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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

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200 Milhões de dólares para o "boneco"

Hugo Gomes, 27.07.22

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Num cenário de destruição e de pirotecnia variada ocorrida numa praça de Praga, a personagem de Ryan Gosling [o nosso “herói”, ou será antes “anti-herói”?], algemado a um banco, tenta se abrigar e esquivar (com êxito) da “chuva de munição” que aquela mesma sequência proporciona. Longe do alcance daquele espectáculo anormal, mas observado todos os passos por via de um elaborado sistema de vigilância, Chris Evans [aqui definido, e sem sombra de dúvida, como vilão] esperneia furiosamente pelo facto, e que passo livremente a citar, de ninguém conseguir atingir em naquele “fulano” acorrentado. 

Aqui, é de invocar um dos badalados mandamentos da lógica batida do filme-espectáculo, hoje estabelecidos como clichés em modo auto-paródia: a má pontaria dos antagonistas perante o herói do enredo, a outra subjacente, é a sua evidente sorte para escapar “ileso” aos proporcionados obstáculos. “The Gray Man”, dos irmãos Russo (“The Avengers: Endgame”), não inventa nada nesse sentido, nem mesmo é apontado como o último da sua espécie, mas é surpreendente (talvez seja a minha ingenuidade a manifestar-se) que a Netflix tenha apostado 200 milhões de dólares (até à data o seu filme mais caro) para conduzir-se em lugares-comuns em contracurva com outros lugares-comuns numa ação globalizada, visto e revisto nos anos 90 e em início do novo século. Hoje em dia, essas vertentes instalaram-se (ou antes "acomodaram-se"), ora em franchises duradouros (“007”, "Fast and Furious”), ora nos atributos e nos "cojones" da fisicalidade de Tom Cruise (“Mission: Impossible”). 

Quanto aos “outros”, chuviscos que a Netflix anseia capitalizar. Experienciamos tal com um formatado “Red Notice” (Rawson Marshall Thurber, 2021), uma reunião estrelar que antecede a este “The Gray Man”, que por si só piscar para uma futura saga. Ambos os exemplos situa-nos num impasse quanto à sua criatividade e engenhosidade na execução, por outras palavras, não existe Cruise e os seus arriscados stunts - como se fosse um espectáculo a merecer o bilhete - que salve, ou dos backgrounds definidos dos seus protagonistas (um “007” não necessita introduções elaborados, o espectador sabe para o que vem), resultando num joguete de ação “bombista” (explosões atrás de explosões sem um mínimo de consequência) ou dos chavões emocionais, intervenientes numa aparente narrativa que se pretendia fluída  - papas para alimentar um espectador menos atento [a inserção de uma “sobrinha” como motor sentimental e humanista do “herói”]. Coloca-se um macguffin, acelera-se na edição (o travão é território interdito), o mesmo acontece na interação entre personagens e até mesmo numa câmara que teima em não fixar num ponto sequer (mesmo no estático há que dar movimento, não vá o público aborrecer pela "inércia", segunda a sua lógica), enfim, inúmeras parcelas para estabelecer uma fórmula. 

E pronto, é isto, 200 milhões (era mesmo preciso?) para lubricar cinema algorítmico, e que tendo em conta as recentes notícias, o “feito” resulta … vem aí mais “The Gray Man”! 

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