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Cinematograficamente Falando ...

Quando só se tem cinema na cabeça, dá nisto ...

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"Ossos": a condição fraturante de Pedro Costa

Hugo Gomes, 29.08.14

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Concluída a rodagem de “Casa de Lava” (1994), cujas filmagens decorreram na Ilha do Fogo [Cabo Verde], vários habitantes solicitaram ao realizador Pedro Costa para que entregasse cartas aos respetivos familiares de Lisboa, grande parte deles residentes no desolador bairro das Fontainhas, nos arredores da Amadora. Com esta experiência Costa integrou uma comunidade aprisionada por uma barreira invisível social, confinada à sua própria degradação, num “paraíso prometido” não citado em “Casa de Lava”.

É certo que segundo o próprio Pedro Costa, existe mais “portugalidade” aí que no país inteiro e “Ossos”, a sua obra seguinte (estabelecendo um catalisador dessa perdição identitária, uma cultura contagiada e híbrida que “promete” estampar nas velhas tradições já constituídas) é o seu claro objeto desse mesmo estudo teorizado. Pedro Costa emana um drama sob fortes toques documentais, aliás, é evidente encontrarmos um manifesto etnográfico em todo o seu sentido e uma exploração digna do estilo neo-realista italiano. Sendo que o lado ficcional, preservado por um realismo quase formalista, mas em pleno espírito de rebeldia para com a câmara, é afetado por uma constante demonstração de atos metafóricos e alusivos.

A história que centra em redor de uma criança não querida pelos seus progenitores, abandonada à sua sorte e à deriva do respetivo destino, é o ponto que une todo um conjunto de personagens desesperadas e de igual situação identitária. Trata-se do espelho de uma sociedade empestada por um futuro negro e desesperante, Costa profetizou a destruição de um captado modo vivente (a demolição do bairro das Fontainhas em 1999) e a dispersão dos habitantes com que havia convivido durante anos, os seus anti-heróis cinematográficos, mas heróicas figuras da realidade.

Com “Ossos”, o realizador afasta-se claramente da ficção cinematográfica imposta pelo Cinema Novo, por sua vez influenciada pela Nova Vaga francesa, que fora vista nos seus anteriores O Sangue (1989) e “Casa de Lava”, para se lançar numa íntima docuficção. Costa perde a olhos vistos a formação académica e revela a sua rebeldia fílmica para o grande ecrã, sem perder assim o seu gosto pelo estético, pelo planos renascentista e pela fotografia sombria e melancólica em toda essa transição. Depois do catalisador que fora “Casa de Lava”, Pedro Costa abre a sua trilogia das Fontainhas com esta romantização.

"Lucy In The Sky With Diamonds"

Hugo Gomes, 28.08.14

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Nos tempos que correm, de Luc Besson não se espera “grande” coisa, muito menos algo alegadamente astuto como este “Lucy”, mas para entender este “out of box” dos blockbusters de Verão devemos recuar uns “valentes” anos e nos afastarmos do cinema.

Em 1973, uma equipa de arqueólogos, que buscava artefactos sobre a origem humana na Etiópia, deparou-se com um fóssil de um hominídeo, na altura desconhecido para o Mundo, bastante mais antigo que os fósseis descobertos até então. Semelhante a um chimpanzé, mas com o crânio muito mais desenvolvido, os cientistas teorizaram que esta nova espécie possuiria um intelecto superior ao do referido primata. Os ossos ainda evidenciavam algo mais surpreendente: este animal conseguiria caminhar “erecto”, uma posição que ditou para sempre a evolução do Homem, fazendo com que largássemos as florestas arborizadas e caminhássemos pelas vastas savanas. 

O leitor de momento estará a perguntar qual a relação entre este facto com o filme protagonizado por Scarlett Johansson. Bem, esse mesmo hominídeo, tendo em conta os ossos da pélvis, era uma fêmea e curiosamente foi baptizada de Lucy. Reza a história que na altura da sua descoberta se ouvia no leitor de cassetes o single “Lucy in a Sky with Diamonds” dos Beatles. Pois bem, Lucy foi a “Eva da Ciência”, a primeira Mulher descoberta e a sua relevância para o conhecimento de onde viemos e como chegamos até aqui é crucial. Agora no mundo cinematográfico, Lucy será a primeira mulher, se não personagem, a atingir os 100 % de uso cerebral, de acordo com especulações científicas e pelo bom nome da sci-fy, um ridículo “what if” que surpreendentemente se torna num produto munido duma inteligência experimental e ao mesmo tempo lúdica.

