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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

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O sonho da esquerda em peso de ferramenta

Hugo Gomes, 30.08.16

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Qual é o valor da tua ferramenta?” foi com esta pergunta que uma das cenas mais memoráveis do documentário “Torre Bela”, de Thomas Harlan (o relato da transição ideológica de um Portugal pós-25 de Abril), se iniciou. Nesta mesma, os sonhos de uma política de esquerda, a vontade de uma comunidade, é afrontada pela necessidade e orgulho de um só indivíduo, aqui um agricultor nada disposto a ceder a sua enxada a uma cooperativa agrária.

Quarenta anos depois, Thomas Vinterberg, um dos fundadores do Dogma 95 ao lado de Lars Von Trier, dirige “The Commune”, um exorcizar de uma ingenuidade política que o realizador acolhera na sua juventude, porém, como o próprio parece demonstrar nesta sua nova obra, uma quebradiça ideia face às necessidades individuais. O casal preferido do cinema dinamarquês (Ulrich Thomsen e Trine Dyrholm), são novamente requisitados como volantes desta trama que arranca com uma herança imobiliária e um desejo de harmoniosa comunidade. Contudo, essa mesma fabricada coletividade, uma comuna entre amigos, é abalada com o aparecimento de um novo amor, uma terceira pessoa num relacionamento matrimonial de anos.

Thomas Vinterberg estende um prolongado confronto entre a comunidade e o indivíduo, salientando a “humanidade” de cada um face às ideologias políticas. Parece que este “sonho esquerdista” não é à prova de bala, neste caso de sentimentos vividos. Não com isto induzir-nos numa propaganda política e tendo em conta o calor de posições do género que afronta o nosso país (quarenta anos desde “Torre Bela” e essa reconstrução ideológica continuamos com dúvidas acerca da nossa governação e dos requisitos destas), “The Commune” é um filme que nos valida como seres específicos e personalizados e não como rebanho de uma só voz. É também o retrato de que uma correta política é uma fantasia sonhada por homens idealizados. Não existe nenhum maniqueísmo, até mesmo a democracia é aqui questionada, segundo a personagem de Ulrich Thomsen, “não é a maioria que ditará como viverei a minha vida“.

Longe da provocação fácil dos seus congéneres, Thomas Vinterberg segue o caminho mais sutil e difícil, porém, o faz com o auxílio de bons “tenores“. Neste caso, Trine Dyrholm é uma musa expressiva, uma “bomba” emocional que testa qualquer doutrina sociopolítica.