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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

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Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Políticos não se confessam, dizem eles

Hugo Gomes, 25.06.17

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Desde cedo os italianos souberam extrair da crítica social, como política, o seu modelo cinematográfico. O neorrealismo, oficialmente nascido em 1943, é tido como uma dessas importantes visões de ousadia mordaz, enquanto que se servia de afronta para a ideia, então estabelecida, de cinema, contrariando as tendências estilísticas, filmando de forma estilizada, um realismo não estilizado (Erwin Panofsky).

Com o passar dos anos, as críticas italianas obtiveram as suas diferentes facetas, desde a comédia à lá Itália que olhava para o humor como um portento escudo no seu ataque, e o "fellinismo", esse surrealismo barroco disfarçado que se abatia anos seguintes como um novo signo de vocabulário cinéfilo. Por fim, aparece-nos a poesia de Pasolini a servir de contraste e a fervorosa veia política de Nanni Moretti a prevalecer numa despida sinceridade ideológica. Ou seja, em sangue italiano, a política como tema crítico para uma visão analista corre com tamanha agressividade nestas veias.

Atualmente, o cinema não encontra nenhum movimento artístico predefinido, e a globalização tem tido papel fundamental na diversidade de vozes, cuja única similaridade é esse tom crítico. “Le Confessioni” é o enésimo avante de discurso político, principalmente vindo da dupla Andò / Servillo, que após o sucesso de “Viva La Libertá” (“Viva a Liberdade”), onde apresentava o humor doppelganger para construir uma política de sinceridades (mas nunca objetiva na sua crítica), reúne-se para invocar um misto de referências, que vão desde uma reunião G8 e a clássica forma de thriller de Agatha Christie, passando pelas óbvias menções de “I Confess”, de Hitchcock (as personagens estão encarregues de elucidar-nos) e a estética que fora mundialmente reconhecida pela cinema de Sorrentino.

Toni Servillo é um monge de raízes misteriosas, convidado a participar em tal reunião política, a pedido do líder do FMI, Daniel Roché (Daniel Auteuil). Os motivos deste misterioso convite são revelados após o suicídio deste último. Um ataque às políticas de austeridade e às empresas que ganharam com a crise, que tanto têm a dizer para os países do Sul da Europa, como Itália. Contudo, esse mesmo ataque é feito por impasses do grotesco burguês à lá Sorrentino, mas ao contrário do realizador de “La Grande Bellezza”, Roberto Andó funciona como um impostor, copista, e essa preocupação pela estética revela-se na sua maior fraqueza, até porque o filme nada tem para dizer, para além de um extremo senso de moralismo.

Entre punchlines aqui e ali, frases que nos levam à nossa consciência moral, "Le Confessioni" é demasiado preso às suas influências. Toni Servillo é imperativamente regido pelo seu ego e o resto, totalmente inofensivo, interligando as devoções religiosas, o maniqueísmo das boas ações, como uma solução pela frieza política. Tal como diz Connie Nielsen a meio do filme, "já todos andamos fartos de contos de fadas".