossa tradição está interligada com a natureza, animais, plantas e cantos. Desde o nascimento de uma criança, tudo é feito de acordo com a nossa ciência original e as nossas tradições.

Esta exaltação dos animais reflete o profundo respeito que temos por eles, reconhecendo as suas contribuições e a sabedoria que nos transmitem. Cada animal desempenha um papel significativo na nossa cultura e na nossa compreensão do mundo. Ao valorizar estes papéis, fortalecemos a nossa ligação com a natureza e com os ensinamentos que ela nos oferece.

VC: O que quis mostrar no filme não foi simplesmente que os Huni Kuin são caçadores de animais. Sim, utilizamos animais mortos, mas eles fazem parte de um sistema onde cada parte do animal é aproveitada, não só fisicamente, mas também espiritualmente. Valorizamos não apenas o que o animal nos fornece em termos materiais, mas também o espírito do animal.

Sigo para a génese do filme, é sabido que o filme propriamente dito nasceu de um sonho do Kawá, o de ir para a Europa …

KHK: Sonhar em querer conhecer mais sobre a cultura da cidade é algo que temos na nossa aldeia. De manhã, o nosso “cacique", que é como um presidente da aldeia, e a liderança, que é semelhante a um governo, reúnem-se para liderar os mais jovens e novos no trabalho e na administração. O “cacique” convida a liderança a acordar cedo e contar os nossos sonhos, o que sonhamos e o que vamos fazer com eles. Compartilhamos não só sonhos de quando estamos a dormir, mas também as nossas visões.

Temos muitos rituais e tradições na aldeia, e por vezes, durante uma noite de ritual, um sonho aparece-me, como uma visão. Eu viajo e vejo grandes navios, aviões, cidades grandes, coisas que nunca tinha visto antes. Isso faz-me perceber que preciso de aprender mais. Acredito que os meus ancestrais trouxeram-me essa oportunidade para buscar algo novo.

Por isso, surgiu em mim o desejo de realizar este sonho de viajar, fazer algo bom para continuar a aprender. Ouvi falar que alguns parentes viajaram para a Europa e voltaram contando como era lá. Isso despertou em mim o interesse de também conhecer e aprender.

Foi esse sonho que me motivou e que me ajudou a convencer a Verónica a colaborar. Queria comunicar a minha cultura, não só em português, mas também noutra língua, por isso comecei a aprender inglês. Quando a Verónica esteve na nossa comunidade, estava a filmar e nós ajudámos no seu trabalho. Percebemos que, ao fazer isso, estávamos a convencer a comunidade a colaborar e a trabalhar em conjunto. Daí surgiu o filme, que reflete a nossa tradição e a nossa palavra, que pode ser compreendida por todo o mundo.

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Verónica Castro na rodagem de "Yupumá" (2024)

E de onde veio a ideia do título - “Yupumá”? 

VC: Pois bem, o que acontece ao tentar apresentar o conceito indígena? Fiquei bastante empolgada com essa ideia e até perguntei ao nosso chefe, o pajé que você viu no filme. Mesmo sendo uma pesquisadora persistente, com papel e caneta sempre à mão, precisei ver e rever para entender. Ele explicou que não é algo que se defina facilmente, mas sim uma experiência que precisa ser vivida pelo corpo e ser reconhecida pela comunidade.

Foi nesse momento que percebi: a comunidade na Europa precisa de entender isto. Não são apenas os franceses e os alemães que são filósofos; não são os únicos capazes de entregar filosofias de vida ou compreender esses conceitos.

Decidi que este era um conceito que poderia ser muito útil para o nosso olhar europeu.

Haverá algum tipo de continuação? O das “aventuras” de Kawá na Europa?

VC: Até agora, a minha resposta tem sido que vocês aqui estão integrados nisto. Assim, o filme transborda para a realidade. A continuidade é vivida através do conceito Yupumá.

KHK: A primeira vez que viemos, acredito que tivemos uma experiência de Yupumá. É por isso que este projeto ainda continua. Estamos aqui, cada vez mais, a formar famílias e comunidade, e as pessoas estão a conhecer-nos. No início, apenas a Verónica me conhecia, mas hoje em dia muitas pessoas já me conhecem e cada vez mais vão conhecendo. Estamos a criar uma comunidade e um grupo de trabalho. Assim, continuamos em movimento.

