Como peixe na água ...
Foram precisos 15 anos para que o Mundo estivesse preparado para uma sequela de “Avatar”. O tempo, segundo James Cameron, foi necessário para aperfeiçoar a tecnologia, essa, capaz de consolidar com a visão secretamente permanecida na memória do realizador. O feito havia sido cumprido através do primeiro - esse estrondoso êxito já planeado desde 1995 e apenas materializado num CGI sofisticado em 2009 - a passagem de uma nova década de cinema e de onde convém afirmar a época depois de “Avatar” na indústria (o qual nunca mais foi a mesma).
Durante a promoção deste regresso ao universo que o próprio concebeu de raiz - Pandora - Cameron teceu duras críticas à abundância e à qualidade de muitos efeitos visuais em inúmeras produções hollywoodianas, nomeadamente aos episódios marvelescos (os dominantes do mercado atual), que usufruem as possibilidades do CGI em modo de máquina de montagem. Um facilitismo apoiado nessa tecnologia estagnada, enquanto que o realizador utilizava esses avanços tecnológicos como progressão para a sua própria “ciência”, mantendo-se na crista do constante upgrade. Se houve esse pós-Avatar, obviamente existirá um pós-Avatar 2, esta história tecnológica a passar em frente dos nossos olhos, até porque Cameron sempre assumiu como um catalisador quanto a esse percurso paralelo à forma e às fórmulas - seja “Aliens” (1986), “The Abyss” (1989), obviamente “Terminator 2: Judgment Day” (1991) e porque não “Titanic” (1997) - a megalomania das suas produções estabeleceram marcos delineadores no terreno que muitos trilharam para o alcançar. Ignorar “Avatar” nesse contexto, é equivalente a enterrar “Matrix” dos(as) Wachowski como mero frenesim sci-fi, ignorando uma indústria que se moldou à sua imagem (no caso deste novo “Avatar”, muito do CGI brindados nos últimos dez anos, automaticamente tornaram-se obsoletos) .
Quanto à revisitação de Pandora, a experiência cinemática mantêm-se no seu esplendor, é a sensorialidade que continua a motivar espectadores das mais diferentes classes, estirpes, origens e identidades [vi-o numa sessão comercial em pleno dia de estreia, lotado e interagido com o público], é a promessa de algo deslocado às suas realidades que os encanta, é o fazer uso da mais básica “propaganda” das comerciais cadeias de cinema - “levar-nos a mundos diferentes, nunca antes vistos”. Porém, se o primeiro nos prepara esse carris circense com uma longa introdução quanto à sua distopia, da básica carne até à transfusão totalizada num corpo digital, o planeta abundante de selvas que acerca e afaga a narrativa, aqui, neste segundo tomo, somos levados sem anestesias algumas a esse mundo, 13 anos depois. Os nossos olhos não obtiveram aviso prévio para o “mergulho” digitalizado, Cameron confiou em demasia na sua imaginação para nos hipnotizar, basta dar um passo para cedermos a precipício.
“Avatar: The Way of Water” será pintado nesse deslumbre na cultura popular, mas revela-se fruto de obsessão do seu criador, meio umbiguista que nos remete aos diversos manuais ou auto-ajuda para que finalmente tenhamos o “gosto” desse seu canto secreto. As selvas dão lugar a recifes esplendorosos, e aí uma nova cultura de raiz entra na “goela” do espectador. Como peixe na água, Cameron nada nessa biosfera que tanto ama, esquecendo por vezes da sua história, da sua intriga e das relações que promete enquanto base da sua programada viagem. Se é verdade, que o próprio nunca vangloriou de ser o melhor “escritor”, a sua arte encontra-se no visual, espampanante visual convém sublinhar, e na sua concepção, também não é mentira alguma que não se trata de um verdadeiro mentecapto em matéria de construir simples e básicas linhas de “storytelling”. A narrativa é de apelo popular, funciona nesses moldes, não necessita de mais, porque “pagou-se” bilhete para distanciar da nossa realidade.
O azul apodera-se, desta vez, abrindo caminho, e não somente de água, e sim para possíveis sequelas, já pensadas pelo seu autor. Fica a questão do quão tempo iremos esperar, e que novas progressões Cameron irá preparar no futuro.