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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

Tom Sizemore (1961-2023), um bravo secundário americano

Hugo Gomes, 04.03.23

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True Romance (Tony Scott, 1993)

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Blue Steel (Kathryn Bigelow, 1990)

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Strange Days (Kathryn Bigelow, 1995)

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Natural Born Killers (Oliver Stone, 1994)

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Red Planet (Antony Hoffman, 2000)

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Heat (Michael Mann, 1995)

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Saving Private Ryan (Steven Spielberg, 1998)

Spielberg no horizonte de Spielberg

Hugo Gomes, 22.12.22

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“Art will give you crowns in heaven and laurels on Earth, but also, it will tear your heart out. Art is no game! Art is as dangerous as a lion's mouth. It'll bite your head off.”

De “coming-to-age” com paixões cinematográficas ao barulho, o “inferno” anda abarrotado. Recentemente presenciamos Kenneth Branagh, Paolo Sorrentino, de certa maneira Abdellatif Kechiche e, futuramente ainda teremos Vicente Alves do Ó [com o ainda em produção “Malcriado”], cada um com o seu “Cinema Paraíso”, porém, as propostas não faltam, uma tentativa encontrada para falarem de si próprios através do cinema com conversa direta para com o cinema, a sua paixão e por fim, a função que os acompanhará até se tornarem realizadores feitos. Biografias ou mistelas ficcionais, são remontagens ao redor do seu umbigo, uns mais fascinantes que outros, certamente, mas que não deixam de ser tendências que qualquer um “tropeça” enquanto ambição, egotrip esbarrada na tela para ostentação mundial. Fellini abordava tais campos no seu zênite intitulado de “8 ½” (1963), uma carta-vanitas sobre os seus tramas, os seus devaneios, as suas projeções enquanto autor que solenemente acreditava ser. Todos desejam o seu meio, de um jeito ou de outro, e essa senha calhou a Steven Spielberg

Por isso fica a questão, o que poderá Spielberg trazer a esta já prescrita fórmula em “The Fabelmans"? Talvez nada e ao mesmo tempo tudo, até porque em matéria de Cinema possivelmente não haja mais nada para inventar e simultaneamente ainda existe bastante a explorar. O que aconteceu é que nesses retornos ao passado, o Amor, seja ao ecrã e mais que tudo à projeção - essa luz crepuscular - prevalece como a ferramenta essencial para o efeito rodopiante do filme. 

Spielberg fala sobre esse caso adúltero para com o seu quotidiano através dos olhos de uma criança, ansiosa, que na sua inaugural ida a uma sala de cinema, uma experiência resumida como “O Maior Espectáculo do Mundo” (poderia inserir uma alusão do meu afecto, mas estou realmente a mencionar o filme de Cecil B. DeMille [“The Greatest Show on Earth, 1952”]), é lhe despertado uma obsessão constante em replicar as imagens que tanto lhe fascinaram. Nesse gesto de reprodução nasceu um “hobby”, por sua vez, automaticamente dispensado como tal (“Can you stop calling it a hobby?”), se tornou numa determinação, numa patologia, numa corrompida droga (“We're junkies. Art is our drug.”). Incompreendido, porque este Fabelman (consideremo-lo num pseudónimo do próprio Spielberg) depara na sua arte de criar e de amar a película numa comunhão e um conforto que encurte distâncias, não as geográficas, mas as afetivas. 

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Na órbita do cinema, do seu centro, da sua vórtice, encontram-se relações quebradas ou fraturadas por razões ainda por descobrir, contudo, as suas figuras, peças centrais, pavoneiam como razões próprias - o pai que projeta os seus sucessos, deixando o seu filho sombreado pelo seu seu vulto (um sempre subestimado Paul Dano) e a mãe anestesiada por uma artificialidade de "pronto-e-esquecer" em conexão com os seus fracassos pessoais (uma competente Michelle Williams no seu habitual registo). Desiguais, esses exemplos de progenitores, e essa mesma inconsciência pesa numa balança familiar, desequilibrando-a, exaltando um lar disfuncional e uma família assombrada pelos seus demónios interiores.