Assim, iniciamos com a sequência de um primata a “matar” a sua sede num lago, nesta altura o cinéfilo apanhado de surpresa identifica tal cena com uma similar na incontestável obra-prima de ficção científica de Stanley Kubrick, “2001: A Space Odyssey”. Porém o leitor já deve aperceber e tendo em conta a longa divagação desta crítica que tal animal é Lucy, o dito hominídeo fêmea, o filme encarrega-se mais tarde de identificar a criatura, mas entretanto somo apresentados à nossa Lucy, uma vistosa Scarlett Johansson que, nos primeiros minutos, tem a difícil missão de entregar uma maleta de conteúdo desconhecido a um sujeito numa redacção de hotel em Taiwan [uma piscadela de olho ao mercado asiático].

Neste momento o espectador sente que algo não está bem e que depressa acontecerá o inevitável, um dispositivo que nos guia automaticamente ao enredo da fita. Luc Besson aufere assim ansiedade e ritmo a esta sequência inicial, usando uma montagem intercalar: enquanto Lucy se aproxima do seu alvo, as imagens de uma gazela a ser encurralada por uma chita intervêm sem aviso, invocando a memória das experiências executadas pelos cineastas russos (vêm à memória Sergei Eisenstein e a sua “A Greve” (“Strike), a constante mudança entre conflitos de sindicatos e a matança do bovino).

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Depois do enredo principal ter então arrancado, Morgan Freeman entra em ação em modo discursivo, introduzindo o espectador à premissa do filme, os ditos controlos cerebrais e suas consequências (ou dádivas). Como é óbvio a narração de Freeman é carismática, confortante e acima de tudo sábia, ele é o “gamekeeper” deste ensaio futurístico. Escusam de negar, a verdadeira intenção de “Lucy” foi apresentada muito antes do filme ser visto: quer no poster ou trailer, as condições do contrato deste novo produto de Besson é um exercício de possibilidades e nada mais. A capacidade de assistir ao próximo passo da evolução humana obviamente não passa de uma sugestão cinematográfica ou da teoria do mais fértil e imaginativo geek, mas o filme sabe “controlar” essa vertente e criar um espectáculo visual e por vezes narrativo.

Em segundo plano, são convocados todos os elementos dignos do já estabelecido cinema de Luc Besson: os tiroteios, lutas corpo-a-corpo, perseguições e, como não poderia faltar, uma França vista pelos olhos dos americanos. Ingredientes que tão bem sabem à “reinvenção bessoniana”, mas em doses menores e facilmente doseáveis. Mas “Lucy” prevalece como uma “ovelha negra” dentro desse mesmo rebanho, um filme pouco original que acaba por se tornar numa vistosa e desafiante fantasia científica. Por fim vale a pena salientar Choi Min-sik, visto no excelente “Oldboy” de Park Chan-wook , um arrepiante e magnético “vilão de serviço”, um complemento frenético com uma sedutora e fria Johansson.

Quando o romance prevalece como a maior das epopeias

Hugo Gomes, 23.08.14

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Primeiro de tudo esqueçam as polémicas em volta das extensas cenas de sexo (que segundo as más-línguas roçam a pornografia) e concentrem-se na própria simplicidade que “A Vida de Adèle” (“La Vie d'Adèle - Chapitres 1 et 2”), a quarta e triunfante obra de Abdellatif Kechiche, emana. Obtendo o mérito de conquistar a Palma de Ouro do último Festival de Cannes, num ano em que o júri era presidido por Steven Spielberg, “A Vida de Adèle” é baseada numa banda desenhada de Julie Maroh, “Le Bleu est une Couleur Chaude”, a história de amor entre uma jovem subjugada aos seus dilemas emocionais, Adèle (Adèle Exarchopoulos), com uma estudante de Belas-Artes, a lésbica assumida de cabelo azul, Emma (Léa Seydoux).

