A rebelião do faducho, a normatividade em tela
Da génese à intimidade, e a meio, uma refeição "vegana" (será assim que se chama?, pergunta alguém perante tachos e cogumelos), depois, há os concertos, os preâmbulos de cada canção, uma chamada, uns quantos gestos de provocação na promessa de uma revolução sexual e identitária. É o Fado Bicha, ou, no plural, "As Fado Bicha". O artigo, e com ele o género, é fluidez.
É desta forma que Lila Tiago e João Caçador se apresentam a Justine Lemahieu, a realizadora que decidiu acompanhar a dupla durante um ano. A motivação: este filme, o descortinar das suas sombras e cores, e a concepção de um novo disco - frankensteiniano, como aprovam - reunindo fado e outros timbres, do tradicionalismo ao progressivo, entre o suspiro e o melódico grito. É certo: este pedaço documental não defraudará as expectativas de quem já os segue, quem apenas pressente, ou quem se revê nas causas que os artistas elevam. O filme não carrega o esforço hercúleo de converter os incrédulos, nem pede sorrisos forçados a quem torce o nariz. Como tantos outros, é chamado pela curiosidade dos fãs, dos atentos, dos ainda-por-ser.
Mas convém reforçar que para um filme sobre uma dupla tão pulsante — em palco e fora dele —, não se sente o ímpeto de contornar a convencionalidade formal, a normatividade que estas produções parecem ter abraçado. Nesse sentido, "As Fado Bicha" não rezam as mesmas orações dos seus protagonistas; não captam a sua essência, nem o espírito. Tornam-se mensagens formulaicas, sem acompanhamento. Mas pronto. Há que saber que o André da peixaria gosta do Chico e a mãe não consente. Entre outros êxitos.