O Cinematograficamente Falando … conversou com o cineasta libanês Ziad Doueiri, que se encontra em Portugal para apresentar a sua última obra, “L'Attentat” (“O Atentado”), o filme de abertura do Judaica: 2º Mostra de Cinema e Cultura (27 - 30 de Março) para depois estrear nas nossas salas de cinemas a partir do dia 3 de abril. Oriundo da capital libanesa, Beirute, Doueiri seguiu com 20 anos para os EUA para formar-se em Cinema pela Universidade de San Diego.
Iniciou-se no ramo em 1987 como electricista na comédia de Tina Hirsch, “Munchies”, para depois destacar como operador e primeiro assistente de câmara em inúmeras produções de Hollywood, nomeadamente os diversos filmes de Quentin Tarantino, o qual é diversas vezes denominado por "Tarantino Protégé" (The Hollywood Reporter). Face a tal título, o autor pediu para não o associarem ao realizador de “Pulp Fiction”, chegando a sugerir a utilização de uma t-shirt com "I'm not associated to Tarantino" impresso para as futuras entrevistas, contudo confrontando com a questão "como foi trabalhar com o cineasta norte-americano", Doueiri revelou que era apenas um "tecnical guy", mas que adquiriu boas experiências nessa sua fase.
Depois dos referidos trabalhos técnicos, Ziad Doueiri estreou-se como realizador a solo em 1998 com “West Beirut”, uma obra tremendamente elogiada que contou com um vistoso currículo no circuito dos festivais de cinema, tendo consagrado com o Prémio François Chalais no Festival de Cannes desse mesmo ano. O realizador voltaria a dirigir em 2004 com “Lila Says”, também ele bastante elogiado, ambas as obras o tornaram confiante e possivelmente apto de adaptar um livro tão delicado como “L'Attentat” de Yasmina Khadra, a história de um médico palestino, Amin Jaafari (Ali Suliman, “Paradise Now”), que tenta provar a inocência da sua falecida mulher, acusada de atentado suicida, nem que para isso tenha que descer às "profundezas" do fanatismo religioso.
L'Attentat (2012)
O filme que se assume como um drama intimista com toques de thriller, expõe ao espectador inúmeros dilemas do foro social, político e religioso, mas Ziad Doueiri desaprova essa "perspectiva política", ao invés disso, o autor refere uma visão dramática, a criação de uma ênfase dramática arrebatadora sobre um homem em busca das várias vertentes da verdade, nada mais. Salienta a força do enredo e do ator em conjunto com a sua personagem, que de optimista se converte num "moralmente falecido", sendo possível "sentir o personagem face à sua decrescente jornada". Em relação ao optimismo inicial do protagonista, Ziad Doueiri não partilha a tal visão em relação ao seu país de origem, porém esta foi a única sugestão político-social que declarou durante toda a conversa, tendo negado as supostas segundas intenções no seu drama.
O realizador afirma que o seu trabalho foi sincero, incapaz de enviar tais mensagens ao espectador, aliás como o próprio acrescenta "nem eu sei que mensagem devo enviar". Segundo este, a ideologia que muitos espectadores, críticos e jornalistas constataram no seu filme advém simplesmente das personagens e da trama forte que conseguiu construir, referindo Oliver Stone como um dos exemplos deste seu modus operandis, "uma sólida história e personagens frente a uma mensagem". O realizador ainda abdica da coragem de que foi apontado, "não sou corajoso, nem é a coragem que preenche a minha agenda como realizador", mas adianta que "filmes como estes não são fáceis de fazer", e confrontando com o facto de vir a surgir eventuais consequências em remexer sensibilidade sociais, a religião é e sempre será uma "dor de cabeça", revela não sentir qualquer receio em relação a isso.
Quanto aos estereótipos árabes nos filmes ocidentais, Ziad Doueiri afirma que os "americanos estão a mudar a sua perspectiva em relação aos árabes" e que por isso a invocação de tais estereótipos é completamente descabida mesmo em Hollywood. Para finalizar o realizador anunciou, sem aprofundar, pormenores acerca do seu futuro projecto, “L'Insulte”, que será filmado em Beirut, "um drama de tribunal que estou a escrever com a minha mãe", sendo o Direito algo geracional para ele, revelando as suas origens, uma família quase toda ela ligada ao ramo (a mãe é advogada e os tios que são juízes).