Este é um filme sobre relações afetivas, os polos positivos e os negativos que irão gerar fervorosas paixões consumidas. Trata-se de um retrato sobre dois seres que desafiam as próprias barreiras das convenções sociais em prol do amor e da cumplicidade, uma relação que é preservada, mas não eterna perante a distância intrínseca que se propaga e evidencia-se durante a narrativa. Ou seja, Abdellatif Kechiche constrói uma obra de velho registo, o clássico “when boy meets girl” (neste caso “when girl meets girl“) que está mais que vendido para o grande ecrã, onde o autor segue para lá do happy ending e provoca assim os próprios cânones cinematográficos, aproximando-o cada vez mais do realismo que não se limita ao estético e interpretativo, mas sim às componentes emocionais.

É que em pouco menos de três horas de duração, o realizador consegue “pintar” um quadro trágico e cru, onde a câmara, que prefere os grandes planos, parece alimentar-se das emoções dos atores, originando uma invasão de intimidade entre o espectador e as personagens. Tal câmara responde a um testemunho que não procura o espectáculo, mas sim o decifrar dos códigos das afinidades afetuosas. Se o realizador é eficaz em tal demanda? Diríamos antes que Kechiche é perfeito no papel de “voyeurista emocional“, onde o seu modus operandis persistente, repetitivo e constantemente impertinente torna-o num implacável produtor ou irradiador de sentimentos, os quais parecem arrebatar todo o ecrã.

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Tudo isto não funcionaria na perfeição se “A Vida de Adèle” não fosse envergada por duas atrizes dispostas a ser submetidas a tal experiência “kechichiana”. São desempenhos poderosos, não no sentido mais estonteante de muitas das prestações oscarizadas de Hollywood, mas sim pela naturalidade que empregam. Apesar de Léa Seydoux ser a sedução em pessoa, é em Adèle Exarchopoulos que os elogios caem em força. A jovem atriz consegue não só esboçar uma personagem carnal, pontuada por um desenvolvimento quase digno do registo literário, mas também pela “penetração” na essência do filme. Com isto quero dizer que derivado à forma diretiva que Kechiche opera, o qual as suas obras são suportadas pelos seus atores que cedem a uma constante “tortura interpretativa”. Exarchopoulos responde ao desafio exposto com uma espontaneidade de “cortar o fôlego“.

“A Vida de Adèle” é um filme belo, não no sentido figurativo nem concretamente visual, mas sim na sua forma experiencial, incutindo e simulando na perfeição uma história que muito bem poderia ser vivida por qualquer um, independentemente das orientações sexuais, etnias, religião e classe social. Um dos grandes filmes do ano, onde as emoções continuam a ser o próprio espectáculo cinematográfico.

Chovem maliquices ...

Hugo Gomes, 18.08.14

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Foram precisos 12 realizadores e argumentistas para desmistificar a vida e os segredos subliminares do poeta norte-americano C.K. Williams [vencedor de um Pulitzer] neste Tar. O resultado é um biopic que na teoria se revela pouco usual, a adaptação de 11 dos seus poemas como narrativa que invoca as diferentes fases da vida do escritor, mas que na prática é tudo menos original.

Tudo aqui exposto é demasiado poético, mas num sentido mais “copista” que intrínseco. Os poemas, uma base excecional e rica em emoções, são transformados num “wanna beTerrence Malick [decreto a criação do pejorativo termo “maliquice”]. Parece ingrato esta insinuação, sendo que talvez o realizador sempre sonhara em aproximar-se do poeta do que propriamente o inverso, mas enquanto um é um artesão na Sétima Arte, o outro é um figura celebrizada e incontornável da literatura poética norte-americana. 

Pois bem, “Tar” (título alusivo a um dos seus mais marcantes poemas) é uma divagação que se arrasta em territórios malickianos, a natureza como berço desses pensamentos existencialistas e a figura maternal como centro do conflito humano. Os pensamentos estão lá, as filosofias “arrancadas” visceralmente dos poemas de C.K. Williams empregam na narrativa como meros alicerces e os atores expostos neste projeto ambicioso convertem-se em meras figuras inanimadas, inspiradores das palavras de Williams, condenadas às suas sílabas e da força com que são proferidas por James Franco.

Tar” é somente isto, um filme limitado pelo seu sentido de homenagem, reduzido a mera estrofe e orientado pela sabedoria de um artista valioso na cultura dos EUA e não só. Quase que nos força a afirmar que os poemas foram feitos para serem citados e não ilustrados. Beleza sem intenção nem com a sensibilidade desejada.

