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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

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The Bride of Re-Animator: as bodas da reanimação

Hugo Gomes, 03.07.17

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Sem Stuart Gordon mas com Brian Yuzna a auto-promover-se de produtor a realizador, eis a sequela do êxito de 1985 (Re-Animator). Nesta continuação e seguindo a fórmula do seu antecessor, ou seja, como Gordon havia assumido, uma sátira do clássico literário de Mary Shelley (mais do que uma adaptação fiel ao conto de H.P. Lovecraft, o qual serviu de base), The Bride of Re-Animator vai beber da mesma fonte que The Bride of Frankenstein havia bebido em 1935. Por outras palavras, mais que uma sequela, esta é uma reinvenção do material concebido quatro anos antes (encaramos como tal para "fecharmos os olhos" aos extensos buracos narrativos que o ligam ao primeiro filme).

O enredo remete-nos para algum tempo depois do massacre hospital que ditou o desfecho da prequela. Herbert West (novamente interpretado por Jeffrey Combs) e Dr.Cain (Bruce Abbott é também repetente) partem para uma Guerra Civil de um país "sabe-se lá donde" com o intuito de exercer trabalho comunitário. É no centro do conflito que West depara-se com a sua nova inspiração, os desejos de devolver vida são ultrapassados, a nova meta é sim, a criação de vida.

Em Bride of Re-Animator existe uma enorme aptidão para referências "frankenstenianas" que o culto gerado por Stuart Gordon, para além disso, este filme é mais propicio para o absurdo que o anteriormente referido. Yuzna sempre declarou-se um fã dos efeitos práticos, do sintético e com isso, da manipulação corporal e das ilimitações duma imaginação macabra e igualmente jubilante. O climax deste The Bride' é tão redutor desse "fascínio" que tende em perder do seu trilho lovecraftiano (chamaremos assim) e lançar-se a uma jornada "spoof" de contornos oscilantes.

Comparando com o original Re-Animator, esta sequela resume-se a uma sombra daquilo que o filme poderia ter sido se restringisse à astúcia perdida, porém, um facto que não podemos negar aqui é a preservação da atmosfera hereditária. A sua aura negra torna-se na sua maior criatividade e tendo em conta que os anos 90 não serão "amáveis" para os recorrentes efeitos práticos, fiquemos então satisfeitos com a mostra aqui adquirida.   

 

Brian Yuzna sobre "The Society": "A paranóia não é conspiração, tu não vês quem tem o poder"

Hugo Gomes, 05.11.14

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Brian Yuzna

Brian Yuzna esteve em Portugal para ser fruto de homenagem na 8ª edição do MOTELx, Festival Internacional de Cinema de Terror de Lisboa, por coincidência numa altura em que o seu filme ”The Society” comemora 25 anos. Juntamente com o jornalista Paulo Portugal, conversei com o homem por detrás de um dos mais bizarros e fascinantes filmes de terror do final dos anos 80 e da produção de inúmeras outras obras que tanto arrepiaram e assustaram os amantes do género em geral.

O Brian já esteve em Portugal, certo?

Sim, vim ao Fantasporto três vezes. Duas durante os anos 90 e uma por volta de 2003… Mas a Lisboa nunca tinha vindo.

Sim, o Fantas’ é um clássico no género.

Eu gosto deste festival. Tem uma boa audiência. E está bem organizado.

E recebe aqui a homenagem dos 25 anos de “The Society”…

É verdade. Fico contente por alguém se interessar.

Ao olhar para trás, consegue traçar algum paralelo entre este filme e os seus trabalhos mais recentes como produtor?

Acho que conseguimos sempre ver alguma coisa. Os filmes são um produto da situação, quem financia, se somos o realizador, quem produz. É uma espécie de grupo. Acho que é possível, mas não necessariamente. Tem de existir um instigador. Normalmente, o realizador. Em “The Society” eu era realizador pela primeira vez e tinha ainda pouca experiência. Como sabe, nunca tive qualquer tipo de formação. Era apenas um apaixonado pelo cinema. Aliás, nessa altura toda a gente era. E só comecei a fazer filmes quando já tinha dois filhos.

