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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Os fantasmas não só se divertem ... como também se vingam!

Hugo Gomes, 04.09.24

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Beetlejuice … Beetlejuice … Beetlejuice … nome proferido três vezes como uma maldição à lá “Bloody Mary” se tratasse, contudo, é por via dessa invocação que Tim Burton - restringido aquilo que a indústria havia se tornado, e consequentemente o encarou como um prisioneiro criativo - parece renascer, escapar das amarras e, ironicamente, deleitando a “carta branca” de uma major studios

A esperada sequela de um dos seus, e improváveis, sucessos (nem o realizador percebe de onde vem o êxito dessa obra de 1988), serviu como escape, a porta de saída de uma profunda desilusão para com a arte que prosseguiu por mais de 36 anos. Da nossa parte apontamos, não a um estilo cansado, mas à sua domesticação, principalmente sob o selo Disney, estúdio que desde o seu “Frankenweenie” (1984)  jurou não mais trabalhar, promessa rompida 26 anos depois com Lewis Carroll no coração, mas nunca na prática. 

Deixou-se amestrar até se tornar insustentável, resultado esse na forma de um elefante alado - “Dumbo” - daquelas live actions sem sal que empanturramos sem consciência. Não fora das versões mais bem acarinhadas dessa linha de montagem disnesca do fácil e do indolor, mas o Rato Mickey foi astuto em orquestrar um certo ódio insuflado a Burton, o culpado, apontaram eles na maior das malícias. O realizador frustrou-se com a experiência, quis desistir, mas antes de assumir-se na mera “tarefa” de um spin-off / série envolto de “The Family Addams” - “Wednesday” - fenómeno viral no comando da Netflix que como tudo o que é acessível nas estratégias de streaming, inconsequentemente o salvou do esquecimento. 

Beetlejuice Beetlejuice” é de matéria diferente, é um filme para estúdio, não há que negar, mas ostentando uma liberdade que quem, como Burton, ofereceu estilismos, maneirismos e estéticas adaptáveis aos mercados. Aí, a Warner prometeu fundos e mundos; da Netflix traz Jenna Ortega, a adição umbilical ao anterior papel de Winona Ryder, regressada, e com Michael Keaton como reprovado dessa fantasmagoria. O ator-”parceiro do crime” é novamente o demónio “bio-exorcista” que quebra a quarta parede com maior exatidão e liberdade que Deadpool (o facto daquele filme quebrar recordes em 2024 é de também quebrar o coração cinéfilo), porque não se resume a um alter-ego com mordaça corporacional e "cultura-pop atirada aos cacos," mas sim numa possessão burtonesca. Aliás Burton fala através desse Beetlejuice, como também o filme é todo ele pontuado por uma certa raiva enfeitada num humor ácido. 

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Tim Burton e Michael Keaton na rodagem de "Beetlejuice Beetlejuice"

No fundo é isso, sem nunca ceder ao mofo, Tim Burton faz de “Beetlejuice Beetlejuice” um filme sobre o seu tempo, não a do filme / contexto em si, mas de Burton, e como ele se vê na nova realidade, há tabefes dadas a ativismos de moda como também às corporações que o tentaram amordaçar (a piada da Disney é impagável), assim incutindo um rol de preciosidades cinéfilas em paisagens-mercantis órfãs dele. Portanto, não é somente um efeito fénix, é o inteirar-se, não de um homem novo, mas de um "sujeito" determinado em conduzir o seu cinema para épocas fora da sua. 

Vista as coisas, é mais que sequela, é mais que entretenimento desfasado para a rentrée, é um exorcismo burtonesco, delirante, descosido e sem papas na língua sem com isto envolvendo em chico-espertices ou no arrojo vanguardista. É Burton sendo Burton a prevalecer como Burton mesmo que as forças que o rodeiam sejam tão anti-burtonescas. E o expressionista "afterlife", o além-vida, traduzidamente para um inferno que nos reserva  burocracia e a extensão do modelo capitalista ... delicioso!