Entre Rivais!
Muito tenho confrontado com as banalidades formais do cinema mais académico, muitas vezes próprio do sistema de Hollywood ou do formato mainstream. Contudo assumindo que o vosso escriba não é de “ferro”, eis que surge por vezes obras fieis aos signos técnicos e inerentes do cinema acima referidos que conquistam não com a sua irreverência mas paixão que emanam. Verdade seja dita, o cinema também ele deve ser preenchido com paixão. Um desses casos é Rush, a nova obra de Ron Howard que nos remete às pistas de Formula 1 como palco para uma das concentradas e espirituais rivalidades emergidas no cinema norte-americano nos últimos anos.
Não se trata aqui de tornar o filme mais naquilo que é, mas sim destacar o seu dinamismo, a sua essência apaixonante com que transfere tais “energias” para a trama e sim, a continuação do espetáculo hollywoodesco tal como ele é, pomposo, manipulador (neste caso no bom sentido), ambicioso e profissional. Porém, Rush tinha tudo para falhar, a começar pelo seu realizador, Ron Howard, que é capaz do melhor (Frost/Nixon, Apollo 13) como do pior (The Da Vinci Code, The Dilemma), um dito “empregado do mês” pelas bandas de Hollywood que tira partido do profissionalismo e na precisão de Peter Morgan (o mesmo argumentista de The Queen de Stephen Frears) para culminar um guião enraizado na rivalidade dentro e fora da pista. Rivalidade, essa, que a dupla (realizador / argumentista) consegue eficazmente transmitir sob um teor quase poético, mas acima de tudo pessoal, que é evidenciado com inspiração na sequência final (que funciona como uma “cereja no topo do bolo”).
Por outro lado a conexão rival entre os dois pilotos de Formula 1 é realçada e concretizada graças ao desempenho da sua dupla, surpreendentemente o limitado Chris Hemsworth (Thor) funciona na pele de James Hunt, um fútil, playboy e acima de tudo instintivo corredor que entra em pleno contraste com o reservado, lógico e calculista Niki Lauda (um excelente Daniel Bruhl). É este círculo fortalecido que interliga ambos os campeões de Formula 1 que converte Rush num autêntico “poço de emoções”, mesmo que o filme em si nada de novo demonstra em termos cinematográficos, aliás o seu modelo é demasiado “certinho”, académico por outras palavras. Até mesmo as corridas, um dos focos principais de intensidade, energia e emoção, são verdadeiros conjuntos lugares-comuns ou clichés quer a nível argumentativo ou de caracterização como a nível técnico (os constantes slow-motions, a orquestra que “abraça” o ruidoso barulho dos motores e os relatos dos comentadores durante as “partidas” que adquirem um certo caracter messiânico).
Depois temos aquele que possivelmente seja o “calcanhar de Aquiles” da obra inspirada de Ron Howard, a representação da vida pessoal dos seus dois protagonistas que é tão esquemático ou abundante de personagens descartáveis (Olivia Wilde é praticamente inútil) ou fracamente construídas em termos de caracterização. Todavia, Rush – Duelo De Rivais contorna tais fragilidades e através de peças já recriadas, constrói um filme de uma força relevante, sonante como o “arrancar” das viaturas de Formula 1. Mas mais do que uma reconstituição desportiva, Ron Howard nos cita filosofia pura sobre a essência da competição e a sua inerência quer prejudicial ou benéfica. Uma história verídica incrível que original um filme de igual forma. Emocionante!
“I feel responsible for what happened. / You would... but trust me: watching you win those races, while I was fighting for my life, you were equally responsible for getting me back in the car.”
Real.: Ron Howard / Int.: Daniel Bruhl, Chris Hemsworth, Olivia Wilde, Alexandra Maria Lara
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