No seu entender, o que acha que o género do horror tem que continua a cativar geração atrás de geração a este culto?

Essa é uma boa pergunta. Posso não saber a resposta, mas conheço o fenómeno. Eu acho que o género do horror se aproxima mais aos sonhos. É mais fantástico e eu gosto disso. Gosto de filmes sintéticos. Quando pensamos na História do Cinema, pensamos nos dois caminhos: Meliès e Lumière. Meliès, mais sintético e sonhador, Lumière, mais realista. No meu caso, sou um entusiasta do surrealismo na arte, gosto do dadaísmo, gosto do expressionismo. Gosto de um filme que expresse o que sentimos e não o que é. Quero ver a loucura no set.

Mas porque as pessoas regressam a eles, não sei. Acho que quem gosta do terror é porque ficou infectado. É como uma droga forte. Primeiro, não conseguimos suportar e temos a sensação de náusea. O sentimento de horror é muito forte. Lembro-me quando era criança e vi um filme de terror fiquei doente.

Lembra-se de que filme era?

Sim, lembro-me. Era um filme estúpido com uma criatura chamada “Atom Brain”.

E que idade tinha na altura?

Deveria ter uns seis ou sete anos, ou talvez mais. Mas à medida que fui crescendo comecei a interessar-me pelos filmes do William Castle. É claro que à medida que vamos crescendo e entramos na puberdade começamos a interessar-nos por sexo e outros impulsos e por isso ficamos diferentes. Talvez por isso, o terror seja muito popular nos adolescentes pois eles compreendem de imediato o seu significado.

Mas quando ficamos mais velhos passamos a preocupar-nos com as contas, a família, com os problemas normais da vida e não pensamos tanto nisso. É claro que há exceções, como eu, que fiz do horror a minha profissão. Mas hoje as novas gerações acham que o “Saw” é o expoente máximo do horror, sem conhecer os clássicos dos anos 50, 40, 30 e mesmo antes. Não conhecem o contexto do género.

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"Re-Animator" (1985)

Como responderia à questão “qual o seu filme de terror favorito“?

Não sei como responder. Alguns afetaram-me mais do que outros. Na minha idade moderna, como costumo dizer, será a partir de “Night of the Living Dead”. A primeira vez que o vi fiquei nauseado, afetou-me mesmo. Mas é claro que há outros, como o “Psycho”, apesar de não ser um filme de género típico. Mas veja o que fizeram com as imitações do Romero Hoje não há filmes de zombies decentes. Mas temos também o “Texas Chainsaw Massacre”, que vi recentemente na sua versão restaurada.

Há outros clássicos, como “The Exorcist”, um filme muito importante, ou o “Rosemary 's Baby”, o “Shining”. Mas os que mais me afetaram e adoro são “The House on Haunted Hill” (filme de William Castle, de 1959) e os filmes antigos do Corman, obras que foram muito importantes para mim. Quando entrei numa idade mais moderna acho que há menos filmes que me afetaram. Confesso que me aborrecem um pouco. Antes vivia cada momento; hoje consigo perceber o final do filme logo no início. Uma exceção foi “Cabin in the Woods”, talvez porque seja uma comédia. Gosto do Freddie [“A Nightmare on Elm Street”, claro, porque é surreal. Tal como o “Halloween”. Eu gosto de coisas estranhas.

Como define a sua cooperação com Stuart Gordon?

Bem, eu comecei com Stuart e aprendi bastante ao vê-lo trabalhar como realizador. Aliás, os três primeiros filmes que produzi eram da sua autoria. Sempre trabalhamos bem juntos, como pessoas, como amigos. Stuart costumava dizer que a nossa colaboração despertava de certa maneira o pior de nós, visto sermos muito diferentes em relação às nossas ideias. Por isso, tudo o que aprendi na área da produção foi graças a essa colaboração. Sem ela não teria nascido “Re-Animator”, “From Beyond”, “Dolls” nem “Dagon”, que surgiu anos mais tarde. Depois seguiu-se o meu trabalho de realização, “The Dentist”, que contou com a cooperação de Stuart Gordon no argumento, frutos da minha anterior contribuição no seu trabalho.

