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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

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Bora lá e tudo a magia levou

Hugo Gomes, 04.03.20

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Primeiro de tudo, é um filme da Pixar“. É desta forma que começa a Julia Louis-Dreyfus, numa flash-interview, por apresentar a sua personagem e o filme “Onward: Bora Lá” à imprensa. A atriz, que se celebrizou na série “Seinfeld”, encarna a progenitora da dupla protagonista desta nova animação de um dos preciosos sectores da Disney enquanto império do audiovisual, a Pixar, que verdade seja dita, tem caminhado numa peregrinação própria nesta indústria.

O legado é hoje encantadoramente sólido, histórias maduras sem nunca direcionar o leme para fora do imaginário infanto-juvenil, e com um cuidado especial na textura emocional das suas personagens e dos respectivos conflitos. Mas após anos e anos de batalhas interiores para concretizar o apetite de originalidade e delicadeza, parece que é desta que a Pixar deixa a nu os seus truques vencidos e vencedores. Em “Onward”, num mundo fantástico alternativo e pós-moderno (um pouco na sombra de “Bright”, aquele policial de Los Angeles com Will Smith e orcs à mistura), somos conduzidos a dois irmãos elfos que embarcam numa jornada para voltar a ver o seu falecido pai. Ou seja, voltamos à velha história dos parentes ausentes, das emoções contidas, do simbolismo sentimental e, por fim, aquelas epifanias lacrimantes. Tudo cuidadoso, armadilhado e … kaboom … conseguido na sua essência de bomba calórica de comoções fartas- E é nesse aspeto de missão cumprida que duvidamos da sua genuinidade, assim como da criatividade desses enfeites e artifícios.

Obviamente, que para muitos essa “manipulação” é uma experiência intrinsecamente sensorial que anseiam (re)viver, porém, fora o digno twist e as chamadas de atenção à nossa sensibilidade, “Onward” perde-se numa aventura rotineira, pouco imaginativa, apenas vingada com um humor astuto e, como parece ser lema na “fábrica” Pixar, minuciosamente calculado.

Talvez seja esta a prova, mesmo face às faíscas que surgiram nos seus últimos anos de produção (da importância da melancolia no crescimento pessoal em “Inside Out: Divertidamente” ou a memória sentimental que requisita o mito de Fedro em “Coco”), de que o estúdio está a deixar-se levar pelo automatismo.