Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Década 2010 - 2019: os filmes que ditaram a nossa jornada pela imagem

Hugo Gomes, 28.12.19

pjimage (1).jpg

Antes de começar com a previsível justificação da minha seleção, queria mencionar um filme que apesar de se encontrar ausente desta listagem, foi importante e reflexivo para com a virada da década, e quiçá, desenhando aquele que diríamos ser o cinema das próximas gerações.

Essa obra é nada mais, nada menos, que a “The Social Network” (A Rede Social), de David Fincher, que acertou contas com um dos possíveis vórtices da nossa identidade do século XXI, enquanto individual, enquanto coletiva. Não poderemos negar que os nossos dias são demasiado dependentes desse dispositivo - o de trabalhar a nossa imagem para o exterior e moderar a exposição do nosso (não) íntimo. Digamos, que foi através desses pensamentos perante tal “futilidade”, do qual se tornariam o espelho narcisista da nossa modernidade, que Aaron Sorkin inspirou-se para escrever esta fictícia trama (na altura apontada como “cedo demais”) que operaria como pontapé de saída para os filme que reúno aqui – intimidade expositiva e a imagem fabricada da nossa existência.

Por isso, passeamos pelo último gesto de cineastas incompreendidos (The Other Side of the Wind, The Turin Horse) até à possível previsão do futuro do cinema (Holy Motors, The Congress), a nossa exposição sentimental como instalação artística (Elena, Before We Go, L’ Vie d’ Adèle), a identidade ou existência como demanda de natureza várias (La Grande Bellezza, La Piel que Habito, Django Unchained). Mas no seu todo é uma “mixórdia”, como muitos deverão salientar, de velhos autores em reunião com outros nomes sonantes e promissores que aguardam pelo seu tempo. Porque o cinema tem destas coisas - o de esperar para ver.

pjimage.jpg

1 -The Other Side of the Wind (Orson Welles, 2018)

2 – Holy Motors (Leo Carax, 2012)

3 – Elena (Petra Costa, 2012)

4 – La vie d'Adèle (Abdellatif Kechiche, 2013)

5 – The Turin Horse (Béla Tarr & Ágnes Hranitzky, 2011)

6 – Before We Go (Jorge Léon, 2014)

7 – The Congress (Ari Folman, 2013)

8- La Grande Bellezza (Paolo Sorrentino, 2013)

9 - Django Unchained (Quentin Tarantino, 2012)

10 - La piel que habito (Pedro Almodóvar, 2011)

Gatos computorizados e assassinos sintéticos: o CGI matou o prático

Hugo Gomes, 22.07.19

MV5BOWRjNzA5MzQtMTFlYS00Y2ZmLWI1ZWMtYjdlOWUxOTVlNz

"Cats" (Tom Hooper, 2019)

Se Hollywood escarafuncha tudo e mais alguma coisa para conseguir o seu próximo lucro, já sabíamos. Que o CGI é utilizado de forma desalmada para que sejam possíveis todas as formas estetizadas ou imaginadas, também conhecíamos. Porém, existe uma dependência e quando isso existe, é necessário haver uma intervenção.

Se existem produções cujo chamariz é a sua inovação tecnológica, seja ela bem-sucedida e por vezes bem-vinda (“Matrix”, “Avatar”, “Terminator 2” e “Forrest Gump”) ou esquecidas (“Speed Racer”, “Sky Captain and the World of Tomorrow” e “Beowulf”), há também a existência de um outro lado, o facilitismo e porque não o lobby de forma a favorecer empresas de efeitos digitais frente aos efeitos práticos.

O veterano Alec Gillis, que trabalhou bem perto com o mítico Stan Winston e hoje é detentor de uma produtora de efeitos práticos [Studio ADI], para além de ser responsável pela criação de alguns monstruosos adereços em filmes como “Starship Troopers: Soldados do Universo”, “Death Becomes Her” e “Tremors: Palpitações”. Constantemente refletindo sobre o seu presente e futuro, os seus pensamentos são tudo menos “felizes”. Recentemente, em conversa no podcast português VHS: Vilões, Heróis e Sarrabulho, Gillis falou sobre a decadência do ramo e o facto dos grandes estúdios optarem facilmente pelo computorizado face ao “manual”. Questões de logística, recursos humanos e sobretudo orçamento são algumas das linhas guias para que as “majors” embiquem pelo artificialismo.

