Os trópicos como estado de alma do cinema português
“Bom dia, Paulo Rodrigues“. O cinema tem a tendência de se apaixonar no verão como fosse uma consolidação com uma juventude perdida, até porque a velhinha sétima arte já caminha para fora dos 120 anos de longevidade. Contudo, contrariando o vórtice de cinema para adolescentes que a indústria parece manter ligado a todo o custo, em “John From”, a segunda longa-metragem de João Nicolau (“A Espada e a Rosa”), somos induzidos a uma brisa de sentimentos quase proustianos.
É sim um filme de adolescentes, mas a motivação é mais adulta que a própria inconsequência atribuída a esse cinema de nichos alargados. “John From” é sobretudo um olhar à jovialidade como algo exótico, longínquo e distante do nosso meridiano. Para tal, João Nicolau incutiu no seu próprio bairro (Telheiras) uma metáfora prolongada e sensorial, onde o amor de verão de uma adolescente altera por completo o seu redor. Mas tal premissa é seguida palavra a palavra, a conversão de um mundo onírico que espelha num quotidiano acorrentado por um tédio, a Melanésia orientada como um estado de espírito.
Sim, é um romance de “teenagers” incompreendidos, daqueles amores impossíveis que tão bem poderiam ser imaginados por um Shakespeare, mas não, é um exercício visual, modesto e simples, onde Nicolau volta a evidenciar o seu fascínio pela natureza, pelo estado selvagem indomável e sobretudo pela metamorfose quase cíclica incutida na sua própria definição de “coming-of-age”.
É um conjunto de rituais que preenchem um filme tão misterioso, onde a névoa desse misticismo apropriado não chega a transcender para fora do ecrã. Aliás, esse niilismo em consenso com o seu simplismo indiciam uma obra que tinha tudo para prevalecer, mas falta-lhe aquele “ingrediente” que teima em não existir em muito do cinema autoral português. No entanto, o mero exercício é alcançado. “John From” é acessível sem ser gratuito.