VC: Gosto de chamar a isto o movimento Yupumá. Sim, e está a crescer. Sempre digo que isto é uma proposta. O que estamos a fazer é uma proposta para mostrar, não só em termos de disciplina de antropologia, mas também como um exemplo de uma nova forma de fazer antropologia. Estava a falar há pouco; as pessoas perguntam-me: “Quando é que começaste o trabalho de campo, em que data?” Digo-lhes a data, mas quando me perguntam quando terminei, respondo: "Não sei, porque o campo está comigo agora. Estamos a criar este novo campo." [risos]

A antropologia já não é o sonho do antropólogo que vai lá com a sua caneta estudar o outro. Agora estamos a partilhar este processo e, na academia, argumento isto em termos de cinema. Já sou cineasta, então o cinema é uma ferramenta para mim. E agora, ao partilharmos estas habilidades e esta ferramenta, estamos a co-criar esta história. Em termos de cinema, estamos a avançar além das propostas de Jean Rouch.

Ultrapassar o verité?

VC: Exacto, é uma experiência. Só que não podemos estar em todas as salas para ter esta conversa, portanto o grande desafio é como transmitir este sentimento, esta sensação de pertença ao filme, e em todas as salas, quando este for visto sem a nossa presença.

Encontrou uma solução?

VC: Ainda não sei. Penso em como os filmes vivem para além da tela, da sala. Possivelmente, será através das ações das pessoas após verem o filme. Como será essa relação? Bem, um espectador poderá relacionar-se intelectualmente e emocionalmente, mas acho que este filme propõe um outro tipo de envolvimento. O que propomos é... isso mesmo, “Yupumá". Se as pessoas começarem a enfrentar a vida com esse estado de espírito, já estarão a relacionar-se com o filme. Ou seja, fazer algo pela primeira vez e dar prioridade a isso todos os dias. Seríamos, de facto, mais felizes. A nossa proposta é que a alegria é uma forma de resistência, e isso só é conseguido através do Yupumá.

Já demonstrámos o nosso filme em diferentes sítios, muitos em contextos mais íntimos, e as pessoas saíam perplexas, perguntando que tipo de filme é o “Yupumá". “Um filme indígena sem genocídio, sem incêndios, sem enchentes, apenas pessoas felizes com as suas vidas?”. A minha pergunta enquanto cineasta é: ou as pessoas só querem ver as misérias para se sentirem melhor, ou têm medo da alegria, ou simplesmente aterrorizam-se com a ideia de estarem numa canoa no meio de um rio, em silêncio?

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Yupumá (2024)

Visto que o cinema indígena, incluindo o seu filme como parte desse subgênero, está a crescer de tal forma, questiono se há algum perigo de banalização.

VC: Não quero julgar o trabalho dos outros. Acredito neste método e é desta forma que pretendo continuar a realizar filmes, levando-nos para além da sala de cinema de uma maneira digna. Se outros fazem filmes sobre a Amazónia de outra forma, muito bem, é uma escolha deles. Agora, se assumimos o cinema indígena, e que está a crescer e até tem festivais dedicados, já está na hora de colocarmos a questão do que define o cinema indígena e o que torna esses filmes verdadeiramente pertencentes a essa designação?

É uma boa pergunta. Tem a ver com o olhar, seja do filme, seja de quem está a formar esse olhar [sabendo que muitos realizadores dão câmaras a membros das comunidades para que eles filmam as suas próprias imagens]?

VC: Quem está a fazer a montagem? Não é fácil, mas quem monta detém o olhar do filme. Não é de agora, mas durante anos treinou-se indígenas para filmar, gravar e até montar, mas a questão permanece, o que define o cinema-indigena, ou melhor, quem decide os temas a filmar?

A sombra do marmeleiro

Hugo Gomes, 27.10.22

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As grandes montanhas são vistas à distância, as pequenas é preciso aproximarAntonio López

Para quem estiver a ler este texto, perderá e muito a pertinência transmitida por Irene M. Borrego neste seu concebido filme, até porque, para tal experiência é importante desconhecer qualquer indício de existência de Isabel Santaló. Primeiro, como mote ao tema latente - o esquecimento que paira nesta artista - e segundo, a inquietude e a indefinição da existência da mesma. 

