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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

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Keanu Reeves continua como Escolhido para ressuscitar sagas

Hugo Gomes, 16.12.21

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É no meio de uma reunião “brainstorm” para determinar os novos trilhos do legado “Matrix” que alguém retoricamente questiona - “Que palavra hoje define ‘Matrix’?” De seguida, a resposta surge como contraditório, visto não ser uma mas duas palavras - “bullet time”. 

The Matrix Resurrections", o novo acordar de uma saga milionária da Warner Bros., é hoje tida como um mero e progressista brinquedo visual, uma referência estética que redefiniu uma linha de montagem cinematográfica nos inícios do século XXI, como sua, ironicamente, passagem de testemunho. Nesse sentido, se o vamos ver como uma continuação dos portentos técnicos ou desafiadores do cinema de ação, então esta sequela / reboot órfã de um dos seus realizadores (fica Lana, vai-se Lily Wachowski), é uma tremenda desilusão.  

Por sua vez "Resurrections" brinca com a relevância cultural e até mesmo teológico que contaminou o mundo atual com o inaugural episódio de 1999, um caso de sucesso que bebeu das mais diferentes fontes e mesclou uma originalidade frankensteiniana. E funciona, até ao seu segundo ato, como um exercício metalinguístico do referido fenómeno, um ensaio de auto-reflexão daquilo que o Matrix representa e continua a representar numa sociedade moderna (tendo mesmo encontrado alguns pontos comuns com a contemporaneidade pandémica).  

Porém, o frenesim dissipa-se, revelando os calcanhares de Aquiles de muito cinema pós-Matrix que os (ou as) Wachowski produziram até hoje, a dependência do sentimentalismo como Deus Ex Machina. Se bem que "Resurrections" brinca com essa dualidade como um advogado do Diabo, cometendo as mesmas tropeções e de seguida troçando desse igual passo, este efeito Lazarus nada acrescenta à mitologia e até mesmo ao contexto fílmico atual. 

Enquanto em 1999, o cyberpunk minado de dicotomias entre luz e escuridão, bem e mal, prisão e liberdade, conformismo e risco, carne e máquina, foi um filme fora do seu tempo, esta “versãozita” é substituída por um colorido, artificial (se bem que este adjetivo soa irónico numa saga que sempre aprimorou o seu lado digitalizado) e esgotadamente estrutura sem ideias, aliás, a prática da inequívoca associação do “bullet time”. Uma reencarnação despreparada.