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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

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Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

A vida é um teatro vertiginoso.

Hugo Gomes, 06.01.23

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Não sou de Teatro, por isso perdoem-me a falta de menção quanto à sua, pelo que percebi, longa carreira teatral, mas é no Cinema (a minha arte, o meu mundo) que recordo Christine Laurent em pleno. Trabalhou como intérprete em “En haut des Marches” de Paul Vecchiali, foi colaboradora fundamental de Jacques Rivette (no fenomenal “La Belle Noiseuse”, por exemplo) em questão de argumentos, e ainda realizadora de quatro longa-metragens, entre as quais “Vertiges “(1985), com Magali Noël, a "crush" coletiva de uma cidade em “Amarcord” (Federico Fellini, 1973), o eternizado “Jim” (“Jules and Jim”, François Truffaut) Henri Serre, Luís Miguel Cintra, Maria de Medeiros (meio donzela, meio “boneca de trapos”), Jorge Silva Melo e um muito “patusco” Manuel Mozos.

Uma obra acima do “teatro-filme”, segundo a conotação redutora do termo, tratando-se de um longo travelling em redor de uma gerada e multinacional comunidade, uma comédia de enganos, um drama de verdades, um ensaio sobre as relações aí nutridas. Mas sobretudo um passeio pela nocturnidade lisboeta, por entre bares e cafés nos subúrbios de um teatro, esse seu mundo que apenas o vejo graças aos seus olhos cinematográficos, cuja ópera “As Bodas de Fígaro" é resumida numa espécie de “macguffin”, num esforço contínuo, quer de talentos, de criatividades ou de fisicalidades, transgredindo o palco, os seus bastidores (aquela divagação pelos camarins, pequenos “mundinhos” dentro de um complexo ecossistema) e fora desse território que Christine tão bem conheceu, um filme que relaciona arte e vida como mútuas influenciadoras.

Vi-o, pela primeira vez, na Cossoul, em 2018, numa sessão especial apresentada por Luís Miguel Oliveira, que me convenceu por uma razão, simples e apenas, “é um filme raro, não o encontrarás na 'internet' [foi o que bastou!]”. Fica o desejo, gostaria de rever essa raridade mais uma vez, novamente em sala, e novamente numa noite de domingo, esse maldito e melancólico dia. Soaria-nos diferente esse regresso, quem sabe, através da lente para o mundo de Christine nos deixou.

Christine Laurent (1944 - 2023)