"Linhas Tortas": porque jamais se endireitam …
Por linhas tortas, Deus escreve direito! Os desígnios do destino transmitem a natureza deste “encontro” entre duas almas conturbadas numa cidade que cada vez mais se associa ao universo das redes sociais; aqui ninguém se toca, apenas deseja-se.
Os afetos são distanciados em lugar térreo enquanto as personas virtuais se aproximam num espaço não-físico, tendo como consequência a deterioração das relações “concretas” e a sobrevalorização dessa presença espectral no digital e tecnológico. Linhas Tortas, sim, assim intitulado este filme de Rita Nunes, realizadora experiente da televisão, mas que antes revelou-se na sua curta de final de curso (“Menos Nove”, que foi premiado em Locarno), vem beber dessa (desi)interação da mesma forma que Fernando Lopes ficcionou o seu penúltimo filme: “Os Sorrisos do Destino” (2009).
Uma salada simples de elementos que graficam um espaço urbano pelas rotinas deturpadas das suas personagens, com Joana Ribeiro e Américo Silva, desafiando o antagonismo anexado ao chamado “ageismo” num romance de quarentena onde a questão de trocas de identidades vai acelerando a intriga para um iminente choque. Contudo, a procrastinação é cúmplice da passividade e esses atributos acompanham o júbilo destas identidades tecnológicas. Aqui, as redes sociais são apenas desculpas para o bovarismo das personagens, presas de um lado ao seu cinzentismo, e do outro ao pessimismo de um futuro incerto. É o tema de “Linhas Tortas” que nos leva a esmiuçar o nosso quotidiano, e sobretudo a cedência deste para com a nossa dependência virtual. A sugestão não é levada para filosofias. Mais do que poucos recursos, existe no argumento desenvolvido por Rita Nunes e Carmo Afonso uma vontade de simplificar.
Até porque é a simplicidade que dita os costumes, e é nela que encontramos a mais sincera das suas virtudes. Nunca indo além do visto, sentido e possuído, por vezes é esse mesmo simplismo que falta no seio do cinema português. E não falo do chavão de “somente contar uma história”, mas restringir-se aos básicos códigos da narração em prol de uma interpretação clara.
Há algo de fresco e revitalizado por estas bandas, e não é somente a energia trazida por «Not for me» de Bobby Darin.