O filme “The Society” foi lançado nos EUA três anos depois do seu lançamento na Europa. Como explica esse impasse nos cinemas norte-americanos?

Devido à maneira como foi financiado. “The Society”, tal como “Re-Animator”, foi financiado pela Wild Street Pictures, companhia gerida por Paul White, que era um britânico com negócios no Japão. Por isso foi o dinheiro japonês que financiou “Re-Animator”. No entretanto havia outra empresa chamada Medusa, também ela no Reino Unido, e como Paul era britânico, o filme saiu-se bem no mercado inglês e, francamente, isso foi algo fantástico. Ele também chegou a estrear na Espanha e percorreu com êxito outros países da Europa e do mundo até, por fim chegar, com alguma demora, aos EUA – onde obteve péssimas críticas. Lembro-me principalmente de uma crítica na Variety, em particular.

Essa má recepção nos EUA foi devido ao facto de “The Society” ser uma sátira?

Para mim “The Society” não é uma sátira, nem sequer horror de género, e sim uma ironia. Também gosto de pensar que é um, como costumo apelidar, “psychofiction“, ou seja, peguei numa neurose e tornei-o real. E diverti-me a fazer isso.

De onde surgiu a ideia de “The Society”?

Quanto à origem, é quase como uma biografia de Woody Keith, que é um dos co-argumentistas. Woody Keith era de uma família de posses em Beverly Hills e ele sentia-se paranóico com esse tipo de pessoas (bem, quase com todo o tipo de pessoas), dizia que os ricos ou a sua família eram doentes. Ele escreveu o argumento, mostrou-me e eu gostei.

No original o segredo era um sacrifício de sangue, mas foi alterado devido ao meu gosto pelo fantástico e por isso tentei criar uma mitologia da paranóia. Como estive na faculdade tive acesso a todas aquelas contra-culturas e jovens políticos, era quase uma grande festa, havia lá toda uma ideia de “class explotation“. Depois temos o fator de que vários jovens sintam que foram adotados. É estranho viver com uma família o qual sentimos não nos pertencer e vice-versa. Quis que isso fizesse parte da história, uma “true story“. Por vezes a ficção consegue ser mais real que os factos.

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The Society (1989)

Então, o alvo de “The Society” são os ricos?

Tu ganhas a lotaria, e pensas que tornarás poderoso porque ganhaste por fim muito dinheiro, mas não! O poder já vem de família, do sangue que corre nas veias. Gostamos de pensar que os poderosos são celebridades como a Rihanna, mas não, os poderosos não dão a cara, nem sequer os conhecemos. E só representa 1% da população, mas são eles, os ricos, que usam os outros, dominam-os.

A paranóia não é conspiração, tu não vês quem tem o poder. O alvo de “The Society” é a sociedade, não são exclusivamente os ricos nem sequer as classes. Mas lembrem-se, no final Billy vence. Ele vence os seus fantasmas, os seus medos, esmurra o seu “pai”, depois foge e ninguém o persegue. Entenderam, ninguém vai atrás dele, afinal, por que perseguir? Os ricos exploram-nos, entendem? (risos)

Apesar do conceito, “The Society” é um filme sério, é isso?

Ou seja, “The Society” lida com inúmeros elementos, ao mesmo tempo que tem a base de vários filmes de terror. Quis tentar divertir-me com isso, parecendo um daqueles casos em que uma nave espacial traz algo de mau do espaço. Contudo, nunca tive intenção de fazer Society um filme sério, nem sequer de alcançar a posição de um artista. Quis fazer um tipo de horror com este tipo de material bom. Foi quase como fazer “The Exorcist” (sim, é mais sério que “The Society”), o quão divertido é de ver aquela rapariga a ser possuída, isso é que é um filme de género. Por isso nos divertimos com o exploitation, fizemos de A Sociedade uma espécie nova.

O Brian tem medo de dentistas?

Fiquei com mais medo dos dentistas depois de fazer “The Dentist” [risos]. As pessoas acreditam que quando fazemos filmes sobre os nossos medos, deixamos de os ter, mas quando fiz “The Dentist” fiquei completamente horrorizado. Comecei a imaginar, a perceber, como tudo aquilo funciona. Sim, isso é que é horror.