 

“Someday, some final generation, hysterically aswarm

beneath an atmosphere as unrelenting as rock,

would rue us all, anathematize our earthly comforts,

curse our surfeits and submissions.”

Tar, C.K. Williams, 1936

"Casa de Lava": quando Pedro Costa quase se reduziu a cinzas ...

Hugo Gomes, 14.08.14

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Se em “O Sangue” (1989) assistimos à revelação de Pedro Costa como cineasta de um panorama cinematográfico nacional que desgarra-se calculadamente dos traços do Cinema Novo, era de esperar que “Casa de Lava” (1994) fosse a sua reafirmação. Porém, se por um lado esta sua obra revela e redefine as características que tornaram Costa no conceituado realizador dos dias de hoje, é verdade que é em “Casa de Lava” que assistimos o seu descoberto fraudulento, evidenciando talento e ao mesmo tempo inexperiência nessa sua perspectiva artística. Enquanto em “O Sangue”, a vitalidade da intriga encontrava-se num rio, em “Casa de Lava”, esta está indiciada num vulcão, elemento invisível, mas igualmente presente. Como as suas consequências, o cenário é uma região árida por terras magmáticas que impedem o surgimento de nova vida, embora desta não esteja isenta.

Talvez esta ilha (Ilha de Fogo, o filme começa com imagens da erupção daquele vulcão filmada por Orlando Ribeiro em 1954) seja o vetor dramático deste novo Casablanca, onde novamente Lisboa é tido como o refúgio digno de alcançar (mais precisamente Sacavém como o derradeiro Paraíso). Enquanto isso, esta ilha de fogo consumado é a terra da música melancólica, agradada pelos vivos, mas ouvida pelos mortos, sendo que os moribundos, os “zombies” sem vodu, se manifestam numa eterna guerra entre a vida e a morte. É um local de desespero, de esperanças há muito vencidas pelo tempo “congelado”. Inês de Medeiros, novamente peão das jornadas sugeridas por Pedro Costa, resulta no seu novo “ventríloquo”, enquanto que Pedro Hestnes (que está para Costa, como Denis Lavant está para Leos Carax), fluente em crioulo, é o seu contra-veneno. Mas em Casa de Lava sentimos o desapontamento, sentimento esse, derivado da renegação do autor à arte do storytelling.

O paradoxismo dos diálogos, algo que já havia sido notado em “O Sangue”, mas que fora fincado nesta nova jornada, e a narrativa que se perde nos impasses, esses mesmos em consequência dos devaneios artísticos impostos por Costa, ou talvez o pouco rigor com que consegue abordar o seu redor com lucidez. O cineasta parece ter adoptado o registo já formatado no círculo de autores cinematográficos de Portugal, a recusa pela matriz académica da narrativa e a entrega pela narrativa visual (a aversão dos “autores” a esses fatores deriva da formalização modelizada dos produtos televisivos ou produções hollywoodescas). Se bem que esse factor inúmeras vezes é detido como um disfarce, uma maneira de ocultar a inexperiência do cineasta em conduzir o seu enredo ou implementar as suas mensagens inerentes, em Pedro Costa notamos essa inexperiência em erguer um “Golias”, mas nunca incompetência. Porém, revela mais fraquezas que aptidões.

Segundo os textos da Cinemateca-Portuguesa, “Casa de Lava" é um trabalho de estudo para o filme seguinte, "Ossos” (1997), e talvez por isso um estudo estilístico e de complexidades narrativas quer visuais quer linguísticas. Contudo, desperdiçou-se aqui um eventual grande filme.

Ilo Ilo: sentido o afeto pela primeira vez!

Hugo Gomes, 12.08.14

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Há mais por onde olhar em Ilo Ilo do que aquilo que a câmara de Anthony Chen nos possibilita. Desde o primeiro momento, a estreante longa-metragem do singapurense (vencedor da Câmara de Ouro do Festival de Cannes em 2013) aufere-nos um rigor em transmitir uma tensão insuportável entre as suas personagens, uma credibilidade de "afiar a faca" entre os membros desta realidade quotidiana, ao mesmo tempo que tece um híbrido entre o emocional e o nostálgico com o retrato social e financeiro de um país em vias de ser "estrangulado".

