Na centrifugação do cinema político
As Máquinas não podem parar, e o Cinema deve acompanhar todo esse processo de auto-sustentabilidade. “A Fábrica do Nada”, a quarta longa-metragem de Pedro Pinho, é esse conceito simultâneo de fazer cinema e falar de política, um retrato de um ativismo em pleno passo de reflexão. Trata-se de um filme baseado na peça de Jorge Silva Melo, por sua vez inspirada na experimentação de auto-sustentabilidade da fábrica de elevadores Otis, durante 1974 – 2016, uma ideia de absoluta esquerda a invocar os fracassos de Torres Bela.
Quando a austeridade avança ameaçando postos de trabalho, os trabalhadores tomam conta da fábrica, expulsando os seus patrões e operando através de didatismo. O “Nada” do título, é essa espera que intervala entre o “golpe de estado” e o fim do sonho esquerdista, bem como a discussão política, um avante anti-capitalista que resulta na própria consolidação com o movimento globalizado. Pinho trabalha essas ideias dando-nos um cinema que, acima de tudo, é um próprio experimento, incutindo a ficção como uma anestésica perspectiva quase mundana a uma ciência que muitos parecem evitar – a política. Sim, “A Fábrica do Nada” é para além de mais, um filme politizado que aposta numa duo-linguagem para a difusão da sua própria mensagem.
É a docuficção, como Portugal sabe muito bem fazer, em que cada caminho serve-nos como um atalho (a ficção) ou o prolongado e completo (documentário). Em certas alturas, Pinho inspira-se em Miguel Gomes para incutir a sua veia de crítica, não por via da sátira, mas na objectividade das suas imagens. De tal forma que “A Fábrica do Nada” espelha uma breve história dos gestos políticos que assombram a nossa Nação, do outro lado ele resume as tendências cinematográficas do nosso panorama recente, inclusive a nossa persistência em reter as memórias em forma de imagens. É como se a película (neste caso o digital) conservasse e servisse de uma extensa voz para estes silenciados.
O final não é eterno, mas terno, é a declaração que esperávamos imensamente no nosso Cinema, a vontade de falar politica, politizar-se, sem se definir por uma esquerda, por uma direita, por um centro, ou qualquer outro lado. Fala-nos de experiências, mas nunca de posições, nem de oposições. Apesar dos eventuais discursos resultarem em impasses de uma linguagem mais directa e menos cientificada (tal como acontecera no anterior “A Cidade e as Trocas”, Pedro Pinho receia o desperdício na selecção de imagens), “A Fábrica do Nada” é um filme obrigatório para qualquer português, e não só … Uma obra dedicada e envolvente.