Conheçam o “Frankenstein” e a sua criação
Era fácil “Big Fur” cair na paranóia ou redigir-se nas proféticas tertúlias de loucos, mas existe um ponto a seu favor: o taxidermista Ken Walker é somente um dos melhores e mais respeitados da sua área, logo não estamos a lidar com delírios.
Para Ken Walker, a taxidermia é mais que um hobbie, é uma arte eclética e sobretudo desvalorizada, a “criação de uma ilusão de vida que não difere de um truque de magia” (parafraseando o artesão), que lhe garante as ferramentas necessárias para executar uma “fantasia”. Quer dizer, para alguns, mas para Walker é bem real. Falamos do Bigfoot, o Pé Grande, o Sasquatch; diversos nomes para uma criatura símia que julga-se viver nas densas florestas da América do Norte, e que foi apanhada em vídeo em 1967, um registo ainda hoje discutido quanto à sua veracidade.
O taxidermista jura a pés juntos que o viu e como tal decide recriar esse testemunho na sua arte. A grande oposição neste ato é que Walker não é nenhum parolo; o seu conhecimento da fisionomia animal garante-lhe a legitimidade no processo deste documentário, quer na exploração do mito, quer na sua vida afetiva e profissional, que de certa maneira se diluem.
“Big Fur” assume-se como um documentário em torno de um único caso de estudo, mas trai-se a si próprio, oscilando por temáticas ou abordagens que vão muito mais além do que o somente o “sonho molhado” do Pé Grande ou dos excrementos congelados guardados no frigorífico de Walker, que, segundo este, tratando-se de uma prova da existência da besta mitológica. Contudo, Dan Wayne consegue uma obra modesta e tratada com uma certa leveza alucinante, mesmo que despachada pela gula de um realizador inexperiente ao sabor dos tiques televisivos.
Quanto às questões levantadas, estas continuam intactas até ao genérico final, encarando-se como uma espécie de visita guiada ao “ninho de cucos“, que só nós, espectadores, assumimos como uma presunção de “superioridade moral“. Portanto, é ver sem julgar os focados, porque há mestres nas artes mais menosprezadas, e nem sempre queremos saber.