Este país não é para Daniel Blake
Ken Loach continua a sua luta pelos direitos da classe operária, tentando denunciar um sistema falível de Segurança Social e o peão dessa sua experiência propagandista é Daniel Blake (Dave Johns), um carpinteiro de meia-idade sob graves problemas cardíacos que luta contra a burocracia em prol dos seus direitos enquanto cidadão. Neste caso, uns “trocos” para a renda semanal era mais que bem-vindo, mas uma realidade cada vez mais difícil perante uma sociedade que não integra nem deixa integrar. Não é mais uma citação de “este país não é para velhos”, trata-se sim da busca pelo orgulho do proletário, e toda a propaganda que é assim afinada, não validando, portanto, a emoção dita cinematográfica, quase emprestado aos grandes crowd pleasures de Hollywood.
No ano passado, assistimos igualmente na competição de Cannes “La Loi du marché”, de Stéphane Brizé, um filme muito apegado ao realismo que reduzia o ator Vincent Lindon ao desespero enquanto desempregado. Ao contrário dessa obra, Ken Loach apela à emoção como veículo de luta e o seu apoio neste teor contrai maravilhas para o espectador. Em simultaneamente com os vínculos de realidade formal que esboça nesta desesperante jornada de um homem que acima de tudo deseja ser tratado como tal e não, como é referido a certa altura, num cão.
Mais do que um ensaio precário à lá Laurent Cantent, “I, Daniel Blake” apresenta-nos outras importantes questões na nossa sociedade, entre os quais a apresentação da tecnologia não como um facilitismo, mas como um obstáculo para a população mais envelhecida, e o facto desses sistemas de Segurança Social apoiarem quase exclusivamente no informático. Existe particularmente uma sequência onde Daniel Blake revela uma cassete de música a uma criança, sendo que esta desconhece por completo tal formato físico. Isto tudo para dizer que os tempos constantemente mudam e não dão tréguas a quem continua presente no “século passado”. Emotivo e igualmente furioso.