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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

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Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Jeremy Irons apanhou o comboio errado para Lisboa

Hugo Gomes, 12.06.14

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Sou suspeito, reconheço que sinto um certo entusiasmo, como também conforto, em conhecer trabalhos de cineastas estrangeiros que utilizam o nosso país como o cenário perfeito das suas intrigas, sejam eles Wim Wenders, Roman Polanski ou Fred Schepisi. Neste caso é o repetente Bille August em conjunto com o igualmente Jeremy Irons, realizador e ator que vinte anos antes transformaram as paisagens alentejanas na Argentina em meados da revolução num embrião de "soap opera".

Agora a dupla "turística" adaptam o livro de Pascal Mercier, Night Train to Lisbon e regressam ao ambiente de guerrilha, com o 25 de Abril como pano de fundo numa história existencialista de um professor de latim na Suíça, guiado pela monotonia da vida que em fidelidade com um raro livro que encontrou por acaso e sem nada a perder, parte de viagem para a capital portuguesa. Uma jornada ao encontro de referências históricas de uma nação e com isso em busca das convicções de vida que havia perdido durante a sua existência.

Infelizmente Night Train to Lisbon tenta abordar muito, mas não passa de um "europudim", de um catalogo turístico que apresenta Lisboa como um ótimo lugar para férias no convívio dos locais do que uma cidade rodeado de história e intriga cruciais. É como Bille August desconhecesse a essência do 25 de Abril, os seus valores, os seus significados, os seus protagonistas e as suas mazelas. A lição foi pouco estudada e graças a isso o realizador decide envergar pelos lugares-comuns do cenário de guerrilha e revolta, temos aqui a nosso dispor uma aspiração aos Parisans, mais do que a própria resistência portuguesa. Para além de um país mal retratado (será possível que toda a gente em Portugal fale inglês fluentemente?), Night Train to Lisbon verga ainda pela preguiça narrativa (o flashback como elo de narrativas paralelas e não lineares, pior, servindo num impasse pastelão da mesma).

Eis um filme conectado pela vulgarização do formato televisivo, sem nunca atingir a sua espetacularidade e sem nunca descolar do panfleto. Aqui, nenhum dos atores, nem mesmo Jeremy Irons (por mais bom protagonista que seja) conseguem destacar-se do mero esquematismo, aliás espaço para tal não o têm. Depois e apelando um pouco ao patriotismo, é "notável" assistir a tanto desperdício de atores e terreno luso. Esta não é a Lisboa que consegui, a Lisboa que vivo, muito a menos a Lisboa que imaginava para o cinema. Valeu a tentativa, mas é supérfluo!

 

Given that we live only a small part of what there is in us - what happens with the rest?