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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

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Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Ratos do Porão ...

Hugo Gomes, 11.09.24

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O trono é um lugar solitário, onde os delírios encaram-no como o momento da sua emancipação, já não “falam”, gritam, desalmadamente nas mentes alucinadas. Ubu, ou antes senhor Ubu, homem dessas fantasias, ansiando pela poltrona real que não lhe pertence, nem dignidade, se é que existe, a possui para o deter, nessa feita, segue pela via “cobarde”, pela baixeza, rastejante conspiração, violência e por fim a morte de uma dinastia. “Rei Ubu”, vagamente inspirado no clássico de Alfred Jarry (adapatado para teatro e para televisão em 1965), é nas mãos de Paulo Abreu (“Alis Ubbu”) uma obra de desvaires e ecos à nossa atualidade, fazendo das traições satiricamente shakespearianas, macbethianas sem classe para sermos exactos, numa caricatura a populismos e à estupidificação no Poder. 

Em feita resulta num filme que se esperneia no detalhe visual, com câmaras em locais exatos, sem nunca perdeu o pio ao seu virtuoso olho, e por outro lado o desencantado graças à sua desarticulação, pelo desenrasque e pela paródia mesclada em crítica de fraturas a um falso épico de sopros anárquicos, de maneirismos mimetizados aos clássicos históricos desenrolados sob os motes espaço-temporais de Tarkovski (é um Andrei Rublev dos pobres à cabeça), das ações shakespearianas de Grigori Kozintsev (“Hamlet”) ou dos postumum objeto-não-identificado Aleksei German (“Hard to be God”). Não são apenas os russos, o exército “inimigo-salvador” por estas bandas, existe também uma tentativa de captar a estranheza soviética dessas produções que tragavam passado como cantigas do presente. No fundo, “Rei Ubu” consente como esse retrato, mas a queda do seu “reinado” permanece em nunca rasgar as suas veste de História refletida nesta modernidade. 

Mas não cuspamos na sua totalidade, Miguel Loureiro representa essa loucura balofa e Isabel Abreu (“Os Restos do Vento”) instala-se na excelência da sua variação Lady Macbeth. Um exercício de como a barbárie e o capital, de braços dados, não são fantasmas exclusivamente do presente.