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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

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Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

As santas "martíres"

Hugo Gomes, 23.05.15

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Muitos filmes tentaram abordar o tema, mas de momento ”Las Elegidas” detém a proeza de conseguir uma exposição de um problema tabu com toda a frontalidade e controvérsia. Mas atenção. Fá-lo sem com isso ter de recorrer à exploração gráfica. David Pablos concentra aqui uma história de ouro, não no sentido da originalidade ou complexidade, mas sim no desafio em recriar uma trama que mantém-se a léguas do já visto e revisto na forma de melodrama ou novela.

A prostituição infantil é um dos problemas mundiais que deve ser sobretudo combatido, porém, “Las Elegidas” não se comporta como um panfleto moralista com fins pedagógicos ou instrutivos. Ao invés disso, o filme joga a sua ambiguidade, sempre pressionada, para refletir e mobilizar as audiências com a invocação simples do drama. Talvez seja este um dos motivos pelo qual a obra funcione como uma dolorosa experiência visual e emocional.

No seio deste retrato social, seguimos uma adolescente, Sofia (Nancy Talamantes), que se encontra apaixonada por Úlisses (Óscar Torres), um rapaz um pouco mais velho que ela. A jovem é feliz, contudo, está longe de saber que o seu namorado provém de uma família de mafiosos. Família essa que tem como principal negócio o rapto de adolescentes e a prostituição das mesmas. Apanhada nesta teia corrompida, Sofia é agora obrigada a ser uma mercadoria sexual. Gradualmente vai perdendo a esperança de um dia poder rever a sua família, enquanto Úlisses prepara outra vítima para o seu legado familiar.

David Pablos recria um México pastiche, mas não totalmente plástico na sua conceção. A ferocidade com que aborda o tema e o desafio com que executa, algo fora dos parâmetros maniqueístas e facilmente moralistas, torna “Las Elegidas” numa experiência de outra dimensão. O choque é unânime, visto que Pablos não arreda pé nessa sua frontalidade e sem se conduzir pelo grafismo, usufrui do poder da sugestão como uma arma de destruição massiva. O repúdio do público perante esta manobra é suportada ainda pelo som, o qual tem aqui uma importância fulcral na conjuntura emocional. Os desempenhos suportam igualmente o peso da narrativa.

Incisivo, negro e diversificado no seu olhar, o difícil mesmo é sair do visionamento com indiferença. Poderoso!