The Fabelmans” é uma obra pessoal, no sentido em que esse intimismo segue a direito numa catarse, é a História de Spielberg encaminhada para um divã e submetido a uma terapia. De um jeito ou de outro, o realizador comete o pecado de muitos artistas em expor intimamente e emocionalmente numa narrativa orgulhosa em mergulhar nos dois tons, não separando-se da sua aura autobiográfica nem da aura fantasiosa. Nesse campo, “The Fabelmans” não diverge dos seus congêneres, a história mantém-se nos seus parâmetros com uma excepção: Steven Spielberg demonstra o quão exímio é enquanto contador dessas mesmas e de como aproveitar o Cinema e as suas alicerçadas ferramentas nesse sentido. Assim, como o protagonista figurado, cuja câmara é um órgão de manipulação da realidade e da perspectiva, ou até uma alternativa à sua desmoronada vida (a interpretação é deixada a cada um), subjuga-se à sua sensibilidade recorrendo à tela - a esse mundo que o apaixona e o motiva a viver - para induzir um diálogo encantado e por vezes cruel consigo mesmo. 

When the horizon is at the top, it's interesting. When it's on the bottom, it's interesting. When it's in the middle, it's boring as shit! Got it?”, a lição que Spielberg guardou incessantemente e que aqui deixou-nos como um epílogo, um incentivo à decifração de “The Fabelmans” - o que importa não é bem a natureza da sua história, mas sim como a relatar, neste caso e adequadamente, como a filmar. E é por esse fim que Steven Spielberg afasta-se dos demais, através das suas peculiaridades. 

Oscars 2022: O Padrão, O Cenário e o Desabafo

Hugo Gomes, 27.03.22

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Irritações sobre os Óscares. Um convite de Roni Nunes para o seu site Cultura XXI.
 
"Nesta última indicação gostaria de deixar a minha oposição à Academia Americana e invocar o discurso vitorioso de Bong Joon Ho de estatueta de Melhor Filme na mão: “quando ultrapassamos a barreira das legendas, acedemos a tantos magníficos filmes”. Talvez seja essa a resposta à angústia dos Óscares, essa abertura, internacional digamos (até como ofensiva a uma indústria cada vez mais decadente e homogeneizada), mas também na perda dos preconceitos quanto a géneros e a abordagens. Novamente celebrar Cinema e não apenas “glamour”, se é que um dia os Óscares foram sobre o cinema propriamente dito."
 
Para ler aqui.
 

Nunca gostei de domingos, porque por vezes eles "doem"

Hugo Gomes, 13.03.22

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The Accidental Tourist (Lawrence Kasdan, 1988)

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Kiss of the Spider Woman (Hector Babenco, 1985)

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The Village (M. Night Shyamalan, 2004)

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Altered States (Ken Russell, 1980)

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A History of Violence (David Cronenberg, 2005)

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A.I. Artificial Intelligence (Steven Spielberg, 2001)

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Body Heat (Lawrence Kasdan, 1981)

 

William Hurt (1950 - 2022)

West Side Story: Amor com Barreiras

Hugo Gomes, 03.12.21

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Saí da mesma forma como entrei na sessão – uma nova versão de “West Side Story”, nestes tempos de outras solicitações é absolutamente desnecessária.
 
O filme de 1961 com direção a meias de Robert Wise e de Jerome Robbins, baseado no homónimo sucesso da Broadway, nunca desprezando as suas escolhas estéticas e técnicas, é um produto vincado da sua era que ousou "falar" para audiências diversificadas, temáticas sociais mascaradas de escapismos românticos. Só que Spielberg, que procura no coração deste musical um cinema crente que não existe mais, transforma uma produção outrora pioneira numa coleção de tendências e discursos ocos. O seu “West Side Story” poderá estar a léguas do desastre que eu próprio sentenciava, há genica na sua condução e um trabalho hercúleo em montar um biótopo consistente (no fundo, o que é secundário tende "proteger" os fatores primários), mas é de fulgor digno de antiquário, não respira, nem mesmo o central casal romântico parece já não ter mais força para se vingar num mundo tão cínico e anti-ingénuo como este que presenciamos.