Nesse mesmo programa, ele relatou um episódio algo “trágico” deste confronto entre prático e o computorizado: a forma como a sua equipa, designada para a criação dos monstros da prequela/remake de “The Thing: A Coisa” (Matthijs van Heijningen Jr., 2011), foram descartados. A Universal Pictures decidiu à última da hora minar a sua obra com CGI, deixando todo um trabalho concebido durante meses para trás. A solução encontrada por Gillis, de maneira a evitar o desperdício, foi reutilizar o conteúdo num produto de baixo-orçamento (possível por uma campanha de crowdfunding) dirigido pelo próprio: “Harbinger Down”, com Lance Henriksen no elenco.

A extinção destas empresas é tida como cada vez mais certa, até porque experienciamos atualmente a um assalto à sofisticação de uma nova versão de “The Lion King”, executado quase totalmente num fotorrealismo digital, ou, recentemente, “Cats”, que dispensa a caracterização e os adornos pelo qual o musical original é notório por um híbrido de motion-capture. O trailer, lançado no âmbito da Comic Con San Diego, causou uma repulsa quase generalizada, gerando em simultâneo um debate sobre os limites do artificialismo CGI e a sua fusão na carnalidade dos atores (assim como a razão para tal decisão).

Childs-Play-MastersFX-1000-21.jpg

A equipa de efeitos práticos de "Child's Play" (Lars Klevberg, 2019)

Não querendo seguir as questões trazidas pelo tão pertinente “The Congress”, de Ari Folman, sobre a condição do ator e da validação dos métodos de atuação, o que condiciona este frenesim por criações de bytes e megabytes é uma instantânea dubiedade do que é real e falso. Instantâneo, porque ao contrário dos efeitos práticos, onde atribuem a textura, dimensão e peso ao que quer que seja produzido, o CGI tende em ser uma especialidade de baixa longevidade, diversas vezes atingindo pela vinda de novas definições, pela sofisticação e, sobretudo, pelo olhar cada vez mais experiente do espectador. Desde pequenos somos mesmerizados pelo contingente computorizado, pela escassez da animação tradicional (o Japão resiste como último reduto, convertendo o anime numa prática nacional), e – principalmente – pelos cada vez mais realistas videojogos. É natural que com esta exposição, estas gerações sejam entendedoras do que é e não é criado em chroma key.

Em contraposição, um filme que tem de tudo para ser irrelevante nesta indústria, e até mesmo numa colheita cinematográfica – “Child's Play” –, apresenta-se como contra-natura destas tendências produtivas. Porque a verdade é que o animatrónico Chucky é um símbolo de resistência de 2019 à dominância do vácuo artificial. Enquanto isso, os jovens de hoje continuam deslumbrados pela metamorfose de “An American Werewolf in London”, de 1981. Como diriam os americanos: “CGI Free”.

Os Melhores Filmes de 2014, segundo o Cinematograficamente Falando ...

Hugo Gomes, 15.01.15

É com algum atraso que revelo aqueles que foram para o Cinematograficamente Falando …, as 10 melhores obras cinematográficas de 2014. Distopias alternativas, relações complicadas, passeios pela História e visões únicas do Mundo em que vivemos, são estas os derradeiros filmes, tendo como base as obras estreadas comercialmente em Portugal nesse mesmo ano.

 

#10) Her

R.jpg

"Talvez seja um pouco herege enunciar Her como um dos melhores romances dos últimos 5 anos, porque mesmo sentindo a sua vertente romântica e deliciosamente encantadora há que reconhecer a sua discreta, mas mesmo assim, determinada faceta negra. Com uma banda sonora daquelas que fascina qualquer um, The Moon Song de Karen-O é um prazer lírico e poético, em Her de Spike Jonze é um prazer apaixonar, contudo refletir sobre os caminhos que o nosso mundo social segue a fortes passos."

 

#09) Enemy

GYL.jpg

"Em Enemy, Denis Villeneuve aposta e vence, um thriller de atributos invejáveis ditado por um estilo único e labiríntico. E voltando à questão inicial, sim, Saramago era bem capaz de adorar esta visão libertina e simultaneamente inerente da sua criação literária, uma tese de autor sobre outro autor. O regresso do cinema provocador num filme para quem acredita que o cinema pode ser profundo e ao mesmo tempo, esteticamente cativante."