A realizadora confronta diversas vezes Santaló, da sua memória e da sua auto-percepção enquanto artista, fala-se em subvalorização ou até negligência por parte do núcleo artístico madrileno (acrescenta-se sexismo), de outra maneira entendemos a uma síndrome “Norman Desmond” no preciso momento em que a anciã debate com a realizadora (do qual somos informados tratar-se da sua sobrinha) sobre a sua própria relevância. Aí o filme joga no campo da ilusão e da incerteza, o espectador é embarcado nessa dúvida que metamorfoseia em algo à parte do mero biopic ou obra-tributo. Longe do resgate que poderia suscitar neste gesto, este “La Visita y un Jardín secreto” é uma confrontação com "fantasmas interiores”. 

Para Borrego, as comparações com a sua tia, ouvidas vezes sem conta nos seus “verdes anos”, a perseguem, assombram-na como sinal de imprecação lançada pelo oculto conservadorismo às mulheres que desejam a emancipação. A realizadora guarda para si essa ambição e igualmente essa resistência em deserdar qualquer maldição ou espectros agarrados. O resultado, possivelmente, é esta “desavença” com a pessoa que a mais lhe assemelha, a sua tia “maldita”, a “artista da família”, a única, Isabel Santaló. Obviamente que o “inimigo” é fabricado, Isabel não é a antagonista na história de Irene, mas antes a sua dura inspiração. O destino hoje deparado, em que a idade é uma vilã tendo como aliada a solidão, invoca o maior temor de Irene

Dito desta forma, “A Visita e um Jardim Secreto” é uma farsa de filme, encosta-se como um “filme de artista”, mas é mais que isso, um filme sobre buscas internas em divãs proporcionalmente cinematográficos. Irene M, Borrego inconscientemente concretizou um filme sobre ela própria (se bem que os artistas falam deles próprios através do seu ofício). Isabel, o seu esquecimento (curiosamente, contamos com um voz-off de António López, o pintor de “El sol del membrillo” ["O Sol do Marmeleiro"] de Victor Erice, o único artista que declaradamente se lembra dela), a sua força enquanto mulher e artista, os seus quartos “secretos”, revelam-se como parte dessa tela. 

“Serás como a tua tia Isabel”

"Entre Ilhas": Que nunca "caiam" as pontes entre nós ...

Hugo Gomes, 30.06.22

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Sendo este projeto parte da sua pesquisa académica, a antropóloga madrilena Amaya Sumpsi nunca pretendeu transformar o seu “Entre Ilhas” num ensaio academista ou uma prolongada extensão da sua tese de doutoramento, ao invés disso procura preencher um espaço entre o “vazio” azul que banha mais de 9 porções de terra isolada, essas que se dão pelo nome de Açores.  

Embarcando a bordo do Express Santorini - antigo navio-luxo da frota grega, no filme durante o seu período de ligação entre São Miguel e o Faial - para contrariar uma ideia enraizada entre os “continentais”, de que o açoriano não deseja o mar, ao invés disso é a terra, mesmo limitada que seja, a sua inteira convicção. Uma declaração em forma de arquivo, atendida como alvo a uma resposta duradoura por entre os habitantes destes "pequenos mundos”, tendo como união o mar, não somente pelo aspecto geográfico e territorial, como também pelo espiritual.  

O trabalho de pesquisa da Sumpsi é evidente no documentário, a viagem que parte de um porto em direção ao outro com a promessa de “terra vista”, porém, o filme não se centra numa ostentação de informação (mesmo acarinhando as dezenas de entrevistados, os quais, muitos deles, segundo a realizadora, já não se encontram entre nós), e sim num percurso por entre essas “pontes invisíveis" que o oceano sustenta, e que mesmo assim une as ilhas como um todo. Um choque de passado com o presente, de futuro na venta quanto às oferendas atlânticas - Faial, Pico, São Jorge, São Miguel, Graciosa, Corvo, Flores, Santa Maria, Terceira - os filhos oceânicos que se aproximam, mais e mais, do Continente, enquanto a sua tradição marítima se transforma, deixando pelo caminho os danos colaterais da sofisticação.  

