Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]

Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Há vida depois da morte?

Hugo Gomes, 26.10.17

4-jigsaw-1024x683.jpg

Let’s the game (re)begin!” A saga de terror mais lucrativa regressa passados 7 anos, sob os moldes de reboot, acima do seu vendido teor de homenagem. Iniciado em 2004, “Saw”, do na altura desconhecido James Wan, consolidou-se como uma instantânea obra de culto, pelo arriscado passo do fascínio pelo serial-killer em tempos que a consciência moral debatia-se com a violência do género, colocando e recolocando tais temáticas a séries restringidas, longe do mediatismo industrial, e com um argumento em existência com o seu twist final.

Sim, parece uma tendência “shyamaliana”, algo que veio a transfigurar-se caricaturalmente na marca do realizador de “The Sixth Sense” e “The Village”, que Wan apropria, devolvendo o fator surpresa a esse dispositivo narrativo. Poderia ser um fracasso, mas não foi. Ainda hoje, o público que experienciou em tempo real “Saw” como um OVNI / incontornável thriller do ano, relembra o twist como impulso de deslumbramento, e consequentemente a estrutura óssea dos capítulos seguintes. Capítulos, esses, que se foram desenvolvendo com uma periodicidade anual e assídua (Halloween era a meta de estreia), dando no seu total um franchise composto por 7 filmes (8, se incluirmos este “Jigsaw”), impressionante exemplo de como os baixos custos consistiam sobretudo em surpresas de box-office.

O suposto último capítulo deu-se em 2010, uma manobra estratégica de “matar dignamente” o “menino” que tem erguido a produtora Lionsgate. O resultado, esse, foi decepcionante e “Jigsaw” foi “definitivamente” enterrado. Rest in Peace.

Porém, no cinema, nada morre, e é quase regido aos mandamentos de Lavoisier (“nada se perde, tudo se transforma”). Neste caso, o franchise converte-se num lutador exausto pronto para o segundo round, contornando os espinhos narrativos deixados pela ronda anterior. Agora sob a batuta dos irmãos Spierigs (“Predestination”, “Daybreakers”), este “Jigsaw”, que muito bem poderia intitular-se de “Saw: Legacy”, é um espécime que deambula na sua sala de troféus, as armadilhas em modo “jogos sem fronteiras” motivadas por falsos moralismos e falsos profetas. O argumento não há que saber, é o gore arrancado de um causa-efeito, com personagens de papelão a jogarem numa perfeita sala mortuária.

E quanto ao twist final? Sim, o “surpreendente” final está lá, como manda a lei “saweana”, automatizada e devidamente questionada. Porém, não recomendável a tal, porque no fundo nada faz sentido. Aliás, a existência deste filme não faz sentido algum. Todavia, sabendo que as verdades devem ser ditas (neste caso escritas) a todo o custo, a dupla de realizadores apresenta um trabalho mais proporcionado, mais sereno e sóbrio, do que as confusões reféns das montagens rápidas à lá MTV que a saga sempre nos apresentara (sim, James Wan foi o responsável pela tendência, as sequelas apenas usaram hipérboles desse mesmo estado).