O luto que falta!
Rithy Panh prossegue na sua demanda pessoal e igualmente identitária de um Camboja que ousa em não ser esquecido, principalmente no seu registo cinematográfico. Depois de “The Missing Picture” e “Exil”, o realizador retorna às suas histórias pessoais para exorcizar o “Karma pesado do Camboja”, os horrores cometidos por um regime intolerante e ditatorial e os testemunhos (para além do seu) que perpetuam o fantasmagórico tecido da ocultação.
São relatos impressionantes e raros, novamente sublinhados pela insaciável busca do autor em conduzir toda uma memória em imagens, que aqui não faltam. Existe a criação dessas, nem que seja pelo diálogo direto da fotografia, as únicas provas de vidas passadas e obliteradas. São pessoas exclusivamente para serem “espancadas e deitadas foras” (o termo segregativo de Vay Tchaol), prisioneiros de quotidianos forçados que as reduzem a objetos viventes, arrastados por uma automatizada noção de sobrevivência (os avisos quanto à necessidade de “comer carne para sobreviver” que levam a não intencionais atos de canibalismo) e contidos aos seus “mundinhos” de miséria (quando o sal se torna a traição de um grupo de subsistência). Elementos que vão contaminando a poesia atentada de Panh que avança em paralelo por cemitérios sem dono, ao encontro de espíritos condenados a uma eternidade em vão. E por entre as florestas, que o próprio evidencia neste documento, habitadas por almas violentadas, as árvores sangram, as mediums choram pelos seus entes queridos e as máscaras confundem cada vez mais com a vegetação.
“Lutando com as imagens, continuo a chorar”. “Graves without a Name” é um objeto pessoal, sentido e vivido, e com isso, não desfazendo a sua devoção pelo cinema, Rithy Panh vai além do simples relato, vai atrás da imagem que possa fazer jus a tais palavras. Felizmente, visto que falamos de realizadores vinculados às suas causas e História, Panh não é um Wang Bing, evita a sua passividade nua e aufere dignidade ao seu ativismo.
“Tirei tantas imagens para me esquecer que estava morto”