Amaya Sumpsi levou-nos a olhar para lá do horizonte, falando de distâncias, culturais, mas acima de tudo de tempo (o Express Santorini' fazia o percurso em 16 horas). Algo que todos parecem estar unanimemente de acordo, mesmo não tendo a percepção, é que o tempo tornou-se diferente nos Açores, o “bem precioso” anteriormente contabilizado e calculado pelo isolamento, das embarcações de lés-a-lés (facto curioso, o tempo tinha manifestações diferentes conforme a classe social), é hoje inconscientemente descartável. a globalização e os seus efeitos os encostaram mais ao “progresso”, mas também os precocemente retiram do seu berço - do Mar. A negligência converte-os em órfãos quanto às suas origens. 

A trajetória de Express Santorini parece ter encontrado, durante e após a pandemia, o seu fim, a sua obsolescência. Um transporte virado em museu, pronto a ser “arquivado” e esquecido da memória coletiva, e com ele, um pedaço da história antropológica moderna dos Açores partilhará o mesmo destino. As tradições desvanecem no grande azul. Só o Mar recordará de toda a História.

“Avenida Almirante Reis Em 3 Andamentos”, ontem, hoje e amanhã pelo caule de Lisboa

Hugo Gomes, 07.10.19

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Entramos pela Avenida Almirante Reis adentro através de um travelling de outros tempos no cadente relato das suas origens extraído de um programa televisivo de ’82.  Aquela que é uma das principais artérias da cidade de Lisboa tem por fim o “filme que merece“, palavras que a realizadora e montadora Renata Sancho deseja acentuar como a natureza deste projeto – “Avenida Almirante Reis em 3 Andamentos” – que encarou como uma oportunidade de “vasculhar os arquivos e entrar na História da Avenida que tão bem conhecia“.

E não o fez sozinha. Ao seu lado esteve o geógrafo Aquilino Machado Ribeiro que procurava por essas mesmas bandas o “eixo republicano, vilas operárias e as raízes da implementação da república“. Ambos uniram esforços para conceber este vaivém pelo passado, presente e com um vislumbre do futuro da avenida.

Apresentado na edição de 2018 do Doclisboa, “Avenida Almirante Reis em 3 Andamentos” nasceu da ideia de mapear, quer geograficamente, quer historicamente, uma rua tão pessoal para a realizadora, habitante orgulhosa desta meia veia que atravessa a “burguesaAlameda até o cada vez mais centralizado Intendente. Tendo fundado em 2013 a produtora de cinema independente Cedro Plátano, que encontrou neste seu trabalho um feito de atingir por fim o circuito comercial, questionou primeiramente como levar a Avenidaa uma sala de cinema“. “É um filme de cinema, os enquadramentos foram feitos para o Cinema, a duração dos planos adequada para Cinema“, reforçou.”O filme tem 66 minutos, porque, segundo o Google, descer ou subir a rua dá exatamente 66 minutos.

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O ARQUIVO, A AVENIDA E O ALMIRANTE.

Há alguns dias, saía no jornal Público uma entrevista com Nicole Brenez, uma das curadoras da Cinemateca Francesa, no qual esta declarava o Cinema como o salvador das imagens. Afirmação curiosa que se translada para a iniciativa de Sancho. A realizadora, que fundou em 2013 a Cedro Plátano, concordou com esta migração de conceitos durante a nossa conversa, não na Almirante Reis, mas num café situado na Avenida Fontes Pereira de Melo: “o Cinema pode realmente salvar os arquivos“. De seguida, acrescentou que apesar de “todas as dificuldades que isso aplica, de acesso, financeiras, etc, os arquivos deveriam ser salvos através dos cuidados com os mesmos. Ou seja, pelo trabalho nos arquivos que os investigadores já o fazem pela vias da investigação, como também o próprio Arquivo como uma corrente de trabalho no contemporâneo dos artistas.

Para Renata Sancho, o trabalho de investigação foi dificultado pela falta de registos e a preservação dos materiais existentes. A realizadora salientou principalmente um vazio na década de 40 da Avenida, cuja disponibilidade de fotos iria transformar o filme noutro que não estava inicialmente idealizado: ”Ficou muita coisa de fora, mas não mudaria. Um filme acabado é um filme acabado. Acabou.” Revelando-se desapontada em relação aos arquivos da Avenida no Estado Novo, o qual apenas resumia a “Alameda, Alameda, Alameda, Areeiro e dois segundos do novo elétrico“, a sua pesquisa ficou-se somente pela colheita nacional: “não procurei nos arquivos estrangeiros“.

