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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

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Mel Gibson Airlines

Hugo Gomes, 24.01.25

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Mel Gibson baixou a garupa e aceitou um thriller de pacotilha para, talvez (teoria minha), ajudar a financiar a sua antecipada sequela de “The Passion of the Christ”. Assim sendo, e em defesa deste projeto desprovido de vida própria, não encontramos aqui nem a personalidade de Gibson enquanto realizador, nem a sua ambição, por vezes sufocante (ainda que “Apocalypto” seja uma obra a merecer uma nova revisão), nem o seu apelo popular que, ocasionalmente, cede a um oportunismo político (“Hacksaw Ridge”, um dos bélicos mais antiéticos dos últimos anos).

Neste caso, temos também Mark Wahlberg a assumir a sua canastrice – e, surpreendam-se, como tão bem lhe assenta este papel há muito praticado (mas nunca legitimado pela indústria). Aqui, ele interpreta um psicopata (hilariantemente, com problemas de calvice) no sentido mais exagerado do termo, com um plano maquiavélico para assassinar um criminoso (Topher Grace) pronto a testemunhar contra o seu mafioso "patrão", acompanhado por uma marshall incompetente (Michelle Dockery), durante uma viagem num jato privado que parte de um ponto remoto no Alasca em direção à civilização – e, consequentemente, ao “julgamento do século” (que estes filmes nos vendem como motor centrifugo do enredo).

Noventa por cento da ação decorre dentro de uma avioneta algures sobre montanhas cobertas de neve e costas desoladas, com uma narrativa que gira em torno de telefonemas e reviravoltas dependentes destes, enquanto isso, o assassino interpretado por Wahlberg permanece no aparelho com a sua falsa-astúcia e agressividade não tão eficaz (mais patético que ameaçador). Fica-se na dúvida se tudo isto é deliberadamente cómico e despreocupado ou se a pretensão se perdeu por cantos desastrados. Só que, de Mel Gibson, espera-se sempre o pesado. Aqui, num produto de série B, damos de caras com uma espécie de filme “do meio” – um formato hoje rarefeito na indústria americana, oscilando entre o cinema independente de baixo orçamento e os grandiloquentes arrasa-quarteirões.

Zombeteiro e exagerado quanto baste, mas de manque firme na turbulência da sua canastrice. Tem um qualquer aroma de videoclube. Velhos tempos!