Cada um com a sua infância, cada um com o seu Cinema

Hugo Gomes, 01.06.21

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Good Morning (Yasujiro Ozu, 1959)

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The Childhood of a Leader (Brady Corbet, 2015)

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Capernaum (Nadine Labaki, 2018)

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Wadjda (Haifaa Al-Mansour, 2012)

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Home Alone (Chris Columbus, 1990)

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The White Ribbon (Michael Haneke, 2009)

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Let the Right One in (Thomas Alfredson, 2008)

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Little Fugitive (Ray Ashley & Morris Engel, 1953)

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The Florida Project (Sean Baker, 2017)

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The Sixth Sense (M. Night Shyamalan, 1999)

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The 400 Blows / Les Quatre Cents Coups (François Truffaut, 1959)

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The Kid (Charlie Chaplin, 1921)

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The Last Emperor (Bernardo Bertolucci, 1987)

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Zero to Conduite / Zéro de conduite: Jeunes diables au collège (Jean Vigo, 1933)

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Bicycle Thieves / Ladri di Biciclette (Vittorio di Sica, 1948)

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Village of the Damned (John Carpenter, 1995)

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My Life as a Zucchini / Ma vie de Courgette (Claude Barras, 2016)

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The Boy with Green Hair (Joseph Losey, 1948)

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Aniki Bóbó (Manoel de Oliveira, 1942)

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The Shining (Stanley Kubrick, 1980)

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Cinema Paradiso / Nuovo Cinema Paradiso (Giuseppe Tornatore, 1988)

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Come and See (Elem Klimov, 1985)

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Pather Panchali (Satyajit Ray, 1955)

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E.T. the Extra-Terrestrial (Steven Spielberg, 1982)

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André Valente (Catarina Ruivo, 2004)

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Ivan's Childhood (Andrei Tarkovsky, 1962)

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Nana (Valérie Massadian, 2011)

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Pixote, a Lei do Mais Fraco (Hector Babenco, 1981)

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Poltergeist (Tobe Hooper, 1982)

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800 Balas (Álex de la Iglésia, 2002)

Silenciosamente, aprendendo com o Spielberg

Hugo Gomes, 27.05.21

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Mas o que ainda há para mostrar depois do primeiro "A Quiet Place"?

A questão aqui não é certamente o que se tem para mostrar, mas sim, como mostrar. A continuação do sucesso de 2018 é um filme que não inova a representação do seu pós-apocalipse. Possivelmente, não o deseja, preferindo trazer para primeiro plano a emoção enquanto espetáculo neste género de filmes. É fácil acabar com o Mundo... tarefa mais árdua é fazer com que o espectador se preocupe com isso. E é aí que entra John Krasinski, desta vez menos como ator e mais focado na sua posição de realizador.

Onde “A Quiet Place” era um filme de cerco, com monstruosidades pelo meio e uma proposta falível, mas esforçada (a de tentar, no meio de tanta e estridente banda sonora, elaborar um filme de silêncios), aqui interagimos com o que inicialmente parece ser uma sequela, sem surpresas e sem novidades, narrativamente em linha direta. Krasinski não elabora "twists" nem revelações de última hora, foca-se numa família (aliás, o que sobra dela) e a sua sobrevivência num ambiente hostil. E é nisso que o espetáculo dramático é aprimorado.Num terreno familiar, "A Quiet Place Part II" procura apresentar uma experiência do foro emocional, extraindo daí um suspense crescente e estabilizador, graças às opções de câmara, aos "jump scares" contínuos e, por fim, uma narrativa "salta-pocinhas" que deixa as audiências em plena intermitência.

A ação persiste em acompanhar estes peões da resistência do último bastião da Humanidade – a solidariedade -, nunca saindo destas perspetivas para apresentar sub-enredos "informativos". O espectador encontra-se em pé de igualdade com estas personagens e, apesar de alguns "saltos" específicos na ação, nunca nos separamos delas. É curioso encontrar em Krasinski essas qualidades um pouco perdidas nesta Hollywood tão tecnológica e dependente de marcos de cultura popular. Percebe-se que o nosso ator e realizador aprendeu este estilo de “storytelling” com um dos mais célebres da área, Steven Spielberg, hoje algo associado a um cinema datado.