Uma das imagens mais marcantes do filme são os registos do Primeiro de Maio, em ’74, poucos dias depois da Revolução de Abril, estreitamente absorvidas do filme “As Armas e o Povo”, do Colectivo de Trabalhadores da Actividade Cinematográfica. Nelas era possível ver a Alameda invadida por um “mar de gente” que comemorava um sonho idealizado. À porta do Cinema Império, hoje cedido à Igreja Universal do Reino de Deus (“se houvesse um referendo, eu votaria contra“), é visível um enorme cartaz de “O Couraçado de Potemkin”, filme de Eisenstein que antes do 25 de Abril rodava pelos cineclubes marginais sem o conhecimento do regime, cópia essa adquirida por António da Cunha-Teles. Por entre a multidão era mais que certo encontrar caras reconhecíveis como Mário Soares, João César Monteiro, Margarida Gil e Fernando Lopes.

O som dessas imagens desapareceu e por minha decisão apresentei-as sem qualquer tipo de som. Isto pode ser problemático para muitas pessoas, que pensarão que estou a silenciar o Primeiro de Maio, o que não estou. (…) poderia ter colocado som sincronizado ou manipulado, mas montei-as de maneira na qual ouvíssemos o som. (…) os arquivos são de som direto quando existem editados com o som direto. (…) Uma razão muito performativa aqui, é que a Avenida Almirante Reis é das avenidas mais barulhentas de Lisboa, e aqueles 4 minutos e meio de silêncio antes de entrarmos para o presente é precisamente uma sensação muito boa.

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Renata Sancho

 

“Ó GENTE DA MINHA TERRA”

As imagens arquivadas compõem uma estrutura óssea na narrativa deste documento, que é preenchido pelo registo quase etnográfico e arquitectural da zona. Durante a nossa conversa, foi salientada a natureza dessas mesmas imagens captadas, uma colheita pelo multiculturalismo da rua em si, que entra em choque com a homogeneidade trazida pelo passado aí inserido: “O que faço no filme, com as imagens atuais, é mostrar a diversidade que a Avenida tem“. Nessa mesma instância, “Avenida Almirante Reis em 3 Andamentos” entra em acordo com a visão de Sérgio Tréfaut em “Lisboetas” (2004), o qual explicitava as mudanças da capital através da vinda de várias comunidades, tentando espelhar as definições não assertivas do que é ou não português. Renata Sancho, de certa forma, nega esse intuito no seu olhar pela diversidade da Avenida: “Não há aqui uma intenção política de definir o que é português e o que não é, existe apenas convivência.”.

De certa forma, a cineasta revela essas preocupações identitárias hoje servidas como base nos discursos da extrema-direita quando é mencionada a frase célebre de Almirante Reis proferida na Câmara dos Republicanos, após testemunhar uma iminente queda da sua causa republicana em 3 de outubro de 1910 – “Já não há portugueses” – “era uma frase que quando o ouvi, decidi que era com ela que iria abrir o filme, só não se tornou título porque obviamente poderia suscitar interpretações duvidosas e eu tento evitar esses caminhos.

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O FUTURO DA AVENIDA: NOVOS PROJETOS.

Renata Sancho prepara-se para regressar ao “Porto de Leixões”, documentário escrito em 2009/2010, dividido em duas partes e, cuja primeira, “muito experimental“, já trabalhada, obteve apoio da Gulbenkian. Com este projeto a realizadora poderá “voltar ao arquivo“, tendo na sua posse “material fotográfico do Porto de Leixões em que era projetado como uma grande epopeia“.

Curiosamente, o Porto de Leixões foi inaugurado em 1908, a Avenida Almirante Reis em 1908. Há qualquer coisa com o ano 1908 [risos]“, decidida a retornar à Avenida que sempre a acompanhou, Sancho revelou que para o seu filme deixou de parte imenso material – “os arquivos são uma espécie de casting” – e que muita dessa matéria, incluindo depoimentos recolhidos, poderão gerar um livro. Contudo, a realizadora tem noção dos desafios que a esperam:  “editar um livro não é o mesmo que construir um filme.

Existe ainda um projeto sobre o escritor Aquilino Ribeiro, avó de Aquilino Machado Ribeiro [argumentista de “Avenida Almirante Reis em 3 Andamentos”], que novamente trabalhará com a realizadora. Esta assumirá a produção, pelo que também dirigirá a convite do seu parceiro: “Estou a começar agora a trabalhar e a ler obras do Aquilino.