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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

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Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Viajamos para Famalicão! Arranca a 2ª edição do Close-Up, Observatório de Cinema

Hugo Gomes, 13.10.17

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"El espíritu de la colmena" (Victor Erice, 1973)

Numa viagem, no seu sentido mais poético e elusivo, o que menos importa é o destino. São os trilhos, essas veias sanguinárias que nos transportam para uma experiência à mercê da vivência. E são as experiências que vão este segundo episódio do CLOSE-UP – Observatório de Cinema de Vila Nova de FamalicãoDe 14 a 21 de outubro, a ocupar os mais diferentes espaços da Casa das Artes, e tendo como mira o sucesso da edição anterior, o CLOSE-UP apresentará mais de 40 sessões de cinema, workshops direcionados a escolas e famílias, uma produção própria (de Tânia Dinis) incluída no panorama no feminino de produção portuguesa, e a exposição fotográfica de André Príncipe (realizador de Campo de Flamingos, Sem Flamingos), intitulada de “O Perfume de Boi”, a ter lugar no foyer.

O primeiro dia será marcado pelo filme-concerto de “A Man with a Movie Camera”, de Dziga Vertov, devidamente sonorizado pelos Sensible Soccers (encomenda do CLOSE-UP). O gosto da melodia pop do grupo a tentar provar cadência para com uma das obras mais influentes da História do Cinema. Como qualquer viagem, digna do seu nome, o CLOSE-UP será dividido por diferentes etapas (secções) que nos acompanharão ao longo destes sete dias de pura reflexão cinematográfica. O Tempo de Viagem revela-nos uma metáfora sobre a maturação, o crescimento induzido por esses caminhos dados a lugares incertos. Andrei Tarkovsky é a “rock star” desta secção com “Nostalghia, a sua “aventura” em Itália. O existencialismo procurado por um poeta russo em terras toscanas e romanas funciona como um sacrifício que nos guia quase em modo retrospectivo e introspectivo ao cinema do seu cineasta. Wim Wenders é outro importante signo deste mesmo espaço, não fosse ele um dos grandes “caminhantes” do road movie.

Em “Fantasia Lusitana” esperam-nos quatro longas-metragens portuguesas em oposição a um programa de nove curtas, incluindo uma sessão dedicada a Tânia Ribeiro com a estreia de “Armindo e a Câmara Escura”. No lote nacional, destacamos principalmente as exibições da mais recente longa de Salomé Lamas, "El Dorado XXI", e de Luciana Fina, “O Terceiro Andar”. Vinda da nova vanguarda soviética, a cicerone Larisa Shepitko e Elem Klimov serão figuras relembradas nesta edição de Histórias de Cinema. Mas não serão as únicas. A partilhar o espaço está a dupla Peter Handke e Wim Wenders com “The Left-Handed Woman” e o sempre poético “The Wings of Desire”, bem como David Lynch, indiscutivelmente o realizador do ano, nem que seja pelo reavivar da série “Twin Peaks” que tanto deu que falar, no Observatório, representado pelo spin-off cinematográfico, “Fire Walk with Me”.

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Eldorado XXI (Salomé Lamas, 2016)

O resto da programação será constituído por sessões direcionadas para escolas e família, e ainda Infância & Juventude, que como o nome indica será um olhar coming-to-age; desse crescimento que por si deverá ser visto como uma viagem. E que melhor filme para transpor essas duas jornadas alusivamente interligadas que “American Honey” de Andrea Arnold? Claro que nem todas viagens são felizes e a juventude pode ser inconstante, inconsequente e até inconcebível, como o caso de “The Tribe”, de Myroslav Slaboshpytskyi, filme que, infelizmente, chegara demasiado tarde ao circuito comercial português, tendo em conta o seu historial de controversas passagens em festivais por esse Mundo fora. Nesta seção destacamos ainda o clássico de Victor Erice, “El espíritu de la colmena”.

A música e o cinema vão se fundir para criar um encerramento memorável, assim promete esta 2ª edição do CLOSE-UP, com três curtas de Reinaldo Ferreira, ou Repórter X + Dead Combo. A proposta parece indigesta, incompatível e sobretudo experimental, mas o cinema é um experimento que se transformou, como se pode verificar, na mais complexa das experiências. A viagem está marcada. 

Campo de Flamingos Sem Flamingos: aviso de "spoilers", há flamingos!

Hugo Gomes, 14.12.14

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Em Campo de Flamingos Sem Flamingos desejamos intensamente encontrar o fio condutor desta motivação epopeica visual, o percorrer do recorte de Portugal através do registo de imagens, onde André Príncipe, o diretor de fotografia Takashi Sugimoto e o operador de som Manuel Sá aplicam para preencher esse imaginário. Contudo, tal proposta só é possível a quem ler a sinopse de promoção deste documentário, sem noção como tal.

Em Campo de Flamingos Sem Flamingos (até no titulo nos demonstra uma alusão metafórica desperdiçada) vale pelas imagens recolhidas e pelos momentos em que câmara, como poucas, consegue captar, mas onde se esconde o autor no centro deste ensaio academista? O norte do espectador é abalado pela incapacidade de orientação de André Príncipe na sua narrativa visual, é no seu termo uma exposição de imagens sem um sentido cronológico nem objetivos definidos, quase como um álbum de fotografias que não queremos ver mas que o autor insiste em demonstrar. Pois bem, o desperdício é sentido em contacto com a angariação de material visual interessante, não apenas para o olhar, mas mesmo em linguagem cinematográficas, entre elas a alusão divina de um "Deus sob as formigas". De resto é mostrar o que se quer mostrar, sem nada a assinalar.

O vangloriar de imagens, o fascínio pela natureza estética que contrapõe com o retrato profundo do país que supostamente Príncipe quer expor. No final, após uma mudança drástica de registo, sentimos que o realizador brincou demasiado com uma câmara sem saber ao exato o que filmar, e o pior é que como espectador a frustração de um trabalho mal executado é evidente. Príncipe ficou a meio da sua missão, e o pior é que não obteve a coragem para reconhecer tal falhado ato.

E como grande parte dos novatos do cinema português de autor, ficamos às "aranhas" em mais uma masturbação ao clube que estas novas "promessas" querem a todo o custo integrar, sem com isso aprender com as suas experiências, erros e ensaios. Uma proposta indulgente.