Um herdeiro "spielbergiano"? Existem registos dessas qualidades (talvez legado, quem sabe?), mas antes que o exagero nos atinja ou seja apontando, a resposta é não. Não se encontra aqui o “know-how” digno de um “Jaws” (1975), tanto mais que as "criaturas" estão mais que presentes e vistosas, mas existe esta economia da representação apocalíptica e é essa a sua arma: a emoção colhida nesta variante de extermínio da raça humana. Ou seja, é avançar para um Spielberg trinta anos mais tarde, o de “War of the Worlds” (2005), onde a invasão alienígena era concentrada no prisma dramático de uma família só, persistindo nesse registo.

Voltando ao início, não basta erradicar o Mundo, há que criar nos espectadores empatia para essa causa. “A Quiet Place Part II”, sem inventar coisa alguma, aprendeu devidamente essa lição.

A adopção de Hal Holbrook: a resiliente despedida a um secundário de luxo

Hugo Gomes, 02.02.21

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Não foi certamente a última vez que o vi, mas não deixaria de mencionar a sua, talvez, última grande presença. O momento em que Hal Holbrok resiste à despedida do jovem Emile Hirsch, na pele de Ron Franz em “Into the Wild” (Sean Penn, 2007), o – “Let me adopt you” – é de uma calorosa subtileza e sensibilidade que só um ator com tal longevidade, experiência e também vivência poderia retribuir. Hoje em dia, “Into the Wild” é quase um sacrilégio ser relembrado por muita cinefilia (muito por culpa de “The Last Face”), mas é um filme de pequenas ‘coisas’, e Hal Holbrok, não sendo necessariamente ‘pequeno’, faz parte dessa espontânea magia.

Fora do território selvagem, o ator, que nos deixou aos 95 anos, nunca fora um protagonista emancipado (assumindo como tal em projetos pouco memoráveis), ao invés disso, um secundário de luxo, um valioso suporte do enredo em causa. Quem não esquece o seu obscuro conselho de “Follow the money” em “All The President’s Men” (Alan J. Pakula, 1976), que curiosamente partilha convivência com o seu sermão elitista em “Wall Street” (Oliver Stone, 1987) - “The main thing about money, is that it makes you do things you don't want to do” - ou da sua indignação enquanto padre Malone ao confrontar o criminoso segredo em “The Fog” (John Carpenter, 1980) - “The celebration tonight is a travesty. We're honoring murderers”.

 

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Wall Street (Oliver Stone, 1987)

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All The President's Men (Alan J. Pakula, 1976)

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The Fog (John Carpenter, 1980)

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Magnum Force (Ted Post, 1973)

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Lincoln (Steven Spielberg, 2012)

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The Unholy (Camilo Vila, 1988)

 

 

#Neverforget

Hugo Gomes, 28.01.20

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Ontem, dia 27 de janeiro, comemorou-se os 75 anos da libertação do campo de concentração de Auschwitz.

Um dia para relembrar e nunca esquecer que experienciamos o Holocausto, hoje cada vez mais fomentando como uma “mera opinião politica” alicerçado a uma certa ideologia que se infiltra nas sociedades ocidentais. Mas não seguiremos por esse caminho tenebroso, a memória é aqui a nossa moral. O “Shoah”, essa palavra sem tradução atribuída de forma a assinalar e distinguir, assume-se como a garantia de que tais trevas não se repetirão. Infelizmente, o “andar da carruagem” segue em direção desses mesmos erros passados.

No cinema, a memória mantêm-se viva, quer no registo documental, quer na ficção, de forma a garantir o “Never Forget” (nunca esquecer).

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Nuit et brouillard (Alain Resnais, 1956)

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Kapô (Gillo Pontecorvo, 1960)

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German Concentration Camps Factual Survey (Sidney Bernstein & Alfred Hitchcock, 2014) 

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La vita è bella (Roberto Benigni, 1997)

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Shoah (Claude Lanzmann, 1985)

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Treblinka (Sérgio Tréfaut, 2016)

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Denial (Mick Jackson, 2016)

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The Boy in the Striped Pyjamas (Mark Herman, 2008)

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The Schindler's List (Steven Spielberg, 1993)