 

#08) Nightcrawler

nightcrawler-reporter-na-noite.jpg

"Jake Gyllenhaal veste a pele de um "abutre humano" em cenário desumano de oportunidade e hipocrisia. Nightcrawler é o Taxi Driver da nova geração, porém, mais agressivo, negro e sem um ponta de esperança numa humanidade cada vez mais regida à fama imediata e aos enclausuramentos estabelecidos pelos tempos televisivos."

 

#07) Ida

MV5BMTQzNzY4NzA5Nl5BMl5BanBnXkFtZTgwMTk1OTk4MDE@._

"Ida é um filme diatómico, um projeto amargurado e melancolicamente simbólico que nenhum país gostaria de ostentar na sua filmografia, mas que por um lado este é um trabalho de união que a Polónia tão bem concretizou. Uma jornada ao passado isentes de glória e drama digno hollywoodesco, existem poucos filmes assim."

 

#06) The Grand Budapest Hotel

896044.jpg

"Depois desta demanda, talvez a mais próxima da perfeição por parte de Wes Anderson, será difícil ultrapassar-se sem cair na limitação do seu estilo (fazendo lembrar o misterioso Terrence Malick). Enquanto não chega essa futura obra que irá ditar o rumo enquanto cineasta verdadeiramente acarinhado na indústria, Grand Budapest Hotel é uma fantástica aventura que nos remete ao misticismo do cinema, algo que parecia perdido.

 

#05) Mommy

mommy.jpg

"(…) em Mommy nem nos interessamos em salvações musicais, porque neste mundo confinado à entrega de um aos outros, Dolan é um "Deus" nada misericordioso, que não executa castigos divinos nem sequer recompensas. O magnetismo maternal, os fantasmas por trás desse mesmo deslumbramento, fazem de Mommy um filme de linguagem, de respostas sem perguntas e da afirmação de um realizador que por direito merece ser relembrado. Desencantado mas primoroso."

 

#04) Nebraska

alexanderpaynenebraska.jpg

"Agora também é verdade que esta pequena grande produção a preto-e-branco não funcionaria na totalidade se não fosse o seu elenco; um natural e simultaneamente soberbo Bruce Dern a apresentar a decadência temporal e Will Forte a surpreender no seu papel mais dramático, sem esquecer de uma divertida e arrogante June Squibb (impagável). Nebraska é um retrato humanista, emocionante e delicado, uma futura obra-prima do cinema independente norte-americano. Must see!"

 

#03) The Congress

1015033-ari-folman-s-congress-wins-european-film-a

"The Congress é um filme genial, extenso e nada tímido para com as suas próprias expressões e ideais, o anúncio da morte do cinema e da sociedade são arranques imaginativos e profundos para a confirmação de um dos mais proeminentes cineastas da actualidade. Depois da Valsa', chega-nos a solicitude."

 

#02) The Act of Killing

the-act-of-killing.jpg

Praticamente toda gente está a habituado a encarar o género do documentário com o formato das produções televisivas, mas enganem-se quem pensa que tal é apenas serviço pedagógico. The Act of Killing é o grande exemplo disso, uma veia onírica que abate o panorama real dos nossos dias, os medos de uma sociedade estampados sob um selo fantasmagórico. Aqui não há julgamentos, a ética é mera inutilidade perante a grandiosidade deste filme que nos remete ao mais negro da natureza humano. Corajoso, incisivo e na sua maneira de ser, poético

 

#01) La Grande Bellezza

R (1).jpg

"(…) Sorrentino é multifacetado na sua direção, por vias de mimetização (segundo as más línguas), consegue invocar Federico Fellini e o seu neo-realismo como também a veia satírica de La Dolce Vita, até aos planos algo simétricos e renascentistas de um Peter Greenaway. Ou seja, até na sua realização, Sorrentino incute a diversidade cultural, homenageando algum dos novos artistas, aqueles desprezados pelos puristas da Pintura e de outras Artes, que são os cineastas, porém sente-se em simultâneo um mise-en-scené por vezes digno do Teatro mais intimista."

 

Menção Honrosa: Nymphomaniac Part 1, The Broken Circle Breakdown, Gone Girl, Boyhood, Philomena