Trata-se de uma rescrita visual através da memória, uma invocação dos sentimentos e afetos passados do autor, refletidos neste constante soneto. Ilo Ilo decorre nos final dos anos 90, com a crise financeira asiática a avançar com um caçador furtivo se tratasse. No centro deste "mundo suspenso em dominó" encontramos a família Lim que contrata a filipina Terry para ajudar na lida da casa. O impacto inicial entre a "estrangeira" e a respetiva família está longe de ser pacífica, em principal destaque com o filho do casal, um rebelde menino de dez anos chamado Jiale que promete fazer a vida negra à empregada. Contudo, a relação entre os dois acaba por melhorar, nascendo uma ligação especial.

Anthony Chen constrói um filme realista por meio de planos fechados, trémulos e sob o efeito da sugestão. Aos poucos vai tecendo uma veia sentimental que "dispara" no último ato. E mesmo que as consequências nos levem a certos lugares-comuns, Chen nunca baixa em momento algum a guarda e evita requisitar a fábula cinematográfica, mantendo-se e fiel ao realismo das imagens nem que com isso exponha a violência das mesmas. Ilo Ilo é um drama familiar que tem a virtude de se moldar, converter em algo mais o pressuposto, invocando "demónios" sem nunca os exorcizar. Assim sendo, para além do enredo principal, a fita embrulha-se num cenário de época enquanto revela à "luz do dia" os ecos de uma crise financeira e social, que condenou vidas e atrasou objetivos e carreiras promissoras.

Uma estreia faustosa e comovente. Anthony Chen conseguiu captar a nossa atenção neste quadro híbrido de saudade e urgência - estamos interessados em conhecer o que a sua carreira nos reserva.

Hercúleo fracasso!

Hugo Gomes, 01.08.14

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Em “Hércules”, de Brett Ratner, existem duas ‘coisas’ que temos que ter em conta. A primeira é que não é uma tarefa hercúlea superar a hedionda versão de Renny Harlin. Já a segunda é que o marketing em Portugal em torno da interpretação de Irina Shayk é somente exagero e mediatismo, estando a participação da modelo russa reduzida a um mero cameo. Portanto, e após estes dois aspetos, só resta ver o que de bom tem este Hércules.

Um bom conselho, aliás, não fosse o facto que até o menos assíduo dos espectadores irá ser “atacado” por um vasto leque de “déjà vu”, e o mais alarmante é que tudo indica que a produção não se esforça em esconder. A começar pela própria ideia generalizada do filme, o modernizar um dos mais queridos e célebres heróis da mitologia grega, o homónimo gigante munido de uma força sobre-humana que é descaradamente reduzido a uma figura hollywoodesca dependente do carisma de Dwayne Johnson, e nada mais.

Aliás, o ator que tem servido como um verdadeiro Midas de várias produções de entretenimento é o Atlas [referenciando, mais uma vez, a mitologia local] desta fita visualmente e cenicamente bem composta, mas regida por fórmulas decadentes. Brett Ratner começa por invocar as séries televisivas rotineiras e trash, da dinastia de Kevin Sorbo ou de Lucy Lawless, até se arrastar em protótipos de Conan, dos tempos áureos de Schwarzenegger, acabando por terminar em créditos finais vergonhosamente com aspiração a “300”. Ou seja, tudo em “Hércules” é cliché, tão previsível e ridicularizado por uma narrativa mal «colada».

Mas o filme é assim tão mau? Dentro dos parâmetros do entretenimento mais despreocupado, o filme de Ratner é pomposo e não “aborrece” ninguém. Porém, é banalmente irritante e tendo em conta os gastos e os talentos aqui depositados (John Hurt, Ian McShane, Rufus Sewell, por exemplo), é um verdadeiro desperdício que só Dwayne Johnson consegue salvar. Novamente referenciando a mitologia grega (prometo que é a última), o ator prova mais uma vez que é digno de um lugar nos Campos Elísios.

 

“No matter how far you go, man cannot escape his fate. Who are you? Are you a murderer? Are you a mercenary who turns his back on the innocent? We believe in you! We have faith in you! Remember the deeds you have performed, the labors you have overcome! Are you only the legend, or are you truth behind the legend? Now, tell me, WHO ARE YOU?”

“I AM HERCULES!”