A Seleção Natural

Hugo Gomes, 29.03.18

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Para onde o Cinema poderá evoluir? Uma das respostas a essa derradeira questão surgiu no calor da edição de 2017 do Festival de Cannes. Aí, o realizador mexicano Alejandro G. Iñarritu orquestrou a experiência de Realidade Virtual – “Carne y Arena” – onde o espectador se colocava na pele de quem tenta atravessar a fronteira norte-americana rumo a um sonho vendido por yankees. Enquanto se celebrava uma competição recheada de nomes autorais do cinema presente, outros invocando memórias de tempos em que o futuro do Cinema não era pensado como um dilema, a instalação de Iñarritu tornou-se gradualmente numa espécie de “elefante na sala”. Seria esta a resposta para a crise cinematográfica? O salvador da Sétima Arte frente à modernização do streaming e da emancipação do pequeno ecrã? Ou seria, como muitos previram, o nascimento de uma nova Arte “vampírica” (citando João Botelho na sua relação com a natureza do Cinema)? O Cinema sem tela e a 360o?

Enfim, enquanto se espera pela realização de tais profecias, a Realidade Virtual detém, para além de um desígnio científico, um sonho humano, a catarse dos avatares, a alteração radical da nossa realidade e quem sabe da nossa própria existência. Recentemente, filmes como “Avatar”, de James Cameron, ou o mais incisivo e profundo “The Congress”, de Ari Folman, centraram, cada uma à sua maneira, esta filosofia de individualidade. E eis que surge neste panorama “Ready Player One”, a adaptação visual de Steven Spielberg da obra literária de Ernest Cline, um enredo que dispõe futuros próximos, tecnologias omnipresentes e, como já é código no cinema dito de entretenimento, os desígnios traçados do protagonista (o “The One”, para ser mais exato na designação). Assim, Spielberg dispõe de uma construção narrativa com base na estética digital, por sua vez diluindo um dos “venenos” trasladados do Cinema atual, a experiência videojogo que tem aqui o seu auge de pertinência cinematográfica. Se é bem verdade que em termos visuais este “Ready Player One" seja comparado com um novo “Avatar”, também não é mentira que estas escolhas virtuosas em prol de uma experiência, tornam o novo trabalho de Spielberg não muito longe dos habituais simulacros de feira.

Contudo, regressando a esta Terra em pleno 2045, o Homem, incapaz de lidar com a realidade, criou a Arte de forma a moldar o seu próprio realismo, neste caso, um prolongado videojogo sob os moldes dos habituais RPG. É um escape que se revela numa autêntica prisão. Contudo, o filme encontra formas de celebrar esse mesmo enclausuramento, e fá-lo tornando-se num campo de referências minado. Neste momento sentimo-nos cada vez mais distantes da década de 80, sendo que toda a sua cultura é convertida para os patamares de imunidade crítica. Por via prática, temos personagens de um novo milénio a citar constantemente essa mesma apropriação com mais fulgor e fascínio do que aqueles que realmente viveram esse período.

Em tempos que celebramos o anterior da mesma forma que o posterior (basta termos séries com valor quantitativos de marcos e easters eggs para serem elogiados, basta ver o fenómeno “Stranger Things”), “Ready Player One” usa iguais armas de uma nostalgia mercantil, mas que deve sobretudo ser questionada para os tempos de hoje em nome do individualismo (“O nosso amor vem do Mundo que nascemos e daquele que integramos ao crescer”, frase repescada de “Que le Diable nous Emporte”, de Jean-Claude Brisseau). Por isso é normal que saiamos do visionamento exclamando coisas como “o filme mais geek de sempre”, ou “vindo diretamente da nossa juventude”, mas a situação é a seguinte: sem todo este dispositivo prazenteiro, “Ready Player One” funcionaria como uma crítica sobre a (sobre) importância de outras realidades que nos comprometem a uma deterioração dos nossos laços comunicativos e sociais?

Provavelmente é o próprio filme a responder a isso através da “catchphrase” que ecoa vezes sem conta: “o criador que abomina a sua criação”. Ora, enquanto se destrói a memória de “Shining” de Kubrick, Spielberg parece desculpar-se em toda esta salganhada tecnológica que em certo sentido tenta disfarçar as suas legíveis fraquezas enquanto entretenimento cinematográfico (desde os diálogos pueris até a um cliché por aquelas bandas hollywoodescas, um terceiro ato autodestrutivo). No fim de contas, é isso. A celebração das artimanhas que sobrecarregam a indústria e a (não) proeza de confundir progresso com o acrítico.